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Ano: 1999  Vol. 3   Num. 3  - Jul/Set Print:
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Glioma nasal e encefalocele: revisão da literatura e atualização terapêutica
NASAL GLIOMA AND ENCEPHALOCELE: LITERATURE REVIEW AND THERAPEUTIC UPDATE
Author(s):
1Luís Fernando Amarante, 2George Evandro Boos, 3Vinicius Ribas de C.D. Fonseca, 4Ana Cláudia Mariushi
Palavras-chave:
Introdução

Gliomas nasais são tumores benignos, raros, constituídos de tecido glial e astrócitos. São divididos anatomicamente em extranasais (60%), intranasais (30%) e mistos (10%). Mais comumente encontrados em recém-nascidos, mas por seu crescimento lento podem ser encontrados em adultos3,6. Encefaloceles são herniações de conteúdo da caixa craniana que mantiveram sua comunicação com o encéfalo. Classificam-se em sincipital (quando extranasal perto da glabela, testa ou órbita), basal (quando intranasal e na região da nasofaringe) e occipital (quando na região subocipital). Podem apresentar-se desde o nascimento até a primeira infância, com a possibilidade de associação com meningite4.

Objetivos

1)Realizar a revisão da literatura sobre glioma nasal e encefalocele;

2)Proporcionar atualização terapêutica e diagnóstica, visando a melhor conduta destas duas importantes afecções, que podem acarretar deformidades cosméticas em adultos e comprometimento respiratório no recém-nato.

Etiologia

De todas as massas nasais congênitas, a encefalocele, o glioma e o dermóide nasal são as mais comumente vistas. Possuem desenvolvimento similar variando apenas na qualidade do seqüestro embrio­gênico3. Uma encefalocele nasal deve estar associada a um defeito ósseo, com herniação do conteúdo intracraniano. Desta forma o glioma nasal tem o mesmo tipo de origem que a encefalocele, porém naquele ocorre o fechamento da continuação meningeal para o cérebro, durante o desenvolvimento embriológico. Em 15 a 20% dos casos, um apêndice fibroso conecta o glioma com o espaço intracraniano (Figura 1), o que raramente pode estar associado com defeitos ósseos ou vazamento de líquido encefalorraquidiano. Isso condiz com a teoria mais difundida de que o glioma nasal represente uma encefalocele que perdeu sua comunicação intracraniana no desenvolvimento embrionário3.


Figura 1. Diagramas mostrando o desenvolvimento embriológico dos gliomas nasais e encefaloceles. Acima à esquerda: fontanela anterior e espaço pré-nasal. Acima ao centro: fechamento normal dos ossos do crânio e face. Acima à direita: formação de encefalocele extranasal. Abaixo à esquerda: formação de encefalocele intranasal. Abaixo ao centro: Corte coronal de um glioma extranasal. Abaixo à direita: diagrama de um glioma intranasal comunicando-se por um apêndice fibroso com a caixa craniana.




Incidência

Gliomas nasais podem ocorrer em 1 para cada 20.000 a 40.000 nascidos vivos. Foi relatada uma predominância para o sexo masculino de 3:1. Não possuem caráter familiar ou hereditário2. Um estudo britânico relatou que a ocorrência de gliomas nasais é de 5 em cada 109 das tumorações nasais congênitas. De acordo com a literatura a maioria dos gliomas nasais é do lado direito3.

Encefaloceles ocorrem numa maior freqüência (um para cada 4.000 nascidos vivos). Da mesma forma que os gliomas não possuem caráter hereditário ou familiar. Não há predominância entre os sexos, ou do lado da ocorrência da herniação5.

Gliomas nasais não possuem relação com outras anormalidades de desenvolvimento. No entanto, foram relatados casos de teleangectasias de pele e ureteres duplos na presença de gliomas extranasais, anormalidades neurológicas e fenda palatina associados com gliomas orofaríngeos, hidrocefalia congênita e retardo mental associado a gliomas intranasais e spina bifida e nariz bífido associado a gliomas mistos2,4,7.

Diagnóstico

A investigação diagnóstica deve ser feita com intuito de diferenciar gliomas nasais de encefaloceles, devido às repercussões causadas por uma comunicação intra­cra­nia­na no tratamento cirúrgico necessário frente a estas duas afecções1.

A pele sobreposta ao glioma pode ser normal ou aderida à massa tumoral, podendo apresentar telean­gectasias. A pirâmide nasal pode estar alargada, especial­mente por massas extranasais. Ao exame intranasal, o tumor caracteristicamente se apresenta firme, pálido e coberto por mucosa nasal normal. Esta massa não muda de tamanho ou forma durante o choro; não é translúcida e o teste de Furstenberg (crescimento pela compressão jugular) é caracteristicamente negativo2,3,6. A lesão intranasal geralmente cresce da parede lateral do nariz, na região do corneto médio, embora algumas vezes possa surgir do septo. Produzem obstrução nasal e desvio de septo proporcional ao tamanho do tumor. O tumor tende a crescer na taxa similar ao tecido neural normal.

Encefalocele é usualmente compressível, flutuante e pulsátil. A lesão deve crescer em tamanho ao choro, aborrecimento, ou ao segurar a criança de cabeça para baixo. Na rinoscopia a presença de uma massa translúcida pode atentar o cirurgião para a presença de liquor. A manobra de Furstenberg é positiva na maioria dos casos3,4,7.



Exames de imagem, raio x, tomografia computa­do­ri­za­da e ressonância magnética devem buscar defeitos ósseos e continuações intracranianas das lesões. A ressonância magnética é particularmente útil para avaliação de neoplasias da base de crânio por não ser invasiva, prevenir a presença de artefatos, oferecer melhor contraste em partes moles e não requerer o uso de radiação ionizante. Então repetidos exames de RM em neonatos e crianças não são desaconselháveis7.

História clínica, exames de imagem e endoscopia nasal se somam para a melhor diferenciação destas duas entidades.

Biópsias ou punções estão contra-indicados por haver a possibilidade de comunicação meníngea4.

Tratamento

A remoção cirúrgica é o tratamento de escolha. Deve ser realizada no começo da infância para prevenir efeitos deformantes do tumor sobre ossos da face, comprometimento respiratório por lesões intranasais e meningite nos casos de encefalocele.

A via de acesso ao tumor varia conforme sua apresentação na face e conforme a habilidade e experiência do cirurgião. A remoção do tumor deve ser empreendida quando não houver suspeita de comunicação intracraniana. O glioma deve ser retirado com a pele sobrejacente se esta estiver aderida ou apresentar evidências de tecido glial observadas por congelação no ato operatório, para se prevenir recorrência. Havendo necessidade de se retirar a pele sobrejacente, retalho cutâneo deve ser confeccionado, dependendo do tamanho e localização da massa7.

No caso de fortes evidências de extensão intracraniana uma craniotomia exploradora frontal deve ser empreendida para resolução da comunicação e correção dos defeitos ósseos dois meses antes do ato operatório extracraniano. Quando se encontrar uma comunicação no ato operatório, cobertura antibiótica é mandatória e pode ser feita no pré-operatório, se houver dúvidas no diagnóstico da lesão. A associação de equipes cirúrgicas pode prevenir complicações intra-operatórias.

Recorrência

A taxa de recorrência após a excisão do glioma nasal é de 4 a 10% e pode estar associadar a permanência de tecido glial não retirado no ato cirúrgico primário3,4.

Conclusões

Mesmo sendo raros, os gliomas nasais e encefaloceles devem ser lembrados como uma possibilidade diagnóstica para serem manipulados com o máximo de segurança, evitando procedimentos cirúrgicos extensos.

História clínica, exame físico detalhado e exames complementares de imagem se somam para diferenciação destas duas entidades.

A ressonância magnética possui melhor valor diagnóstico sobre a tomografia por melhor evidenciar extensões intracranianas nos casos de encefalocele, apresentar menos artefatos e não usar radiação ionizante podendo ser repetida em crianças e neonatos.

Nos casos de gliomas nasais, procedimento cirúrgico deve ser empreendido para se evitar defeitos cosméticos e comprometimento respiratório (no neonato). A excisão da pele sobreposta ao tumor é necessária (quando aderida à massa ou na evidência de tecido glial no ato operatório por congelação) para se evitar recorrência.

Na suspeita de encefalocele, craniotomia exploradora deve ser feita dois meses antes do procedimento cirúrgico para retirada da massa e correção de defeitos ósseos, por uma equipe cirúrgica multidisciplinar.

Referências Bibliográficas

1. DERKAY, C.S.; TUNNESSEN, W.W. - Pictures of the month. Case 1. Nasal glioma. Arch. Pediatr. Adolesc. Med., v. 148(9), pp. 953-954, Sep. 1994.

2. JUHLIN, N.R.; DERKAY, C.S. - Pathologic quiz case 1. Nasal Glioma. Arch. Otolaryngol Head Neck Surg., v. 115 (11), pp. 1384-1386, Nov. 1989.

3. PUPPALA, B.; MANGURTEN, H.H.; McFADDEN, J.; LYGIZOS, N.; TAXY, J.; PELLETTIERE, E. - Nasal Glioma Presenting as Neonatal Respiratory Distress. Clin. Pediatr. (Phila.), v. 29(1), pp. 49-52, Jan. 1990.

4. YOUNUS, M.; COODE, P.E. - Nasal glioma and encefalocele: two separate entites. Report of two cases. J. Neurosurg., v. 64(3), pp. 516-519, Mar. 1986.

5. VIANNA, R.S.F. - Nasal Glioma. Rev. Paul. Med., v.103(3), p. 151, May-Jun. 1985.

6. DINI, M.; Lo RUSSO, G.; COLAFRANCESCHI M So-called Nasal Glioma. case report with immunohistochemical study. Tumori, v. 84, pp. 498-402, 1998.

7. THOMSON, H.G.; AL-QATTAN, M.M.; BECKER, L.E. - Nasal Glioma: Is dermis involviment significant? Annals of Plastic Surgery. v. 43(2) pp168-172.

Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba
Endereço para correspondência: Vinicius Ribas de Carvalho Duarte Fonseca - Rua Ângelo Sampaio, 967 ap. 1301 - Batel. CEP: 80250-120 - Curitiba - PR - Telefone: (0xx41) 244-4146/973-7934 - E-mail: vrfonseca@uol.com.br
Trabalho classificado para apresentação na IX Jornada Sul-Brasileira de Otorrinolaringologia, Blumenau, Abril de 1999.
Trabalho apresentado na IX Jornada Sul-Brasileira de Otorrinolaringologia, Blumenau, Abril de 1999.

1- Chefe da Cadeira de Otorrinolaringologia da Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná. Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba.
2- Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba.
3- Acadêmico do 5º ano da Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná.
4- Acadêmico do 4º ano da Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná.
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