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Ano: 2008  Vol. 12   Num. 4  - Out/Dez Print:
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Análise Acústica dos Formantes e das Medidas de Perturbação do Sinal Sonoro em Mulheres Sem Queixas Vocais, Não Fumantes e Não Etilista
Acoustic Analysis of Formants and Measures of the Sonorous Signal Disturbance in Non-smoker and Non-alcoholic Women Without Vocal Complaints
Author(s):
Viviane de Carvalho Teles1, Ana Cláudia Unello Rosinha2
Palavras-chave:
voz, normalidade, acústica da fala, mulheres
Resumo:

Introdução: A análise acústica tem como objetivo quantificar e caracterizar o sinal sonoro. Por meio dessa avaliação também é possível criar um banco de dados normativos das populações. Objetivo: Esta pesquisa teve como objetivo extrair e analisar as medidas do sinal sonoro: Freqüência Fundamental, Jitter, Shimmer, APQ (Amplitude Perturbation Quotient), PPQ (Period Perturbation Quotient), NHR (Noise Harmonic Ratio) e os valores das freqüências dos primeiros três formantes das sete vogais orais do português brasileiro falado em São Paulo. Também foi realizada a avaliação perceptivo-auditiva da voz por meio da escala GIRBAS. Método: Participaram 107 mulheres, não fumantes, não etilistas, sem queixas vocais e sem alterações laringológicas. O programa utilizado para o registro e análise da voz foi o CSL 4300B e Multi-Dimensional Voice Program (MDVP). Essas mulheres foram divididas de acordo com a idade em 3 grupos: 1 (18-39), 2 (40-60) e 3 (60-86). Resultados: Não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos nas medidas avaliadas. Porém os valores de quase todas as medidas de perturbação do sinal sonoro (Jitter, APQ, PPQ, NHR) foram maiores no Grupo 3. Os valores de Freqüência Fundamental foram semelhantes entre os grupos estudados e o Shimmer foi maior no grupo 2. Para F1 o Grupo 3 apresentou seus valores mais elevados, F2 não houve prevalência entre os grupos e para F3 os valores foram aumentados para o Grupo 3 nas vogais /a/,/e/,/o/. Conclusão: A criação de banco de dados normativos pode favorecer as pesquisas com vozes disfônicas e normais.

INTRODUÇÃO

A análise acústica começou a ser mais utilizada no Brasil e na clínica fonoaudiológica na última década e tem como objetivo, quantificar e caracterizar o sinal sonoro. Além disso, por meio da avaliação objetiva é possível criar um banco de dados normativos das populações, detectar precocemente problemas vocais e monitorar a eficácia do tratamento fonoaudiológico. Os dados encontrados por meio da análise acústica são complementares à análise perceptivo-auditiva, que permanece soberana, caso haja conflitos entre os dados perceptivos e acústicos (1,2).

Ao mesmo tempo, a correlação entre essas duas avaliações e a avaliação laringoscopia, que tem como principal objetivo ampliar a imagem, possibilitando avaliar a presença de lesões pequenas podem ampliar o leque de possibilidades diagnósticas e terapêuticas (3). Além da objetivação do sinal sonoro, a análise acústica permite ao avaliador captar as alterações vocais precoces, sendo também um ótimo recurso para promoção e prevenção da saúde vocal (4,5).

A análise acústica é capaz de fornecer o formato da onda sonora, análise da freqüência fundamental, (f0), definida como o número de vibrações por segundo produzidas pelas pregas vocais, medidas de perturbação da freqüência, tais como: jitter; definido como sendo a perturbação da freqüência fundamental ciclo a ciclo; medidas da perturbação da amplitude, shimmer, que é a variabilidade da amplitude ciclo a ciclo e as medidas de ruído como NHR, que correlaciona o componente harmônico com o componente ruído (1,2,5,6,7,8).

A avaliação perceptivo-auditiva é freqüentemente realizada na prática clínica do fonoaudiólogo e tem caráter impressionista, quanto à qualidade vocal do indivíduo. Assim, depende da experiência do profissional, que irá comparar seus achados, com outros, realizados posteriormente pelo mesmo avaliador (9).

Para produzir um som é necessário, primeiramente uma fonte sonora, isto é, um sistema em movimento e uma fonte de energia, capaz de deslocar a fonte sonora do repouso por meio do ar. A fonação utiliza porções do trato respiratório e digestório, causando modificações na passagem do fluxo de ar expiratório. A primeira modificação ocorre na laringe e posteriormente nas cavidades de ressonância, oral ou nasal (10,11). Acusticamente, as modificações decorrentes das variações no trato ressonantal são conhecidas como ação de filtro, descrito por Fant, 1970 (12). O trato vocal atua como um filtro e suas freqüências de ressonância designam-se por formantes. As vogais são reconhecidas pelos seus formantes, que são produzidos por mecanismos articulatórios e modificados pelos ajustes específicos do trato vocal (13).

Na literatura nacional, é escasso o número de trabalhos que realizam a extração de dados acústicos normativos dos formantes das vogais do português brasileiro em mulheres sem queixas vocais. Além disso, as pesquisas existentes apresentam amostras reduzidas de sujeitos e uso de diferentes programas computadorizados (7,14,15,16,17,18,19).

Com o intuito de auxiliar na criação de um banco de dados normativos para futuros trabalhos na área de análise acústica no Brasil, o objetivo desta pesquisa foi realizar a extração dos valores de freqüência dos formantes das vogais orais do português brasileiro falado na cidade de São Paulo e das medidas de perturbação do sinal sonoro em mulheres, não fumantes, não etilistas e sem queixas vocais.


MÉTODO

A presente pesquisa foi realizada após aprovação do Comitê de Ética do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho (ICAVC) sob o número 073/04.

Os sujeitos deste trabalho foram selecionados em várias ações de Promoção e Prevenção da Saúde, realizada pelo Instituto Valentim, por meio de um ônibus itinerante, que percorreu algumas cidades do Estado de São Paulo, entre os meses de abril e julho de 2006, num total de cento e sete sujeitos do sexo feminino (média=44 anos).

Para compor a amostra deste trabalho, todos os indivíduos deveriam seguir os seguintes critérios de inclusão: sexo feminino, com idade acima de 18 anos, não fumante, não etilista e com exame laringológico normal, ou seja, sem lesão de massa maligna ou benigna. Não era objetivo de o trabalho detectar a presença de fendas, assim, esse dado não foi considerado na avaliação laringológica. Os fatores de exclusão foram mulheres com queixas vocais e que realizaram alguma cirurgia na laringe ou que não se enquadravam nos critérios de inclusão citados anteriormente.

Portanto, a primeira etapa dessa seleção consistiu da avaliação laringológica através da laringoscopia direta, para averiguar a presença ou não de lesões malignas ou benignas na laringe, realizado com anestesia local (2% de lidocaína intra-oral) e com laringoscópio da marca KAY Elemetrics, modelo RLS9100B, com telescópio da marca KAY Elemetrics, modelo 9106 e microcâmera da marca Panasonic, modelo GPUS522. Todas as mulheres com suspeita de lesão maligna foram encaminhadas ao Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho (ICAVC). Já as mulheres que apresentavam lesões benignas recebiam orientações sobre higiene vocal por meio de um manual elaborado pelo Serviço de Fonoaudiologia do ICAVC e eram orientadas a procurarem tratamento fonoaudiológico.

As mulheres sem alterações na laringoscopia passavam para a próxima etapa do trabalho que consistia da anamnese fonoaudiológica, contendo dados de identificação, uso de tabaco ou álcool, refluxo-gastroesofágico, medicações, cirurgias ou queixas quanto à voz. Todas as mulheres assinaram um termo de consentimento informado. Descartado o uso de tabaco, álcool e queixas vocais, esses indivíduos eram encaminhados à parte anterior do ônibus, adaptada para a realização das gravações acústicas. A gravação da voz foi realizada diretamente no computador e analisado pelo programa CSL 4300B e MDVP (Multi-Dimensional Voice Program, Kay Elemetrics (Lincoln Park, NL)).

O sinal foi captado por um microfone unidirecional, posicionado em um tripé a 15 cm da boca de cada sujeito, que permaneceu em pé, sendo solicitada à contagem dos números de um a 10, emissão da vogal /a/, para medição dos parâmetros vocais e posteriormente a emissão das sete vogais /a/,/e/, /é/, /i/, /o/, /ó/,/u/ sempre com uma inspiração profunda e mantendo o padrão habitual de pitch e loudness de fala. As medidas acústicas estudadas foram: freqüência fundamental (f0), freqüência dos três primeiros formantes das sete vogais orais do português brasileiro, jitter, shimmer, APQ (Amplitude Perturbation Quotient), PPQ (Period Perturbation Quotient), NHR (Noise Harmonic Ratio).

Também foi realizada a avaliação perceptivo-auditiva da voz por meio da escala Girbas (20) por um fonoaudiólogo experiente em avaliação vocal, sendo G correspondente ao grau global de alteração vocal, I (instabilidade/instability), R (rugosidade/roughness), B (soprosidade/breathness), A (astenia/asteny), S (tensão/strain) em uma escala numérica de 0 (ausente/normal), 1 (discreto), 2 (moderado) e 3 (alteração intensa).

Para a análise dos resultados, inicialmente foi verificada a variação média de cada parâmetro vocal em função da idade. O comportamento desta variação possibilitou dividir as idades em grupos etários, pois os parâmetros apresentaram uma tendência constante. Assim, foi estabelecido três grupos etários, sendo eles, Grupo 1, mulheres com idades entre 18 e 39 anos (n = 46), Grupo 2, entre 40 e 60 anos (n = 47) e Grupo 3, entre 61 e 86 anos (n = 14), idade da participante mais idosa. Posteriormente foi verificada a normalidade da distribuição da freqüência da amostra para diferentes parâmetros e dada esta condição foi aplicado o Teste T, Student para comparação das médias. O Teste T foi aplicado com significância de 5% para comparar as médias das variáveis em relação aos três grupos etários distintos, sendo T< TC.


RESULTADOS

Os resultados foram divididos em três grupos etários. O Grupo 1 era formado por mulheres com as faixas etárias entre de 18 e 39 anos, Grupo 2, mulheres entre 40 e 60 anos e Grupo 3, mulheres entre 61 anos e 86 anos. Os resultados das médias da freqüência fundamental, jitter, shimmer, APQ, PPQ e NHR para o gênero feminino estão descritos na Tabela 1. Na tabela dos resultados também foi inserido os valores de normalidade segundo Behlau, 2001 (1) e Fukuyama, 2001 (21).




Os valores de jitter foram similares para o Grupo 1 e 2 e houve um aumento de 0,5% para o Grupo 3. Os valores encontrados para as três faixas etárias estão dentro da faixa de normalidade que é de 1,5,% (1). A diferença entre os resultados não é expressiva para o nível de significância de 5%.

Dado contrário ao shimmer que apresentou seu valor mais elevado no Grupo 2 em comparação ao Grupo 1 e 3. Os valores encontrados encontram-se abaixo do valor de normalidade que é de 2,3 dB (1).Os valores de shimmer também não apresentaram diferença significativa para o nível de significância de 5%.

Houve aumento dos valores de APQ à medida que as idades aumentavam. Os valores encontrados pelo Grupo 1 e 2 encontram-se dentro dos valores de normalidade que é abaixo de 3,07 (21), mas o Grupo 3 encontra-se fora deste padrão. A diferença entre os resultados de APQ não é expressiva para o nível de significância de 5%.

Para os parâmetros de freqüência fundamental e NHR, houve uma diminuição nos valores no Grupo 2 quando comparados ao Grupo 1, mas um grande aumento em comparação ao Grupo 3, porém a análise estatística demonstrou que a diferença entre os resultados não é expressivo para o nível de significância de 5%. Os valores encontrados para freqüência fundamental nos grupos etários estão dentro da faixa de normalidade que varia de 150 Hz a 250 Hz (1). Para NHR apenas o Grupo 2 apresentou-se dentro da faixa de normalidade que é abaixo de 0,19 (21). Valores muitos similares de PPQ também foram encontrados no Grupo 1 e 2, com aumento no valor no Grupo 3. Não houve diferença significativa para o nível de significância de 5% para o parâmetro PPQ. Os Grupos 1, 2 e 3 encontraram-se dentro da faixa de normalidade que é abaixo de 0,84% (21).

As médias dos formantes F1, F2 e F3 das sete vogais do português brasileiro /a/,/e/, /é/, /i/, /o/, /ó/,/u/ estão apresentados na Tabela 2, Tabela 3 e Tabela 4 consecutivamente, assim como os valores de referência de normalidade baseado na pesquisa de Monteiro, 1995 (17).








Os indivíduos inclusos no Grupo 3 obtiveram os maiores valores de F1 para as vogais /a/,/e/,/i/,/o/,/u/, quando comparados ao Grupo 1 e 2. Apenas nas vogais /é/,/ó/ os valores foram mais elevados para os indivíduos do Grupo 1. Os resultados dos formantes demonstraram que houve uma queda nos valores dos formantes no Grupo 2, quando comparados ao Grupo 1 e depois houve uma elevação nos valores no Grupo 3 para todas as vogais. Houve diferença significativa para o formante F1 para as vogais /e/,/i/ entre os Grupos 1 e 3 e entre os Grupos 2 e 3. Para a vogal /é/, /ó/ a diferença significativa ficou entre os Grupos 1 e 2. A média dos valores de F1 das sete vogais nos três grupos etários encontrou-se dentro da faixa de normalidade.

O comportamento dos valores de F2 foi bastante diversificado. As freqüências deste formante das vogais /i/, /o/, /u/ foram maiores para o grupo 1. Já o grupo 2 apresentou valores mais elevados para as vogais /e/,/é/,/u/ em relação aos demais grupos. O F2 da vogal /a/ apresentou-se mais aumentado no Grupo 3. Houve diferença estatística significativa entre os Grupos 1 e 2 e entre os Grupos 1 e 3 apenas para a vogal /ó/. As médias das sete vogais para F2 encontraram-se diminuídas em relação à faixa de normalidade encontrada para esse segundo formante.

Para as vogais /a/,/e/,/o/,/u/ há uma queda nos valores de F3 para o Grupo 2, quando comparado ao Grupo 1 e depois uma elevação no Grupo 3. O contrário ocorre com a vogal /é/, que a apresenta uma elevação no Grupo 2 e depois uma queda para o Grupo 3. Nas vogais /i,/ó/ há quedas consecutivas para o Grupo 2 e 3, quando comparados ao Grupo 1. A diferença foi significativa entre os Grupos 1 e 3 para as vogais /e/,/i/ e entre os Grupos 2 e 3 para a vogal /i/. Para F3 todas as médias das vogais nos três grupos etários encontram-se diminuídas em relação à normalidade.

Foi observado que a maior parte das pessoas apresentaram como grau global da impressão vocal (G), escore 1, que caracteriza um impacto discreto na qualidade vocal. As características de voz: instabilidade (I), rugosidade (R) e tensão (S) obtiveram escores entre 0 e 1, ou seja, nenhuma alteração encontrada ou discreta. Já a soprosidade (B) e astenia (A) foram, respectivamente, pouco encontradas ou nulas, nesta população estudada.

O índice de Grau Global da Impressão Vocal (G) para o Grupo 1 foi de 13 indivíduos (28,26%) apresentaram escore 0, seguido de 29 (63,04%) de escore 1 e 4 (8,69 %) escore 2. Instabilidade (I) obteve 23 (50%) indivíduos com escore 0, 21 (45,65%) com escore 1 e 2 (4,34%) com escore 2. Rugosidade (R) obteve 32 (69,56%) com escore 0, 9 (19,56%) com escore 1 e 5 (10,86%) com escore 2. Soprosidade (B) apresentou 41 (89,13%) de escore 0, 3 (6,52%) com escore 1 e apenas 2 (4,34%) com grau 2. Para o parâmetro Astenia (A) o índice foi nulo e finalmente para Tensão (S) houve 35 (76%) indivíduos com escore 0, 9 (19,56%) com grau 1 e 2 (4,34%) com grau 2.

Para o Grupo 2, o índice de Grau Global da Impressão Vocal G foi de 15 (31,91%) indivíduos apresentaram o escore 0, 28 (59,57%) escore 1 e 4 (8,51%) escore 2. Instabilidade (I) obteve 19 (40,42%) indivíduos com escore 0, 24 (51,06%) com escore 1 e 4 (8,51%) com escore 2. Rugosidade (R) obteve 25 (53,19%) com escore 0, 16 (34%) com escore 1 e 6 (12,76%) com escore 2. Soprosidade (B) apresentou 45 (95,74%) de escore 0, 2 (4,25%) com escore 1 e nenhum indivíduo com escore 2. Para o parâmetro Astenia (A) o índice foi nulo e finalmente para Tensão (S) houve 27 (57,44%) indivíduos com escore 0, 16 (34%) com grau 1 e 4 (8,51%) com grau 2.

Para o Grupo 3, o índice de Grau Global da Impressão Vocal G foi de 3 (21,42%) indivíduos apresentaram o escore 0, 6 (42,85%) escore 1 e 5 (35,71%) escore 2. Instabilidade (I) obteve 5 (35,71%) indivíduos com escore 0, 5 (35,71%) com escore 1 e 4 (28,57%) com escore 2. Rugosidade (R) obteve 7 (50%) com escore 0, 2 (14,28%) com escore 1 e 5 (35,71%) com escore 2. Soprosidade (B) apresentou 13 (92,85%) de escore 0, 1 (7,14%) com escore 1 e nenhum indivíduo com escore 2. Para o parâmetro Astenia (A) o índice foi nulo e finalmente para Tensão (S) houve 9 (64,28%) indivíduos com escore 0, 3 (21,42%) com grau 1 e 2 (14,28%) com grau 2.


DISCUSSÃO

A avaliação vocal, por meio da análise acústica, auxilia o fonoaudiólogo na realização de uma avaliação objetiva da voz e também na criação de bancos de dados que identifiquem características específicas de desordens vocais ou padrões de normalidade, porém ainda são raros nas pesquisas nacionais (1).

Os resultados obtidos neste trabalho em relação à freqüência fundamental (f0) variou de 202 Hz a 212 Hz. Este dado foi similar aos achados obtidos de diversos autores (8,14,22) que encontraram valores entre 204Hz e 206Hz para mulheres sem queixa vocal. Outros trabalhos apresentaram valores mais elevados de f0 entre 219 Hz e 235 Hz (5,19) para grupo de mulheres sem queixas. Houve um aumento discreto dos valores da f0 entre o Grupo 1 e 2 quando comparado ao Grupo 3. Este achado não confere com a literatura que demonstra que há uma diminuição dos valores de f0 com o aumento da idade, provavelmente devido ao tamanho reduzido da amostra (23,24).

Em relação ao valor de jitter, que é a variabilidade da f0 a curto prazo, há um aumento nos seus valores a medida que há falta de controle na emissão e aumento de massa. Por outro lado, este parâmetro pode ser treinado, como no caso dos cantores líricos, que apresentam maior controle de sua emissão e conseqüentemente uma qualidade vocal com menos ruído. Este parâmetro está correlacionado com a aspereza e aumento da idade (8) Este estudo encontrou valores entre 1,0 a 1,5% para as mulheres analisadas, que são equivalentes ao estudo realizado por outro autor (14) que foi de 1,5%. Outros trabalhos apresentam valores menores, variando de 0,2 % a 0,62% (7,8,19,23,25). Valor mais elevado de 3,1% foi encontrado por outro autor (22). Houve um aumento de 0,5% para o grupo 3 em relação aos grupos 1 e 2, demonstrando que ocorreu aumento do valor de jitter em relação à idade, dado que concordou com os achados da literatura (1,24).

O valor de shimmer representa a variabilidade da amplitude da onda sonora, demonstra estabilidade fonatória e seus valores aumentados refletem maior ruído na emissão, vozes soprosas e podem sugerir presença de lesões de massa (5). Neste estudo houve variação nos valores entre 0,36 a 0,68dB. Este achado se aproximou um pouco mais do trabalho realizado por outro trabalho (8) que encontrou um valor de 0,22dB para este parâmetro. As demais pesquisas apresentaram valores muito mais elevados variando de 1,4dB a 37,2dB (7,14,19,22,25) .O parâmetro vocal shimmer mostrou aumento com o decorrer da idade e este fato concorda com a literatura já que o shimmer sofre interferência com o aumento da idade (1).

A outra medida de perturbação da freqüência fundamental, PPQ (%), é um índice que indica a variação da periodicidade da amplitude da fonte sonora e também está correlacionado com o controle do sistema fonatório. Este parâmetro também foi maior para o Grupo 3, enquanto os Grupo 1 e 2 apresentaram seus valores dentro da faixa de normalidade. A partir desses dados é possível inferir que com o avanço da idade pode ocorrer uma menor controle fino do movimento da musculatura laríngea, devido redução de tônus e perda de massa muscular e assim aumentar a variabilidade de vibração entre as PPVV a cada ciclo fonatório (26).

Em relação ao APQ, que é uma medida de variação da amplitude, achou-se neste estudo, os valores que variaram de 2,93 a 3,89. Por ser uma medida de perturbação, seu valor representa o nível de estabilidade fonatória e depende do controle do sistema fonatório. Quanto menor controle fonatório, maior será o seu valor. O Grupo 3 apresentou seus valores fora da faixa de normalidade. Este dado pode ser explicado pelo fato de pessoas nesta faixa de idade não apresentam um controle vocal adequado, apresentando tremores e instabilidade na emissão. Os valores aumentados também podem ser justificados pela fase hormonal pela qual as mulheres passam, sendo a qualidade vocal da menopausa caracterizada pela rouquidão e aspereza, que exibe intima relação com o APQ e NHR (24).

A medida de ruído, NHR, variou de 0,15 a 0,68. O ruído é um som aperiódico, que representa o movimento de vibração originado nas pregas vocais, que não encontra relação entre si. Uma voz disfônica apresenta elevados níveis de ruído no espectograma, pela irregularidade de coaptação das pregais vocais (1). Os sujeitos englobados no Grupo 3 foram os que obtiveram maior valor neste parâmetro, o que sugere que com o aumento da idade há redução da capacidade pulmonar, edema vocal devido a quedas hormonais e diminuição da vascularização das pregas vocais (26).

Fukuyama, 2001 (21) encontrou os valores de 2,10 (APQ), 0,30 (PPQ) e 0,12 (NHR) com o programa MDVP em 25 mulheres brasileiras sem queixas vocais. Esses parâmetros foram difíceis de encontrar na literatura nacional. Na literatura internacional encontraram-se valores de APQ para mulheres de 1,75 e 0,12 de NHR (24) e APQ de 1,7 (27).

As diferenças entre os resultados deste trabalho em relação aos encontrados na literatura a respeito dos valores de f0, jitter, shimmer, APQ, PPQ e NHR podem estar relacionados com os diversos programas existentes para extração dos dados, formas de gravação, posição dos microfones, ruído ambiental e também por fatores culturais, que alteram o padrão, de intensidade e freqüência da voz (1,2,8).

As vogais são identificadas por seus formantes, que por sua vez, são as ressonâncias acústicas do trato vocal. Os formantes das vogais variam, dependendo das características anatomofuncionais de cada indivíduo e do posicionamento dos órgãos fonoarticulatórios no momento da emissão (28). Os três primeiros formantes de cada vogal são mais representativos que no diz respeito à descrição acústica das vogais (13). O primeiro formante, denominado F1, depende da abertura da mandíbula, abaixamento da língua, deslocamento vertical da língua e constrição laríngea. F2 depende do movimento horizontal da língua e F3 depende do tamanho da cavidade oral (1).

As pesquisas realizadas por Behlau 1984 (14) e Monteiro (1995) (17) apresentam trabalhos com os valores médios dos formantes para mulheres brasileiras. As pesquisas foram realizadas com número limitado de sujeitos e com programas de análise acústica diferentes, sendo o estudo de Behlau realizado com um espectrógrafo de som V.I. 700 e com 30 sujeitos do sexo feminino e Monteiro utilizou o programa Soundscope, da GW Instruments e com 20 indivíduos do sexo feminino. Os valores encontrados pelas pesquisadoras estão dentro dos valores encontrados neste presente estudo, que foi realizado com programa CSL.

Neste presente estudo, para F1, todas as vogais do Grupo 2 apresentaram valores diminuídos quando comparado ao Grupo 1. Quando comparamos o Grupo 1 com o Grupo 3, exceto as vogais /é/,/ó/, os valores do Grupo 3 apresentam-se mais elevados, mais agudos do que o Grupo 1. Isso significa que o resultado do formante F1 demonstra que há uma queda nos valores a partir dos 40 anos e depois há uma elevação nos valores a partir dos 60 anos. O primeiro formante, F1, depende da abertura da mandíbula e o aumento dos valores dos formantes a partir dos 60 anos pode ser justificado em decorrência de perdas de massa e de gordura podendo caracterizar menor volume de massa óssea e dentária intra-bucal, assim como diminuição da dimensão vertical do terço inferior da face (29).

O formante F2 apresentou valores mais elevados na população mais jovem, grupos 1 e 2. F2 está relacionado com a movimentação da língua no sentido horizontal, depende de um controle fino e preciso da língua, assim com a hipotrofia, redução do tônus que ocorre com a idade, isso de alguma forma pode ter interferido na diferença entre os grupos mais jovens e o Grupo 3.

O formante F3 representa aspectos individualizados do trato vocal de cada falante e quanto menor a cavidade oral, mais elevado será seu valor, em contraposição, quanto maior o tamanho da cavidade oral, menor o valor do formante. Houve aumento nos valores de quase todas as vogais /a/,/e/,/o/,/u/ para o Grupo 3 quando comparado aos Grupos 1 e 2. O aumento de F3 a partir dos 60 anos também pode ser justificado em decorrência de perdas ósseas, dentárias e flacidez da musculatura de língua, aumentando o tamanho da cavidade oral (30).

A escala Girbas foi escolhida, pois, tem a vantagem de ser de simples aplicação, além de ser largamente utilizado na prática clínica (9).

Todos os grupos etários apresentaram a maior parte dos seus indivíduos com escore 0, seguido do escore 1 e poucos apresentaram escore 2. A análise foi realizada com mulheres sem queixas vocais, não fumantes e não etilistas, assim, que já era esperado níveis discretos para rugosidade, tensão e instabilidade.

A rouquidão está relacionada a lesões de massa, que conseqüentemente alteram a regularidade da vibração das pregas vocais. Pode ser originada pelo consumo de tabaco, álcool e a alterações hormonais. A tensão, realizada pela compressão da glote está relacionada com disfonias hipercinéticas e pode ser indício da síndrome de tensão musculoesquelética. A instabilidade na fonação pode indicar falta de controle vocal, alterações emocionais e em casos mais graves, doenças neurológicas (1).

A presença de soprosidade em algumas mulheres pode talvez ser justificada pela presença de fenda triangular posterior freqüente no sexo feminino, porém neste estudo não foi feita a correlação entre achados laringológicos e análise vocal, pois o exame laringológico por se tratar de uma triagem vocal, apenas considerou alteração quando da presença de lesão benigna ou maligna. Não houve, portanto o detalhamento da presença ou não de fendas triangulares nestas mulheres. A astenia não era esperada já que é encontrada normalmente em lesões neurológicas, fraqueza muscular e perda de potência vocal (1).

Os resultados obtidos na avaliação perceptivo-auditiva demonstram que há grande variabilidade entre vozes normais em decorrência da grande diferença inter-sujeitos.


CONCLUSÃO

A pesquisa realizada para extração dos valores de freqüência dos formantes do português brasileiro falado em São Paulo e das medidas de perturbação do sinal sonoro em mulheres, não fumantes, não etilistas e sem queixas vocais demonstrou que se faz necessário a criação de dados normativos, já que os trabalhos realizados com este intuito apresentam número reduzido de sujeitos e com grande variabilidade entre os programas utilizados para extração dos valores.

A freqüência fundamental (f0) foram compatíveis com os valores encontrados na literatura. As medidas de jitter, shimmer, APQ, PPQ e NHR foram compatíveis com a literatura existente, mas também encontrou discrepância em relação a alguns artigos pesquisados, concluindo que esses parâmetros sofrem pela diferença na extração dos dados e na idade. Os achados da análise perceptiva - auditiva demonstram que os valores estão dentro dos padrões de normalidade para vozes normais.

Os dados encontrados nos formantes F1, F2 e F3 foram difíceis de serem justificados pela literatura já que a correlação entre os formantes e a idade não é um achado muito estudado.

Assim, os dados da análise acústica, perceptivo-auditiva e laringológica mostraram concordância entre seus achados e demonstram ser de grande valia para pesquisas de normalidade. Deve-se ressaltar que há grande variabilidade entre as vozes normais, já que a voz é a representação de características individuais.


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1. Doutora em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Professora Coordenadora do Serviço de Fonoaudiologia do ICAVC e do Curso de Especialização em Voz do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho.
2. Especialista em Voz e Disfagia pelo Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Coordenadora do Setor de Fonoaudiologia do Centro Oncológico de Mogi das Cruzes / SP.

Instituição: Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. São Paulo / SP - Brasil.

Endereço para correspondência:
Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho / Setor de Fonoaudiologia
Largo do Arouche, 66 - República
São Paulo/SP - Brasil - CEP: 01219-010 - Telefone: (+55 11) 3367-3844.

Artigo recebido em 17 de Dezembro 2008.
Artigo aprovado em 18 de Dezembro de 2008.
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