Title
Search
All Issues
2
Ano: 2006  Vol. 10   Num. 3  - Jul/Set Print:
Original Article
Versão em PDF PDF em Português TextoTexto em Inglês
Prevalência da Perda Auditiva Induzida pelo Ruído em Trabalhadores de Indústria Têxtil
The Prevalence of Noise Induced Hearing Loss Among Textile Industry Workers
Author(s):
Adriano Ulisses Caldart1, Cíntia Felício Adriano1, Igor Terruel1, Rafael Ferri Martins1, Arnoni Ulisses Caldart2, Marcos Mocellin3
Palavras-chave:
Perda auditiva induzida pelo ruído. Ruído ocupacional. Controle de ruído.
Resumo:

Introdução: Na indústria têxtil, o trabalho das máquinas produz ruído que pode causar danos irreversíveis na audição nos trabalhadores. Objetivo: O objetivo do estudo é determinar a prevalência de PAIR em trabalhadores de uma indústria têxtil na cidade de Brusque (SC), verificar sua intensidade, caracterizar os principais sintomas auditivos, observar a faixa etária mais acometida, identificar o setor de maior risco e relacionar com o tempo de exposição ao ruído. Casuística e Método: Foi realizado estudo transversal em amostra causualizada de 184 trabalhadores divididos proporcionalmente em cada setor, avaliados através de entrevista, exame otoscópico e audiometria ocupacional. Resultados: A prevalência de PAIR foi 28,3% PAIR, com predomínio de perdas auditivas de grau l (46,2%), segundo a classificação de Merluzzi. Os sintomas mais freqüentes foram hipoacusia (30,8%), dificuldade de compreensão da fala (25%), zumbido (9,6%), plenitude auricular (5,8%), tontura (3,8%) e otalgia (3,8%). O setor com maior índice de PAIR foi engenharia industrial com 44,4%, seguidos da fiação com 38,9% e tecelagem com 38,8%, BET (beneficiamento, estamparia e tinturaria) com 23,8% e administração com 3,8%. A faixa etária mais acometida foi de 50 a 64 anos. Os trabalhadores com mais de 20 anos de empresa foram os mais afetados (42,9%). Conclusão: A ocorrência de PAIR foi significativa no grau l, associada à hipoacusia. Os setores de maior risco na indústria são a engenharia, fiação e tecelagem. Houve um aumento dos casos com a idade e tempo de exposição.

INTRODUÇÃO

Nas fábricas em geral e em especial na indústria têxtil, o trabalho das máquinas, no setor de produção, produz ruídos indesejáveis, que quando muito intensos podem causar danos na audição dos trabalhadores. A exposição ao ruído por tempo prolongado, pode levar à disacusia.
As lesões auditivas conseqüentes à perda auditiva induzida pelo ruido (PAIR) decorrem de alterações na estrutura interna da cóclea que acarreta lesões irreversíveis e sintomas como hipoacusia, zumbidos, plenitude auricular e otalgia. Níveis elevados de ruído maiores que 85 dBNA durante 8 horas diárias, por longo tempo são suficientes para causar dano coclear (1).
O diagnóstico de PAIR é realizado pela história de exposição em ambiente ruidoso, exame otorrinolaringológico com ênfase na otoscopia e exame audiométrico A perda auditiva deve ter se desenvolvido gradualmente num período de, geralmente, 6 a 10 anos de exposição contínua a níveis elevados de ruído no trabalho. A otoscopia e o exame físico estão normais. O exame audiométrico revela uma perda auditiva sempre neurosensorial, irreversível, em geral simétrica, com entalhes principalmente nas freqüências de 2000 a 4000 Hz (2).
Apesar do conhecimento do diagnóstico e de programas de prevenção adotados nas indústrias, esta patologia ainda representa ainda um sério problema de saúde ocupacional, principalmente nas indústrias têxteis. Os trabalhos na literatura de GITAU et al. (3), NGUYEN et al. (4), BERLACHEW & BERHANE (5), OSIBOGUN et. al. (6) e SHAKHATREH et al. (7) demonstraram uma elevada prevalência de PAIR em trabalhadores de indústrias têxteis. Com o aumento destas indústrias no Brasil, especialmente no Vale do Itajaí em Santa Catarina, o número de pessoas expostas ao ruído vem aumentando consideravelmente, decorrendo daí a importância de monitoração de audição nos trabalhadores, o diagnóstico precoce de PAIR e sua prevenção, através de programa de conservação auditiva.
O objetivo desse trabalho é determinar a prevalência de perda auditiva induzida pelo ruído em trabalhadores de uma indústria têxtil na cidade de Brusque (SC), verificar a intensidade da patologia, caracterizar os principais sintomas audiológicos, verificar a faixa etária de maior prevalência, identificar o setor da indústria de maior risco e relacionar os casos ao tempo de exposição ao ruído.

CASUÍSTICA E MÉTODO

Este estudo transversal foi realizado no período entre Junho e Novembro de 2004. A indústria possuía um total de 582 funcionários divididos nos setores de tecelagem, fiação, engenharia industrial, expedição, BET (beneficiamento, estamparia e tinturaria) e administração, com níveis de ruído de 88,6 a 103 dB, 86 a 97 dB, 80 a 94 dB, 65 a 70 dB, 76 a 92 dB e 65 a 74,4 dB, respectivamente. Tais medidas foram realizadas durante a jornada de trabalho dos funcionários, através de um decibelímetro "Simpson" modelo 886.
Como a PAIR necessita de pelo menos 5 anos para se desenvolver, foi utilizado o critério de exclusão de tempo de trabalho inferior a 5 anos na indústria, restando então 343 funcionários sendo desse total selecionada uma amostra causualizada de 184 trabalhadores (erro de 5% e grau de confiança de 95%) divididos proporcionalmente em cada setor: tecelagem (67), fiação (18), engenharia industrial (18), expedição (8), BET (42) e administração (31).
Todos os trabalhadores foram avaliados através de um protocolo de triagem composto por entrevista, exame otoscópico e audiometria ocupacional.
Na entrevista era identificado o trabalhador com o nome, idade, sexo, função e tempo de exposição ao ruído e realizado a triagem auditiva, questionando sintomas sintomas otológicos como hipoacusia, zumbidos, dificuldade de compreensão da fala, tontura, plenitude auricular, otalgia e otorréia). Também era questionado sobre doenças sistêmicas como doenças das vias aéreas, DM, HAS, Sífilis, Sarampo, Caxumba, tireoideopatias, doenças renais e antecedentes como problemas otológicos prévios, cirurgias prévias, problemas na família e história exposição ao ruído não ocupacional.
Após a entrevista, realizava-se a otoscopia, com um otoscópio portátil de pilha, para avaliação do conduto auditivo externo e membrana do tímpano.
Por último, era realizado a audiometria tonal e análise das curvas audiométricas após um repouso auditivo de, no mínimo, 14 horas por parte dos trabalhadores (1). Foi utilizado um audiômetro "Interacoustics" modelo AC 40 com certificados de calibração a cada ano. As interpretações das audiometrias tonais foram classificadas, primeiramente, de acordo com os critérios de DAVID e SILVERMANN (8). Em seguida identificou-se as curvas audiométricas indicativas de PAIR, de acordo com SANTINHO e COUTO (9). Por último as audiometrias indicativas de PAIR foram classificadas de acordo com intensidade, segundo a classificação de Merluzzi (10).
Os dados colhidos foram registrados e analisados através de um banco de dados denominado Epi Info 2000, desenvolvido para fins epidemiológicos.
Aos sujeitos da pesquisa foi aplicado o termo de consentimento livre e esclarecido e o protocolo para esta pesquisa foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Paraná.

RESULTADO

A amostra foi de 184 trabalhadores adultos, sendo 153 homens e 31 mulheres, com idade entre 18 e 64 anos e com turnos de trabalho de 8 horas diárias em 6 dias da semana. Em relação à presença de disacusias auditivas 105 trabalhadores (57,1%) estavam normais, 52 (28,3%) apresentaram curvas audiometricas compatíveis com perda auditiva induzida pelo ruído e 27 (44,7%) tinham perdas auditivas por outras causas. A prevalência dos graus de intensidade de PAIR de acordo com os critérios de Merluzzi (10) estão expostos na Figura 1. A Tabela l demonstra o nível de ruído, o percentual e o número de trabalhadores com audição normal, com PAIR e com disacusias por outras causas segundo os setores da indústria. Com relação a faixa etária, a maior prevalência de PAIR foi observada no grupo dos trabalhadores mais velhos, ou seja, com idade variando de 50 a 64 anos. Os sintomas mais freqüentes são mostrados na Figura 2. A Tabela 2 demonstra a relação de tempo de exposição ao ruído na empresa, com os trabalhadores normais, com PAIR e disacusias por outras causas. Verificou-se um aumento dos casos de PAIR à medida que ocorreu o aumento no tempo de exposição.







DISCUSSÃO

Na pesquisa foram encontrados altos níveis de ruído na indústria têxtil, variando de 65 dB a 103 dB, sendo os setores mais ruidosos a tecelagem, fiação e engenharia industrial. COSTA (11), BELACHEW & BERHANE (5) e GITAU et al. (3) também referem a industria têxtil, como um dos ramos industriais com maiores níveis de ruído, principalmente nos setores de tecelagem e fiação, o que explica a alta prevalência de PAIR nesses setores. O maior risco de desenvolver PAIR está, na duração e no nível de ruído a que o trabalhador é exposto, mesmo usando os protetores auriculares, visto que esse dispositivo de proteção individual somente diminui entre 10 a 15 dBNA a intensidade do ruído ambiental (1).
A prevalência encontrada de PAIR nos trabalhadores foi de 28,3%. BELACHEW & BERHANE (5), GITAU et al. (3), SHAKHATREH et al. (7), OSIBOGUN et al. (6) que encontraram prevalência de PAIR de 34,0%, 32,5%, 30,0% e 79,8% respectivamente. MIRANDA et al. (12) observaram uma prevalência de 23,4%, menor que a encontrada neste estudo. Essa prevalência de PAIR encontrada, menor que a maioria das literaturas revisadas, pode ser explicada pelo fato de na indústria onde foi realizado o estudo, há aproximadamente 10 anos vem se realizando medidas preventivas, como o uso de protetores auditivos e audio¬metrias seriadas nos trabalhadores em ambientes ruidosos.
Em relação à distribuição de PAIR pelos diversos setores da indústria, verificou-se que os setores de engenharia industrial (44,4%), fiação (38,9%) e tecelagem (38,8%) obtiveram comportamento semelhante. Embora o setor de engenharia industrial tenha apresentado uma percentagem aproximadamente 5% maior do que os outros setores, este valor, considerando-se que a margem de erro assumida no processo de amostragem foi de 5%, não se mostrou significativo entre os setores de engenharia industrial, fiação e tecelagem. BELACHEW & BERHANE (5) e GITAU et al. (3) apontaram com superioridade a tecelagem (71,7% e 60,0% respectivamente), seguido pela fiação (35,2% e 37,7% respectivamente) como os setores com maior prevalência de PAIR. Verificou-se que os setores de tecelagem e fiação estavam entre os setores mais ruidosos. Essas pequenas diferenças podem ser causadas por fatores, também referidos por KWITKO (13), como a presença de variáveis diversas como idade, sexo, patologia auditiva prévia, doenças associadas, calibração do audiômetro, problemas técnicos das cabines e subjetividade do teste audiométrico.
A maior prevalência de casos de PAIR, estavam no grau l de Merluzzi (10) (45,1%) assim como nos estudos de MIRANDA et al. (12) e SILVA et al. (14), que observaram, com 20,6% e 25,6%, respectivamente.
Também foi possível demonstrar que os casos de PAIR cresceram à medida que aumentou o tempo de trabalho na indústria, e que os trabalhadores com mais de 20 anos de empresa, ou seja, de exposição, foram os mais afetados, com índice de 42,9%. Isto reforça a afirmativa de que os efeitos auditivos dependem principalmente da intensidade e da duração da exposição ao ruído, como também demonstraram COSTA (11) e BELACHEW & BERHANE (5).
O aumento da idade, também aumentava significativamente os casos de PAIR sendo a faixa etária acima de 50 anos a mais acometida (46,2%). GITAU et al. (3), BELACHEW & BERHANE (5) e SILVA et al. (14) demonstraram essa relação.
Entre os sintomas auditivos, a hipoacusia foi o mais freqüente (30,8%), seguido por dificuldade de compreensão da fala, zumbido, plenitude auricular, tontura e otalgia. ARAÚJO (2) encontrou, por ordem de frequência: zumbidos, dificuldade de compreensão da fala, tonturas, hipoacusia, otorréia e sensação de plenitude auricular. OLIVEIRA et al. (15), observaram que o zumbido foi o mais freqüente, ocorrendo em 28,2% dos casos.
Chamou a atenção que, embora as medidas preventivas estivessem sendo adotadas a longo tempo, ocorre a PAIR, embora no Grau I de Merluzzi (10), de modo significativo. Este fato reafirma a necessidade de seguimento efetivo, por parte das indústrias, com Programas de Conservação Auditiva, priorizando a conscientização dos trabalhadores e empregadores em relação à importância do uso regular de protetores auditivos.

CONCLUSÃO

Sendo assim, conclui-se que a prevalência de PAIR na indústria foi de 28,3%, e a maioria dos casos de restou caracterizada como de grau l, com 46,2 % dos trabalhadores afetados, seguidos por grau 2 com 42,3%, grau 3 com 5,8%, grau 4 com 3,8% e grau 5 com 1,9%. Nos trabalhadores com PAIR a hipoacusia foi o sintoma mais freqüente aparecendo em 30,8%, seguidos de dificuldade de compreensão da fala em 25%, zumbido em 9,6%, plenitude auricular em 5,8%, tontura e otalgia em 3,8%. A faixa etária de maior acometimento de PAIR foi de 50 a 64 anos. Os setores de maior risco foram os de engenharia industrial, fiação e tecelagem. Houve um aumento de PAIR à medida que se aumentou o tempo de exposição ao ruído, especialmente após 21 anos de exposição.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Nudelmann AA, Costa EA, Feligman J, Ibáñez RN. Perda auditiva induzida pelo ruído. Rio de Janeiro: Revinter; 2001.
2. Araújo SA. Perda auditiva induzida pelo ruído em trabalhadores de metalúrgica. Rev Bras Otorrinol, 2002, 68: 47-52.
3. Gitau JM, Mwikali JM, Bett KW, Njau ZG. Noise induced hearing loss among textile industry workers in Eldoret, Kenya. Disponível em: www.medlib.iupui.edu/moi/gitau-cobesiv.htm. Acessado em 16 Jun 2004.
4. Nguyen Al, Nguyen TL, Van TL, Hoang MH, Nguyen S, Jonia H, et al. Noise levels and hearing ability of workers in a textile factory in Vietnam. Ind. Health, 1998; 36: 61-5.
5. Belachew A, Berhane Y. Noise-induced hearing loss among textile workers. Ethiop J Health Dev, 1999, 13: 69-75.
6. Osibogun A, Igweze IA, Adeniran LO. Noise-induced hearing loss among textile workers in lagos metropolis. Niger Postgrad Med J 2000, 7: 104-111.
7. Shakhatreh FM, Abdul-baqi KJ, Turk MM. Hearing loss in a textile factory. Saudi Med J 2000, 21: 58-60.
8. Davis H, Silverman, SR. Hearing e deafness. 3rd ed. New York: Holt, Renenhart & Winston; 1970.
9. Santinho E, Couto HA. Audiometrias ocupacionais: guia prático. Belo Horizonte: Ergo; 1995.
10. Merluzzi F. Metodologia di esecuzione del controllo dell'udito dei lavoratori esposti a rumore. Nuovo Arch Ital Otol, 1979, 7: 695-712.
11. Costa VHC. O ruído e suas interferências na saúde do trabalhador. Rev SOBRAC, 1994, 13: 912-26.
12. Miranda CR, Dias CR, Pena YPGL, Nobre LCC, Aquino R. Surdez ocupacional em trabalhadores industriais da região metropolitana de Salvador, Bahia. Rev Bras Otorrinol, 1998, 64: 109-114.
13. Kwitko A. Avaliação epidemiológica dos dados audiométricos ocupacionais. Rev ACTA AWHO, 1998, 17: 193-202.
14. Silva LF, Santos SA, Shoraiski NY, Silva JS, Priorte SV, Koiski SM, et al. Estudo da prevalência da perda auditiva induzida por ruído em trabalhadores de uma indústria gráfica. Distúrbios da Comunicação, 1998; 10: 45-58.
15. Oliveira TMT. Implantação de um programa de conservação auditiva de uma indústria de bebidas. Rev Bras Saud Ocup, 2002; 24: 31-6.
  Print:

 

All right reserved. Prohibited the reproduction of papers
without previous authorization of FORL © 1997- 2024