INTRODUÇÃOMeningioma é uma neoplasia intracranial comum, com um padrão de crescimento histomorfológico, em geral, facilmente reconhecido. Entretanto, meningiomas extra-craniais primários da cavidade nasal, dos seios paranasais e da nasofaringe são raros. A literatura é geralmente limitada a relato de casos isolados com poucas revisões na literatura (1).
Meningioma é responsável por aproximadamente 20% de todas as neoplasias intracraniais, sendo o segundo tumor mais comum do sistema nervoso central (seguido dos gliomas). Meningiomas primários dos seios paranasais são extremamente raros, apenas aproximadamente 30 casos foram previamente descritos na literatura da língua inglesa (2).
Os meningiomas surgem de células meningoteliais aracnóides, que são derivadas do neuroectoderma. Entretanto, eles são usualmente classificados como tumores da mesoderme (2).
O presente estudo propõe-se a relatar um caso de meningioma nasal atendido em nosso serviço.
RELATO DE CASOPaciente, 48 anos, feminina, negra, procurou o Serviço de Otorrinolaringologia do Complexo Hospitalar Santa Casa em março de 2000, com queixas de obstrução nasal associada à secreção purulenta com raias de sangue.
Na rinoscopia anterior apresentava lesão na fossa nasal esquerda (FNE) entre o septo e os cornetos. Realizou tomografia computadorizada (TC) que evidenciou a presença de material com densidade de partes moles em cavidade nasal (meato médio) e labirinto etmoidal (Figuras 1 e 2). Realizou-se biópsia da lesão que revelou neoplasia de células fusiformes em cório de mucosa respiratória, compatível com meningioma.
Figura 1. Tomografia em corte coronal mostrando velamento do teto da fossa nasal entre a concha média e o septo nasal, à esquerda.
Figura 2. Tomografia em corte axial mostrando o velamento das células etmoidais posteriores, do esfenóide e da fossa nasal, à esquerda.
Foi submetida à cirurgia endoscópica nasal em 13/07/2000. Apresentou boa evolução pós-operatória, sem complicações ou intercorrências. Em março de 2001, apresentava-se sem queixas, a endoscopia nasal revelava ausência de lesões ou sinais de recidiva com óstio de seio esfenoidal livre.
Em 2005, após 5 anos da cirurgia, a paciente mantinha-se assintomática, apresentando endoscopia nasal normal, sem sinais de recidiva da lesão.
DISCUSSÃOMeningioma é um tumor bem conhecido do sistema nervoso central, mas recentemente apareceu como um tumor primário extra-cranial dos seios paranasais (2).
Meningiomas envolvendo a cavidade nasal e paranasal são raros. Podem ocorrer como resultado da extensão de uma massa intracranial primária, entretanto não é um evento comum, em que a ocorrência estimada é de apenas 3% dos casos. Tais tumores também podem ser descritos sem evidência de tumor intracranial. A origem desses tumores é incerta, incluindo origem das células aracnóides ao redor de nervos ou células heterotópicas deslocadas no momento do fechamento de estruturas da linha média na vida fetal. A origem de células de Schwann ou de células mesenquimais pluripotenciais é também sugerida (3).
Na região da cabeça e pescoço, meningiomas extracraniais primários foram descritos nos ossos do crânio, órbita, osso temporal, ouvido interno, cavidade nasal e seios paranasais. São classificados em 4 tipos:
- Extensão extra-cranial de meningioma com origem intra-cranial;
- Extensão extra-cranial de meningioma que surgiram no forame neural;
- Meningioma extra-cranial primário e ectópico sem relação com o forame de nervo cranial ou com o endocrânio.
- Metástase extra-cranial de meningioma intracranial para linfonodo parafaringeal (2).
Clinicamente, uma variedade de sinais e sintomas são descritos, incluindo obstrução e secreção nasal, pólipos nasais, dor maxilar, edema periorbital, exoftalmia, proptose, ptoses, diminuição da acuidade visual, perda auditiva e cefaléia (3).
Em relação à histologia, observa-se meningoteliomas, ou seja, células lobuladas com contornos irregulares e nucléolo aumentado com cromatina visível e rosada, além de células transicionais, mais comuns e com corpos de psamomas no seu interior (4).
Meningiomas transicionais são os mais comuns desse tipo de tumor (75% dos casos), seguidos pelos tumores sincisiais e fibrosos (cerca de 10% cada), angioblásticos (5%) e sarcomatosos (< 1%) (2).
No diagnóstico diferencial dos meningiomas do trato sinonasal há uma variedade de neoplasias benignas e malignas, incluindo tumores epiteliais (carcinomas), tumores neurogênicos (melanoma e neurobalstoma olfatório), tumores vasculares (angiofibroma e paraganglioma) e tumores do tecido mesenquimal (fibroma ossificado psamomatóide agressivo) (1).
O prognóstico dos meningiomas primários do trato sinonasal é excelente, com sobrevida de 82,1% e 78,6% em 5 e 10 anos, respectivamente. Metástases deste tumor não foram encontradas em relatos da literatura. A mortalidade não é significativa, com letalidade pelas complicações operatórias e lesão de estruturas vitais (1).
O diagnóstico é feito com o exame do material patológico. Tal neoplasia envolvendo a cavidade nasal ou seios paranasais é frequentemente de crescimento lento.
Com excisão cirúrgica, o prognóstico dos meningiomas primários da cavidade nasal parece favorável, com baixo índice de recidivas documentadas. O prognóstico dos pacientes com envolvimento intracranial é, entretanto, menos favorável (3).
Exérese cirúrgica com margens amplas é o tratamento de eleição (5). Tratamentos adjuvantes, como radioterapia, não se mostraram eficazes, nem na recorrência da doença (1).
SWAIN et al. em um estudo retrospectivo em que revisaram os casos de meningiomas de seios paranasais nos últimos 25 anos, encontraram 3 casos, incluindo o seio frontal, etmoidal e esfenoidal. Os pacientes que apresentavam neoplasia no seio frontal e etmoidal foram submetidos a tratamento cirúrgico, entretanto, o paciente com meningioma do seio esfenoidal foi submetido a tratamento radioterápico (6).
SCIARRETTA et al. revisou 33 casos de tumores benignos do seio paranasal, entre eles, meningioma, em que avaliou a eficácia do tratamento cirúrgico endoscópico. Com um seguimento de 28 meses, tal autor apresentou apenas 6% de recidiva e concluiu, dessa forma, que a cirurgia endoscópica, em casos selecionados, pode ser considerada um tratamento efetivo na ressecção de tumores benignos do trato sinonasal (7). O caso relatado em nosso trabalho também foi tratado com cirurgia endoscópica e, com um seguimento de 36 meses, não apresentou sinais de recidiva.
COMENTÁRIOS FINAISMeningiomas do trato sinonasal são lesões incomuns. Os critérios clínicos e radiológicos desses tumores são inespecíficos, e conseqüentemente o diagnóstico exato requer a avaliação histológica. Histologicamente e imunofenotipicamente, os meningiomas do trato sinonasal são indistinguíveis dos meningiomas intracraniais. As características patológicas e os critérios imunohistoquímicos podem permitir a distinção entre essas neoplasias e outros tumores do trato sinonasal. A ressecção cirúrgica completa em meningiomas do trato sinonasal tem em geral um bom prognóstico (1).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1. Thompson LDR, LCDR, MC, USNR; Gyure A. Extracranial Sinonasal Tract Meningiomas: A Clinicopathologic Study of 30 Cases With a Review of the Literature Am J Surg Pathol. 2000, May;24(5):640-50.
2. Daneshi A, Asghari A, Bahramy E. Primary meningeoma of the ethmoid sinus: a case report. ENT- Ear, Nose & Throat Journal, 2003 April, 82(4):310-311.
3. Mccullough JB, Evans AT, Vaughan-Jones R, Hussein KA. Fine needle aspiration (FNA) of a nasal meningioma: a case report. Cytopathology, 1996, 7, 56-60.
4. Daneshi A., Asghari A, Bahramy E. Primary meningioma of the ethmoid sinus: a case report. Ear Nose Throat J. 2003, Apr;82(4):310-1.
5. Couldwell WT, Weiss MH, Rabb C, Liu JK, Apfelbaum RI, Fukushima T. Variations on the standard transsphenoidal approach to the sellar region, with emphasis on the extended approaches and parasellar approaches: surgical experience in 105 cases. Neurosurgery. 2004 Sep;55(3):539-47; discussion 547-50.
6. Swain REJ, Kingdom TT, DelGaudio JM, Muller S, Grist WJ. Meningiomas of the paranasal sinuses. Am J Rhinol. 2001, Jan-Feb;15(1):27-30.
7. Sciarretta V, Pasquini E, FranK G, Modugno GC, Cantaroni C, Mazzatenta D, et al. Endoscopic treatment of benign tumors of the nose and paranasal sinuses: a report of 33 cases. Am J Rhinol. 2006J, an-Feb;20(1):64-71.
1. Mestre em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Cooordenador do Ambulatório de Rinologia do Serviço de ORL do Complexo Hospitalar Santa Casa de Porto Alegre).
2. Médica formada pela Universidade de Passo Fundo-RS (Médica).
3. Médico Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Complexo Hospitalar Santa Casa - Porto Alegre. (Médico Residente do 3º Ano de Otorrinolaringologia).
4. Médico Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Complexo Hospitalar Santa Casa - Porto Alegre. (Médico Residente do 2º Ano em Otorrinolaringologia).
5. Acadêmica de Medicina da Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre (Acadêmica de Medicina).
Instituição: Serviço de Otorrinolaringologia do Complexo Hospitalar Santa Casa - Porto Alegre/RS.
Endereço para correspondência: Guilherme Luís da Silva Franche
Rua Mostardeiro 333/508 - Bairro Moinhos de Vento - Porto Alegre / RS - Cep 90430-001
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Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da R@IO em 24/10/2006 20:38:54 e aprovado em 19/12/2006 21:49:54.