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Ano: 2007  Vol. 11   Num. 4  - Out/Dez Print:
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Estudo Experimental de Corticóide Injetável em Microcirurgia Laríngea
Experimental Study of Injetable Corticoid In Laringeal Microsurgery
Author(s):
Bruno Leonardo Freire de Alencar1, Eduardo Baptistella2, Osvaldo Malafaia3, Nicolau Gregori Czeczko4, Tiago Fernando Scopel5, Fabiano de Trotta6, Ana Flávia Cardoso Buarque Costa6, Sandra Sayuri Watanabe7, Thanara Pruner da Silva8
Palavras-chave:
Corticosteróides. Cicatrização. Prega vocal. Porcos.
Resumo:

Objetivo: Avaliação macroscópica da presença de sinéquias e quantificação comparativa da deposição de fibras de colágeno total em pregas vocais após exérese de fragmento de mucosa a frio, com, ou sem, o uso de corticóide injetável local. Tipo: experimental controlado. Método: utilizaram-se 12 porcos da raça larger white anestesiados para exérese de fragmento de mucosa de borda livre da prega vocal direita e posterior divisão em dois grupos: controle, privados de corticóide injetável, com procedimento cirúrgico em prega vocal direita; experimento, animais com injeção de corticóide em prega vocal direita pré- procedimento cirúrgico. Após o 30º dia, procedeu-se eutanasia para coleta de fragmentos das pregas vocais, posteriormente coradas pela técnica de picrosirius red e analisadas sob luz polarizada para quantificação depósito de colágeno total. Resultados: Não se observou sinéquias no terço anterior das pregas vocais operadas nos grupos estudados. No controle, a média da área do depósito nas pregas vocais esquerdas não operadas foi de 3116,33 micrômetros quadrados e das direitas operadas, 2353,28 micrômetros quadrados. No experimento foram observados os valores de 3526,05 micrômetros quadrados e 2167,92 micrômetros quadrados respectivamente. O corticóide injetado na prega vocal operada não promoveu diminuição de depósito de colágeno total (p=0,1320). Conclusões: Não se observaram operado e sem corticóide. sinéquias macroscópicas no modelo experimental. A injeção não significativa de depósito do colágeno total em micrômetros quadrados, em comparação ao controle de corticóide na lâmina própria das pregas vocais dos animais promoveu diminuição.

INTRODUÇÃO

A lâmina própria tem papel fundamental na viscosidade, contratilidade e formação de onda mucosa da prega vocal. Seu bom funcionamento é determinante para o início e manutenção da vibração sustentada pelo fenômeno de Bernoulli (1). Os seres humanos podem emitir sons dentro de uma ampla faixa de freqüência e intensidade, com uma grande variedade de qualidades tonais. Para isso, utilizam suas pregas vocais, que possuem características histológicas e estruturais muito bem adaptadas à função de fonação. Do ponto de vista fonatório, a noção mais importante da histologia da prega vocal é que ela constitui uma estrutura com múltiplas camadas, que têm propriedades mecânicas diferentes. A prega vocal não funciona como um vibrador de estrutura única, como a corda de um instrumento musical, mas sim como um vibrador de múltiplas camadas diferentes. Esta estrutura laminar permite a ampla gama de ajustes de freqüência e intensidade da voz humana (2). FRIEDRICH et al (1993) reforçam o conceito da estrutura complexa da prega vocal, que é a base da compreensão da capacidade vocal humana (3).

As técnicas de microflap foram desenvolvidas para permitir dissecação e excisão de cistos, pólipos e nódulos maduros na camada superficial da lâmina própria, enquanto se preservam a camada mucosa normal adjacente e o ligamento vocal subjacente (4,5,6). Seu objetivo é minimizar a formação de cicatriz e conseqüente endurecimento com formação de sinéquias na cobertura mucosa responsáveis pelo prejuízo da vibração da prega vocal.

Estudos clínicos realizados com o objetivo de avaliar os efeitos do uso de corticóide injetado na lâmina própria da prega vocal, com o auxílio de fibroscópico em cirurgia laríngea sob anestesia local sem causar lesão da estrutura, apontaram seu efeito benéfico no tratamento de lesões fonotraumáticas, tais como nódulos vocais e edema de Reinke, relacionando-se com melhora da qualidade vocal, diminuição do tempo de fonoterapia e, na maioria dos casos, remissão das lesões (7,8).

Também há relato de melhora no fechamento glótico e da qualidade vocal após a injeção do corticóide imediatamente seguida pelo microflap (9). Porém, um estudo realizado em modelo canino, não correlacionou a injeção de corticóide pré-microflap com diminuição da cicatrização no grupo experimental, assim como não revelou diferença na função da prega vocal medida por meio de videoestroboscopia (10).

A formação de cicatriz nas camadas da lâmina própria das pregas vocais resulta na relação anormal entre corpo e cobertura mucosa, comprometendo seu deslizamento sobre o corpo, levando a diminuição da onda mucosa. Se a cicatriz piorar, o segmento sem onda mucosa pode aumentar agravando a disfonia. Há relatos comprovando ser esta a razão mais comum de disfonia (35%), seguida da cirurgia endolaríngea (11).

Os corticoesteróides sistêmicos, ou injetados nas pregas vocais, são freqüentemente usados em associação ao microflap laríngeo na tentativa de se prevenir a formação de cicatriz, desta forma assegurando melhor qualidade vocal. Os corticóides sistêmicos atrasam a cicatrização levando a uma melhor organização dos tecidos cicatriciais, no entanto, seus efeitos sobre as pregas vocais não estão bem esclarecidos (10).

Terapias adjuvantes têm sido investigadas para ajudar a modular o processo cicatricial na prega vocal, após excisão de sua cobertura mucosa. Corticoesteróides sistêmico ou tópico (12), resfriamento prévio ao procedimento cirúrgico, cola de fibrina dentre outros métodos têm sido usados no sentido de melhorar a cicatrização da cobertura mucosa após o procedimento fonocirúrgico (13).


OBJETIVOS

A partir da revisão da literatura consultada, objetivou-se:

a. Observar macroscopicamente a presença de sinéquias em cordas vocias após exérese de fragmento de mucosa com instrumento frio com e sem o uso de corticóide injetado na prega vocal.

b. Quantificar comparativamente a deposição das fibras de colágeno total em pregas vocais suínas submetidas a exérese de fragmento de mucosa com e sem o uso de corticoterapia injetável.


MÉTODO

Estudo realizado na Fazenda Experimental da Universidade Federal do Paraná - UFPR, sediada no município de Piraquara, após aprovação dos documentos necessários à realização do experimento, pelo comitê de ética em pesquisa do Hospital Angelina Caron sob o protocolo número 008-2005. Para tanto, foram obedecidos os princípios do Colégio Brasileiro de Experimentação Experimental-COBEA e as recomendações de eutanásia para animais experimentais propostas por Close e pelo Internacional Comitee on Veterinary Gross Anatomical Nomenclature.

Foram utilizados doze porcos da raça larger white (Suideo Sus), sendo sete machos e cinco fêmeas, com idade variável de 27 a 31 dias, média ponderal de 10,1kg (8,7 Kg a 11,5 kg). Os animais foram divididos aleatoriamente em dois grupos numericamente iguais: (Quadro 1).




No grupo controle foi realizada cirúrgia em prega vocal direita sem a utilização de corticóide injetável. O procedimento cirúrgico de exérese do fragmento mucoso da prega vocal direita foi realizado com tesoura laríngea, iniciando com a preensão da mucosa do terço anterior do bordo livre da prega vocal direita, com pinça de preensão de Bouchayer (Microfrance®). A seguir, procedeu-se o corte de cerca de dois milímetros na mucosa apreendida com tesoura curva laríngea para a esquerda. A prega vocal esquerda do controle não sofreu manipulação cirúrgica.

No grupo experimento, antes de realizar o procedimento cirúrgico de exérese dos fragmentos de mucosa da prega vocal direita no grupo experimento, injetou-se 01ml de fosfato dissódico de dexametasona, com (venescalp) agulha 23G em cada prega vocal, guiado com pinça de preensão de Bouchayer (Microfrance®). O venescalp foi introduzido no terço anterior das pregas vocais direita e esquerda em sua camada superficial da lâmina própria, nos seis animais do experimento. A exérese do fragmento mucoso da prega vocal direita foi realizado com tesoura laríngea, iniciando-se logo após a injeção de corticóide com a preensão da mucosa do terço anterior do bordo livre da prega vocal direita, com pinça de preensão de Bouchayer (Microfrance®). A seguir procedeu-se o corte de aproximadamente dois milímetros da mucosa apreendida com tesoura curva laríngea para a esquerda. A prega vocal esquerda não foi submetida a exérese de fragmento mucoso, apenas recebendo injeção de corticóide.

A eutanásia dos animais foi realizada 30 dias após o procedimento cirúrgico, no abatedouro da Fazenda Experimental da UFPR, sendo seguida pela retirada de toda a laringe do animal para análise das pregas vocais. A análise macroscópica de glote no terço anterior das pregas vocais objetivava pesquisa de presença, ou ausência, de sinéquias pós-operatórias; em seguida se realizou incisão longitudinal ventral na laringe com bisturi lâmina nº15 para exposição das pregas vocais e nova análise macroscópica de presença, ou ausência, de sinéquias pós-operatórias; uma nova incisão foi realizada rente à cartilagem tireóide para exérese de fragmento mucoso da prega vocal.

A leitura das lâminas foi realizada através do programa Pro-image-plus 4.5® para Windows® em um computador Pentium IV® acoplado ao microscópio Olympus® BX50 e câmera de vídeo Sony®, calibrado previamente em micrômetros com objetiva de 20 vezes, esse programa fez a leitura de tecidos corados com picrosirius red, inicialmente analisando a característca microscópica do tecido como epitélio e submucosa. Com um comando no sistema Pro-image-plus 4.5®, sucedeu-se a polarização da imagem para análise de depósito de colágeno feita através das cores do tecido. As medidas foram transferidas para o programa Excel Windows®.

Também foi medida a fibroplasia (em micrômetros quadrados), que consiste na deposição de colágeno na superfície da mucosa decorrente do processo cicatricial.

Para avaliação estatística utilizou-se comparação pareada (lado direito com lado esquerdo (intra-grupo) com auxílio do teste não-paramétrico de Wilcoxon. Quando realizadas comparações de resultados inter- grupos, aplicou-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney. Em todas as comparações efetuadas, a hipótese nula correspondeu a resultados iguais no grupos pareados e a hipótese alternativa, a resultados diferentes. Para tanto admitiu-se um valor de p < 0,05 como nível de significância.


RESULTADOS

A análise macroscópica evidenciou ausência de sinéquias na mucosa laríngea pós-operatória, nos dois grupos estudados.

Realizada a polarização da imagem, pode-se diferenciar o tecido colágeno objeto da pesquisa do tecido não-colágeno, observando o caráter birrefringente do colágeno, coloração laranja e vermelho, quando comparada com a substância não-colágeno de coloração enegrecida (Figura 1); (Figura 2).


Figura 1. Exemplo de Lâmina do animal (Amostra / E-D3) corada pela técnica de Picrosirius Red demonstrando tecido conjuntivo da lâmina própria antes da polarização (aumento
400x).


Figura 2. Exemplo de lâmina do animal (Amostra / E-D3) corada pela técnica de Picrosirius Red demonstrando o tecido conjuntivo após polarização (aumento 400x).



No grupo controle (animais não submetidos a injeção de corticóide na prega vocal) a média da área de depósito na submucosa das pregas vocais esquerdas não submetidas a lesão cirúrgica foi de 3116,33 micrômetros quadrados e das pregas vocais direitas submetidas a lesão cirúrgica foi de 2353,29 micrômetros quadrados (Tabela 1).




No experimento (animais submetidos a injeção de corticóide na prega vocal) os valores observados foram, 3526,05 micrômetros quadrados e 2167,92 micrômetros quadrados respectivamente (Tabela 1).

Ao se comparar o depósito de colágeno do controle sem lesão versus o controle com lesão, observou-se p = 0,0464, evidenciando que a diferença entre a quantidade de colágeno total entre os grupos comparados foi estatisticamente significativa (Quadro 2).



A mesma comparação realizada entre o controle sem lesão versus o experimento com lesão revelou p = 0,0043, também revelando deiferença significativa da quantidade de colágeno total depositado nas pregas vocais dos grupos comparados (Quadro 2). Comparando-se experimento sem lesão versus controle com lesão obtivemos p = 0,0065; na comparação experimento sem lesão versus experimento com lesão, p = 0,0277, o que evidenciou a significância estatística, ou seja, houve diferença entre a quantidade de colágeno total entre os grupos comparados (Quadro 2).


DISCUSSÃO

Na revisão de literatura realizada, apenas um trabalho comparando cirurgia endolaríngea em modelos experimentais animais foi encontrado. Nele era realizada comparação entre pregas vocais de cão, porco e macaco, observando a quantidade de deposição de colágeno, fibras de elastina e tecido amorfo e sua conclusão foi que as pregas vocais do porco e do cão apresentam maior concentração de fibras elásticas e colágeno nas camadas profundas da lâmina própria, assemelhando-se às características histológicas da prega vocal humana mais do que a do macaco. As pregas vocais suínas e caninas apresentam um plano de dissecção do "microflap" que mais se assemelhava à humana (14).

Também foram encontrados dois trabalhos relatando a utilização do corticóide em lesões de pregas vocais. Um estudo clínico relatou melhora no fechamento glótico e na qualidade vocal após a injeção de corticóide imediatamente seguida do "microflap" nas cordas vocais. E um estudo experimental com modelo canino, que utilizou a injeção de corticosteróides antes do "microflap" , concluiu que, apesar dos corticóides causarem atraso no processo cicatricial, tanto no infiltrado inflamatório, como na neovascularização, não implicou melhoras quantitativa nem qualitativa à análise estroboscópica da laringe (9,10).


Os corticóides sistêmicos agem promovendo atraso da cicatrização propiciando melhor organização do tecido cicatricial e freqüentemente são utilizados em associação ao microflap laríngeo na tentativa de prevenir formação de cicatrizes, desta forma permitindo melhor qualidade vocal. Em relação ao uso dos corticóides injetáveis na prega vocal, ainda não há muitas informações disponíveis na literatura (10).

No presente estudo, observou-se diminuição de depósito de colágeno total no grupo operado com corticóide em relação ao grupo operado sem corticóide, porém concordando com a literatura, essa diminuição não foi significativa. 10

Ocorreu diferença significativa na comparação dos grupos em relação à cirurgia (com ou sem lesão), observado tanto no experimento quanto no controle. Nos que sofreram cirurgia (lesão) houve menor depósito de colágeno total.

Ausência de relevância estatística na diminuição do colágeno total no grupo operado com corticóide observada neste trabalho permite observar a necessidade de mais estudos experimentais com objetivos de avaliar a ação dessas substâncias em áreas cicatriciais de pregas vocais, embora muitos estudos clínicos comprovem sua utilização com melhora da qualidade vocal em pacientes com lesões fonotraumátricas (nódulos vocais, pólipos e edema de Reinke), sem lesões cicatriciais (excisionais) 7,8.


CONCLUSÕES

Os resultados obtidos neste estudo experimental com suínos permitem concluir:

a. Não foi observada presença de sinéquias no modelo experimental de exérese de fragmento de mucosa nas bordas livres com instrumento frio, com, ou sem, uso de corticóide injetado na prega vocal à análise macroscópica.

b. A utilização de corticóide injetado na lâmina própria das pregas vocais submetidas a exérese de fragmento de mucosa da borda livre com instrumento frio, promoveu diminuição não significativa do depósito do colágeno total na submucosa quantificado pela microscopia óptica com auxílio do programa Pro-image-plus 4.5®.


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14. Garrett CG, Coleman JR, Reinisch L. Comparative histology and vibration of the vocal folds: implications for experiemntal studies in microlaryngeal surgery. Laryngoscope. 2000; 110:814-24.














1. Médico Otorrinolaringologista e Mestre em Cirurgia pelo IPEM.
2. Médico Otorrinolaringologista do Centro Médico Especializado Baptistella e Preceptor de Residência em Otorrinolaringologia do Hospital Angelina Caron.
3. Livre Docente pela Faculdade Federal do Paraná. Professor Titular da UFPR, Diretor Científico do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva, Coordenador do Instituto de Pesquisas Médicas do HUEC e Professor Titular da Disciplina de Clínica Cirúrgica da FEPAR.
4. Doutor em Ciências da Saúde pela Faculdade Federal do Paraná. Integrante da Secretaria de Estado de Adiministração do Paraná, Médico da HUEC, Professor da Faculdade Evangélica do Paraná e Professor Adjunto IV da Universidade Federal do Paraná.
5. Médico Residente em Otorrinolaringologia no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba - Primeiro Ano.
6. Acadêmico de Medicina da Faculdade Evangélica do Paraná - Décimo Segundo Período.
7. Acadêmina de Medicina da Faculdade Evangélica do Paraná - Décimo Período.
8. Acadêmica de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná - décimo período)

Endereço para correspondência:
Dr. Eduardo Baptistella
Avenida João Gualberto, 1795 - Conj 01 Juvevê
Curitiba/PR - CEP 80030-001
Fax: (41) 3039-8878
e-mail: fabiano_trotta@yahoo.com.br

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da R@IO em 13 de outubro de 2007. Cod. 343. Artigo aceito em 2 de novembro de 2007.
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