INTRODUÇÃO O granuloma de colesterol (GC) habitualmente se localiza no ouvido, sendo raro em outros sítios na cabeça ou no pescoço. O diagnóstico clínico é difícil, sendo efetivado somente no exame histopatológico. O fator fisiopatológico mais importante é a presença de uma cavidade aérea mal ventilada com pontos de hemorragia. Existem poucos casos relatados de GC nos seios paranasais, sendo que nove casos no seio maxilar foram citados na série mais extensa encontrada, a retrospectiva dos últimos 22 anos do Serviço de Otorrinolaringologia do Royal National, Nose and Ear Hospital, (Gray's Inn Road, London) (1).
O diagnóstico diferencial inclui as mucoceles, cistos, cisto de origem dental e doença maligna. Alguns pacientes podem apresentar características radiológicas que sugerem o GC, mas não existem sinais que alertem o cirurgião antes da operação (1). O tratamento é cirúrgico consistindo na remoção total da lesão. Na literatura foram encontrados 37 casos de GC no seio maxilar (1-15).
RELATO DO CASO Paciente masculino, caucasóide, 51 anos, veio ao ORL com quadro de epífora no olho direito há 2 meses. As consultas prévias ao oftalmologista e alergista não elucidaram o caso. Não havia história de infecção nasal ou sinusal nem episódios de barossinusites, haja visto o paciente ser entusiasta do mergulho em profundidade.
O exame otorrinolaringológico mostrou lesão tumoral pequena, vermelha clara, localizada na concha média parecendo se originar do seio maxilar. A tomografia computadorizada revelou lesão tumoral extensa, encapsulada, com conteúdo irregular, preenchendo todo o seio maxilar direito, etmóide anterior e parte da fossa nasal ipsilateral (Figuras 1 e 2). Face ao grande volume da lesão e para conveniente exploração do assoalho da órbita, optou-se pela ressecção da lesão através de um acesso combinado pela técnica de Caldwell-Luc e procedimento intranasal guiado por telescópio. Durante o ato operatório percebeu-se que a lesão encapsulada era preenchida parcialmente por conteúdo endurecido, amarelo escuro e por líquido viscoso ora claro, ora amarelado. A lesão foi completamente ressecada, sem danos às estruturas anatômicas remanescentes. O exame anatomopatológico mostrou achados típicos de GC (Figura 3).
Figura 1. TC em corte coronal mostrando lesão tumoral extensa, encapsulada, preenchendo todo oseio maxilar.
Figura 2. TC em corte axial . compressão do ducto nasolacrimal pela lesão.
Figura 3. Células gigantes circundando as fendas criadas pelos cristais de colesterol (espaço com forma de agulha vazia).
DISCUSSÃO O GC é a expressão clínica da reação granulomatosa aos cristais de colesterol precipitados nos tecidos.
Comumente encontrado na mastóide e nas células aéreas do ouvido médio, o GC não é encontrado na cavidade nasal, mas surgem nas cavidades paranasais fechadas que provêm condições excelentes para seu aparecimento (11). Os seios maxilar e frontal são os mais atingidos (1,2,3,12).
O GC está associado com hemorragias da mucosa, sendo esperado e freqüente nos seios maxilar e frontal, e, no entanto, somente poucos casos são relatados na literatura (3). O mecanismo fisiopatológico da formação do GC no seio consiste na presença de hemorragias no interior das cavidades com subsequente formação e liberação de tecido degenerado e de transudato.
Os seios paranasais são cavidades fechadas com via de drenagem linfática exígua, portanto mais vagarosa e difícil, condição essencial para se ter o tempo necessário para o colesterol se dissociar e precipitar como cristais e, então, terem início as trocas granulomatosas (11). Existem algumas citações interessantes na literatura, como o relato de seis casos na mesma região de Sivas, na Turquia (8), um caso de GC associado ao aspergiloma (9) e outro em paciente com hipercolesterolemia (7) . O quadro clínico não é específico e depende da localização, extensão e volume da lesão. A erosão óssea pode ser vista em lesões com crescimento acentuado (1,6,13,14).
No nosso caso, pensamos se o aparecimento do GC não teria relação de casualidade com as prováveis pequenas hemorragias produzidas pelos mergulhos submarinos freqüentes do paciente, mesmo com o paciente negando a ocorrência de acidentes do tipo barotrauma. Chama a atenção o quadro clínico pobre frente ao grande volume da lesão, mostrando, talvez, um crescimento lento (Figura 1). A epifora foi produzida pela compressão do ducto nasolacrimal (Figura 2). O diagnóstico diferencial radiológico inclui mucocele, cisto dentígero, cisto de retenção volumoso e pseudocisto, sendo que quando ocorrer erosão óssea devemos pensar em doença maligna.
O estudo histopatológico é imprescindível e deve ser feito sempre, em todo o material retirado, porque o GC pode estar misturado a alterações compatíveis com sinusite crônica. (8). O aspecto morfológico do GC é típico, não podendo ser confundido com outras afecções (11), apresentando tecido de granulação com células gigantes tipo corpo estranho. Estas células gigantes circundam as fendas criadas pelos cristais de colesterol e estas fissuras têm a aparência de espaços com forma de agulha oca ou vazia (Figura 3). O tratamento usualmente consiste na remoção cirúrgica por completo da lesão e restabelecimento da drenagem do(s) seio(s) afetado(s) e deve ser o mais radical quanto possível para garantir a cura, sem recorrência (3). Entretanto, alguns autores acreditam que a drenagem com aeração permanente pode ser suficiente (6), podendo ser obtida apenas com a abordagem endoscópica minimamente invasiva (6). A recorrência é rara (11).
Dos nove casos relatados por MILTON; BICKERTON (1986)(1), oito pacientes foram submetidos a técnica de Caldwell-Luc e um a antrostomia intranasal. Os resultados cirúrgicos foram todos bons, alguns com seguimento de vários anos. A ressonância magnética pode ser útil, sobretudo para acompanhamento de casos operados (6,15). O nosso paciente está assintomático, após quatro anos da operação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Milton CM, Bickerton RC. A review of maxillary sinus cholesterol granuloma. Brit J Oral Maxillofac Surg., 1986, 24:293-299.
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9. Sarioglu S, Pabuccuoglu U, Arzu-Topal N. Cholesterol granuloma and aspergilloma of the maxillary sinus. Eur Arch Otorhinolaryngol, 2001, 258(2):74-76.
10. Kikuchi T, So E, Ishimaru K, Miyabe Y, Abe K, Kobayashi T. Endoscopic sinus surgery in cases of cholesterol granuloma of the maxillary sinus. Tohoku J Exp Med, 2002, 197(4):233-237.
11. Hellquist HB. Pathology of the nose and paranasal sinuses. London, Butterworths & Co, 1990.
12. Friedman I, Osborn DA. Pathology of granulomas of the nose and paranasal sinuses. Edinburgh, Churchill Livingstone, 1982, pp.23-35.
13. Wyler AR, Leech RW, Reynolds AF, Ojemann GA, Mead C. Cholesterol granuloma of the petrous apex. J Neurosurg., 1974, 41:765-768.
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15. Raveau V, Vignaux O, Marsot-Dupuch K. Cholesterol granuloma : review of the literature. Ann Radiol 1992;35:81-84.
1. Professor Adjunto de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
2. Professor Convidado de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
3. Ex-Residente do Serviço de Otorrinolaringologia da Policlínica de Botafogo.
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Artigo recebido em 24 de maio de 2005. Artigo aceito com modificações em 9 de outubro de 2005.