INTRODUÇÃO O equilíbrio corporal pode ser definido como a capacidade do ser humano em manter-se ereto e executar movimentos do corpo sem apresentar oscilações ou quedas. Esse complexo fenômeno sensório-motor é gerado pela integração de informações de três sistemas sensoriais (sistema visual, somatossensorial e vestibular) no sistema nervoso central. Alterações na manutenção do equilíbrio corporal podem ocasionar sintomas como vertigem, tontura e desequilíbrio (1-4).
A avaliação do equilíbrio corporal pode envolver testes que determinam valores diagnósticos ou que informam sobre a capacidade do indivíduo em manter a estabilidade postural. Um desses testes é a posturografia dinâmica computadorizada (PDC), que avalia a oscilação do corpo por meio do registro da pressão exercida pelos pés em uma plataforma de força, e nos permite analisar as reações posturais secundárias ao deslocamento do centro de massa corporal (5-7).
A PDC é um método de avaliação quantitativa e qualitativa que utiliza um sistema computadorizado que permite analisar a participação das informações sensoriais vestibulares, visuais e somatossensoriais no equilibro corporal, de maneira global e isolada, assim como a integração central desses sistemas (8).
Uma das opções de tratamento para alterações do equilíbrio corporal de origem vestibular é a reabilitação vestibular (RV) que tem como objetivo acelerar o processo de compensação central e recuperar o equilíbrio funcional (2, 3, 9, 10).
Apesar de a literatura demonstrar resultados satisfatórios com a utilização da RV (2, 5) a maioria dos estudos não se utiliza de métodos que quantifiquem a evolução da sintomatologia do paciente.
Devido à subjetividade na determinação dos valores até hoje utilizados, o objetivo deste trabalho foi utilizar a PDC como método de monitoração quantitativa de pacientes submetidos à RV.
MÉTODOA pesquisa foi baseada em estudo prospectivo de 39 pacientes, portadores de distúrbios vestibulares, submetidos à RV como forma de tratamento.
Este trabalho seguiu as normas éticas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), sendo aprovado pelo Comitê de Ética sob número 105/03.
Primeiramente, o protocolo de pesquisa foi apresentado ao participante, momento em que foram esclarecidos o objetivo do estudo e eventuais dúvidas sobre a pesquisa.
Todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido. Foram respeitados todos os princípios éticos que versam a resolução 196/96 (Ministério da Saúde, 1996) a respeito da ética em pesquisa com seres humanos e as orientações do Comitê de Ética em Pesquisa - HCFMUSP.
Os pacientes foram atendidos no Setor de Reabilitação Vestibular da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP nos anos de 2003 e 2004.
Todos os indivíduos estudados foram avaliados pelo Teste de Integração Sensorial (TIS) na PDC, realizada com o aparelho Equitest System® - Versão 4.0 produzido pela NeuroCom International® - USA. Durante a realização do TIS, os pacientes permaneceram em posição ortostática, sobre a plataforma de força, foram instruídos a manter os braços soltos ao lado do corpo, os pés levemente afastados e imóveis, olhando para frente. Sobre a plataforma de força os pacientes permaneceram com cinto de segurança próprio do aparelho para prevenir eventuais quedas. Todos os exames foram realizados pela mesma fonoaudióloga, e os comandos empregados durante o teste foram padronizados para todos os pacientes. Para cada tarefa foram realizadas três repetições com duração de 20 segundos cada. A imagem do exame acima descrito pode ser observada na Figura 1.
Para análise quantitativa dos dados obtidos foi utilizado o TIS, que é composto por seis condições sensoriais:
- Condição 1: Posição ortostática, plataforma fixa e olhos abertos.
- Condição 2: Posição ortostática, plataforma fixa e olhos fechados.
- Condição 3: Posição ortostática, plataforma fixa, olhos abertos e visão referenciada pelo movimento.
- Condição 4: Posição ortostática, plataforma instável e olhos abertos.
- Condição 5: Posição ortostática, plataforma instável e olhos fechados.
- Condição 6: Posição ortostática, plataforma e visão instáveis com olhos abertos.
As variáveis para análise foram:
- Valores obtidos na condição 5 do TIS: expressão da estabilidade corporal na condição 5, situação de instabilidade da plataforma, sem auxílio visual, com variação de zero (queda) a 100% (estabilidade máxima).
- Índice do equilíbrio (IE): média ponderada dos valores obtidos nas diversas condições do teste, com maior peso nas condições de três a seis.
Após a realização da primeira avaliação por meio do TIS da PDC, foi iniciado o programa de RV por meio de sessões de orientação e exercícios baseados no Protocolo Modificado de CAWTHORNE e COOKSEY (3), nos Exercícios de Adaptação Vestibular e, se necessário, Exercícios Complementares realizados em superfície irregular, aplicados de acordo com a queixa e a hipótese diagnóstica do paciente (Tabela 1).
O programa de RV teve duração de dois a cinco meses, com média de três meses. As sessões de acompanhamento ambulatorial foram realizadas na primeira semana após o início do tratamento, após 15 dias e, a partir do terceiro retorno, mensalmente. Os pacientes foram orientados a realizar os exercícios diariamente. No final do tratamento, foram submetidos à nova avaliação pelo TIS da PDC.
As variáveis analisadas foram os resultados obtidos na Condição 5 e no Índice do Equilíbrio do TIS utilizandose o teste t-Student. Foi adotado índice de significância (a) de 5%.
Além disso, foi realizada avaliação da sintomatologia dos pacientes após o programa de RV, por meio de uma escala análogo-visual para verificar a resposta clínica do paciente em relação ao tratamento. A escala consistiu em uma variação de porcentagem de 100% a 0%, sendo 100% equivalente à remissão do sintoma, de 90% a 50% melhora e, abaixo de 50%, sem melhora.
RESULTADOSA amostra estudada foi composta por 39 pacientes com faixa etária entre 37 e 77 anos (média de 58,2 e desvio padrão de 12,7), 31 (79,49%) indivíduos eram do sexo feminino e oito (20,51%) do sexo masculino.
No que diz respeito à localização da doença, 36 (92,31%) pacientes apresentaram origem periférica e três (7,69%) origem central.
Em relação à evolução dos pacientes pela escala análogo-visual, 15 (38,46%) apresentaram remissão dos sintomas, 21 (53,85%) melhora dos sintomas e, três (7,69%) não apresentaram melhora (Tabela 2), o que se assemelha com o resultado do TIS, pois a média dos valores na condição 5, variou de forma estatisticamente significante de 33,7 para 49,5 (p < 0,05) (p = 1,27226) e o Índice do Equilíbrio de 62,7 a 70,3 (p < 0,05), revelando melhora da estabilidade postural (Figuras 2 e 3).
Figura 1. Posturografia Dinâmica Computadorizada.
Figura 2. Valores da Condição 5 Pré e Pós RV.
Figura 3. Valores do Índice do Equilíbrio Pré e Pós RV.
Na Figura 1 e 2, pode-se verificar os valores da condição 5 e índice do equilíbrio pré e pós RV.
DISCUSSÃO Quanto à etiologia, pode-se observar maior número de causas periféricas de tontura, o que corrobora com informações presentes na literatura. Como as causas periféricas de tontura são mais freqüentes na rotina médica, existem mais estudos sobre o diagnóstico e tratamento deste tipo de etiologia (11).
Observamos que 92,31% dos pacientes apresentaram evolução satisfatória perante o tratamento da RV pela escala análogo-visual. O mesmo ocorreu em relação ao TIS, pois a média dos valores na Condição 5 e no Índice do Equilíbrio variou de 33,7 para 49,5 (p < 0,05) (p = 1,27226) e 62,7 a 70,3 (p < 0,05) respectivamente, revelando melhora da estabilidade postural. Sabemos que as respostas à escala análogo-visual são subjetivas deixando-nos muitas vezes incertos quanto à evolução dos sintomas do paciente. Já a posturografia, por ser um teste objetivo, nos fornece mais segurança quanto aos seus resultados. Curiosamente, ao comparar estes dois tipos de avaliação, notamos que as respostas ao tratamento foram semelhantes nas duas avaliações, o que revela que o resultado da posturografia condiz com a resposta à escala análogo-visual (2, 8-10, 12).
Além disso, o aumento dos valores obtidos na condição 5 do TIS, demonstra melhora da estabilidade corporal em situação de instabilidade da plataforma sem auxílio visual, o que representa melhora da função vestibular, pois esta é a melhor condição para avaliação do sistema vestibular, já que as informações visuais e proprioceptivas são reduzidas (7, 8).
Estudos relatam ainda que a PDC é um método sensível que pode informar de forma segura o estado de compensação final do equilíbrio, pois mesmo após lesão de um dos sistemas que auxiliam na manutenção do equilíbrio, o paciente pode se utilizar de outras fontes de informação e manter adequadamente sua postura (4, 8, 13-16). Ainda segundo a literatura, a PDC pode ser utilizada para avaliação, reabilitação e controle de pacientes com alteração do equilíbrio (7).
Sendo assim nossos resultados confirmam a utilidade da PDC como um método para monitoração quantitativa dos pacientes com distúrbios vestibulares antes e após a RV (6, 17). Esse aspecto é importante, nos fornece recursos para realizar uma avaliação objetiva, por meio de medidas quantitativas, da evolução do paciente após a realização da RV. Esses dados nos auxiliam quanto às orientações fornecidas para o paciente durante o tratamento e possibilita o fornecimento de informações concretas e fidedignas sobre sua evolução (18).
CONCLUSÃO Após a realização deste estudo, constatamos que a Posturografia Dinâmica Computadorizada é um exame adequado na quantificação da evolução da função vestibular durante o tratamento pela reabilitação vestibular.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Luxon LM. The medical management of vertigo. J Laryngol Otol. 1997, 111:1114-21.
2. Pedalini MEB, Bittar RSM. Reabilitação Vestibular: Uma proposta de trabalho. Pró-Fono. 1999, 11(1):140-4.
3. Pedalini MEB, Bittar RSM, Formigoni LG, Cruz OLM, Bento RF, Miniti A. Reabilitação vestibular como tratamento da tontura: Experiência com 116 casos. Arquivos Internacionais de Otorrinololaringologia. 1997, 3(2):87-90.
4. Barbosa MSM, Ganança FF, Caovilla HH, Ganança MM. Reabilitação labiríntica: o que é e como se faz. RBM-ORL. 1995, 2(1):24-34.
5. Asai M, Watanabe Y, Shimizu K. Effects of Vestibular Rehabilitation on Postural Control. Acta Otolaryngol. 1997, 528:116-20.
6. Black FO, Angel CR, Pesznecker SC, Gianna C. Outcome Analysis of Individualized Vestibular Rehabilitation Protocols. The American Journal of Otology, 2000, 21(4):543-51.
7. Black FO, Pesznecker SC. Vestibular adaptation and rehabilitation. Otology and neuro-otology. 2003, 11(5):355-60.
8. Black FO. What can posturography tell us about vestibular function? Annals of the New York Academy of Sciences. 2001, 942:446-64.
9. Norré ME, De Weerdt W. Vestibular habituation training: technique and first results. Acta Oto-Rhynol-Laryngol. Belg. 1979, 33(3):347-69.
10. Shepard NT, Smith-Wheelock M, Telian SA, Raj A. Vestibular and balance rehabilitation Therapy. Ann. Otol. Rhinol. Laryngol. 1993, 102:198-205.
11. Whitney SL, Wrisley DM, Brown KE, Furman JM. Physical therapy for migraine-related vestibulopathy and vestibular dysfunction with history of migraine. Laryngoscope. 2000, 110:1580-30.
12. Furman JM, Whitney SL. Central causes of dizziness. Phys Ther. 2000, 80:179-87.
13. Keim RJ, Cook M, Martini D. Balance Rehabilitation Therapy. Laryngoscope. 1992, 102:1302-7.
14. Cohen HS, Kimball KT, Stewart MG. Benign paroxysmal positional vertigo and comorbid conditions. ORL J Otorhinolaryngol Relat Spec. 2004, 66(1):11-5.
15. Konrad HR, Tomlinson D, Stockwell CW, Norré M, Horak FB, Shepard NT, Herdman SJ. Rehabilitation Therapy for patients with disequilibrium and balance disorders. Otolaryngol Head and Neck Surg. 1992, 107(1):105-8.
16. Mruzek M, Barin K, Nichols DS, Burnett CN, Welling B. Effects of Vestibular Rehabilitation and Social Reinforcement on Recovery Following Ablative Vestibular Surgery. Laryngoscope. 1995, 105:686-90.
17. Medeiros IRT, Bittar RSM, Pedalini MEB, Formigoni LG, Bento RF. Vestibular rehabilitation in children. Otol Neurotol. 2005, 26(4):699-703.
18. Cass SP, Borello-France D, Furman JM. Functional outcome of vestibular rehabilitation in patients with abnormal sensory-organization testing. Am J Otol. 1996, 17(4):581-94.
1. Especialista em Audiologia pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Fonoaudióloga do Setor de Audiologia e Reabilitação Vestibular da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
2. Doutora em Ciências Médicas pela Fisiopatologia Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Fonoaudióloga Pesquisadora Voluntária do Setor de Reabilitação Vestibular do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
3. Doutora em Medicina pela Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Médica Otorrinolaringologista da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
4. Doutor em Medicina pela Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.Médico Otorrinolaringologista Responsável pelo Setor de Otoneurologia da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Instituição: Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo/SP - Brasil.
Endereço para correspondência:
Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255
São Paulo / SP - CEP: 05403-000
Telefone / Fax: (11) 3069-6288 / 3069-6539.
Artigo recebido em 30 de junho de 2008.
Artigo aceito em 4 de julho de 2008.