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Ano: 2001  Vol. 5   Num. 2  - Abr/Jun Print:
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Sinais e Sintomas Auditivos nas Alterações Biomecânicas da Articulação Têmporo-Mandibular.
Auditory Signs and Aural Symptoms in Biomechanical Temporomandibular Joint Dysfunction.
Author(s):
Judith Ximena Diago Gutiérrez*, Maria Valéria Schmidt Goffi Gomez**, José Parisi Jurado***, Ricardo Ferreira Bento**** , Lin Hui Ching***** , José Tadeu Tesseroli de Siqueira******.
Palavras-chave:
disfunção têmporo-mandibular, avaliação audiológica.
Resumo:

Introdução: Muitas hipóteses têm surgido para explicar a correlação entre sintomas auditivos e alterações têmporo-mandibulares desde os trabalhos de Costen, em 1936. Contudo, poucos dos estudos consultados estudaram a identificação dos sinais audiológicos que acompanham o quadro de disfunção têmporo-mandibular (DTM). Objetivo: O objetivo deste trabalho foi analisar a relação entre o sintoma referido pelo paciente com DTM de origem biomecânica e o comprometimento real do sistema auditivo. Material e método: Foram atendidos 44 pacientes, dos quais somente 10 foram estudados por terem acompanhamento pré e pós-tratamento odontológico, sendo avaliados por meio de audiometria tonal e vocal, timpanometria, reflexo estapediano e complacência estática, realizados após avaliação otorrinolaringológica e odontológica. Resultados: À análise dos dados pré-tratamento, observou-se alterações audiométricas em freqüências isoladas (60%), timpanometrias com curvas tipo A (40% bilaterais - 30% unilaterais), complacência estática normal (70%) e limiar de reflexo estapediano normal (50%). Após o tratamento odontológico, o único teste que apresentou alteração significativa foi a complacência estática (50%).

INTRODUÇÃO

O estudo dos sintomas das disfunções temporomandibulares (DTM) tem sido um tema de grande interesse para os profissionais da saúde, especialmente para Dentistas e Otorrinolaringologistas. Observou-se maior desenvolvimento desde 1918, quando cientistas preocupados com as dores apresentadas pelos pacientes, encontraram regressão deste sintoma com a normalização da oclusão1.

Costen1 descreveu alguns sinais e sintomas auditivos que caracterizam as DTM, enumerando dentre as mais comuns, a sensação de plenitude auricular, zumbido, otalgia e vertigem com nistagmo. Explicou que o deslocamento condilar posterior e distal produz pressão direta sobre o nervo aurículo temporal, sobre as estruturas do ouvido e especialmente sobre a tuba auditiva.

O conjunto das alterações musculares, articulares e auriculares foi chamado de \"Síndrome de Costen\", porém autores como Dubrul2 não concordam com suas afirmações.

Muitas hipóteses têm surgido para explicar a correlação entre sintomas auditivos e alterações têmporo-mandibulares. Pinto, em 1962, na tentativa de esclarecer as causas das alterações auriculares, descobriu um ligamento que comunica o côndilo e disco da articulação têmporo-mandibular (ATM) com a orelha média (martelo), lateral ao nervo corda do tímpano3.

Por outro lado, Okeson, em 1992, afirma que a dor de ouvido pode ser na realidade dor na própria ATM sentida em posição mais posterior4. Afirma que a proximidade entre as estruturas, a herança filogenética similar e a inervação podem confundir o paciente no momento de localizar a dor.

Tamaki (1981) considera que a causa da vertigem é a desarmonia oclusal, porque durante a mastigação os côndilos desenvolvem esforços anormais sobre as paredes da cavidade glenóide5. A compressão pode transmitir-se à orelha média, ocasionando transtornos nos ossículos, na tuba auditiva e no sistema neurovascular.

Outros autores como Molina6 acreditam que a dor pode ser produzida por hipercontração e hiperestiramento muscular e quase sempre é referida em uma região diferente e distante do local da origem.

Na literatura encontramos autores que referem a presença de sintomas auditivos em alta incidência. Bush7 descreve otalgia em 82% dos pacientes; Bromberg et. al8 observaram otalgia e/ou zumbido em 47,36%; Donegá et. al9 otalgia em 40,7%; Rizzatti-Barbosa et. al10 zumbido em 66% e hipoacusia em 57%.

Contudo, entre os estudos que apontam a presença de sintomas auditivos, apenas três destes estudaram a identificação dos sinais audiológicos que acompanham o quadro de DTM11,12,13.

Baldursson & Blackmer11 encontraram 34% de pacientes com disacusia neurossensorial em freqüências médias isoladas (1000 - 2000 Hz) com etiologia desconhecida dentre os 50 casos estudados. Observaram que nenhum caso do grupo controle apresentou essa forma de disacusia e os resultados dos timpanogramas e das complacências estáticas, no grupo em estudo, foram normais.

Toller & Juniper12 realizaram um estudo com 57 pacientes com DTM e outros 57 voluntários sem passado otológico. Os resultados audiológicos não revelaram significância estatística, porém a complacência estática foi maior no grupo controle do que nos pacientes com disfunção.

Giordani & Nobilo13 constataram a melhora da sensação de zumbido (80% - 100%) nos pacientes submetidos ao tratamento com a placa estabilizadora de Michigan. Além disso, concluiram que a disfunção não interfere no aparelho auditivo já que o limiar tonal pré e pós-tratamento não mostrou alteração significativa.

O objetivo deste trabalho foi analisar a relação entre o sintoma referido e o comprometimento real do sistema auditivo nos distúrbios temporomandibulares de origem biomecânica.

MATERIAL E MÉTODO

Este trabalho foi submetido e aprovado pela comissão de ética da diretoria clínica do Hospital das Clínicas e da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Para realizar o estudo, foram atendidos 44 pacientes provenientes da Divisão de Odontologia e/ou do Pronto Socorro de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da FMUSP, com hipótese diagnóstica de alteração na ATM e queixa otológica.

Após avaliação audiológica, foram encaminhados ao ambulatório de Otorrinolaringologia para descartar doenças otológicas e para o grupo de Dor Orofacial e Desordens Temporomandibulares da Divisão de Odontologia do HC para confirmar o diagnóstico de DTM e iniciar tratamento. Foram selecionados 14 pacientes que obedeceram aos seguintes critérios:

a) diagnóstico de DTM de origem biomecânica (este exclui anormalidades do desenvolvimento e infecções), pela Divisão de Odontologia do HC FMUSP.

b) Exame ORL sem doença otológica ativa.

c) Faixa etária entre 15 e 60 anos de idade.

d) Ambos os sexos.

e) Presença de queixa auditiva (zumbido, plenitude e/ou dor auricular, sensação de perda auditiva, vertigem).

Destes 14 pacientes, somente 10 retornaram para acompanhamento audiológico e tratamento odontológico.

Realizou-se avaliação audiológica antes e depois do tratamento odontológico, que constou de:

a) Aplicação de uma ficha clínica audiológica, questionando os sintomas auditivos do paciente (sensação de perda auditiva, otalgia, sensação de plenitude auricular, zumbido, vertigem).

b) Realização dos testes audiológicos: Audiometria Tonal, Audiometria Vocal, Timpanometria, Reflexo Estapediano e Complacência Estática.

Foram utilizados o audiômetro Madsen Midimate 622 e o Imitanciômetro Interacustis Az7.

Os critérios usados para determinar a normalidade dos resultados no pré-tratamento foram, segundo Stelmachowicz & Gorga16:

o Audiometria tonal: limiares tonais até 25 dB em todas as freqüências de 250 a 8000 Hz.

o Audiometria vocal: discriminação vocal acima de 88%.

o Timpanometria:

o Tipo A: pico máximo entre -100 e 0 dapa, com valores entre 0,5 e 1,0 ml.

o Tipo As: pico máximo entre -100 e 0 dapa com valores inferiores a 0,25 ml.

o Tipo C: pico máximo deslocado para pressões negativas abaixo de -100 dapa.

o Complacência Estática: entre 0,2 e 1,8 ml.

o Reflexo Estapediano: presente de 70 a 90 dB NA.

No pós-tratamento, estabeleceu-se alteração dos resultados quando a audiometria tonal apresentava uma mudança de 10 dB em três freqüências, 15 dB em duas freqüências, ou 20 dB em freqüência isolada, audiometria vocal com 12% de variação, timpanometria em relação ao tipo de curva, complacência estática mínima com 0,2 ml de diferença e o reflexo estapediano com variação de 10 dB em três freqüências, 15 dB em duas freqüências ou 20 dB em freqüência isolada.

O tratamento Odontológico foi dirigido à queixa principal (otalgia ou zumbido), sendo os pacientes submetidos a: placa de mordida, placa de reposição postural maxilo-mandibular, uso de antidepressivos tricíclicos ou infiltração anestésica.

RESULTADOS

Os resultados mostraram predominância do sexo feminino (80%) em relação ao masculino (20%) e uma faixa etária entre 14 e 59 anos (média de 37 anos).

Na ficha clínica inicial, 90% dos casos apontaram a presença de otalgia, 60% de perda auditiva, 50% de zumbido e plenitude auricular e 10% de vertigem.

Oitenta por cento dos pacientes apresentaram queixa de dois a quatro sintomas auditivos e 20% de um ou cinco sintomas.

Sessenta por cento dos pacientes tiveram queixa bilateral, 20% do lado direito e 20% do esquerdo.

Os resultados audiológicos no pré e pós-tratamento estão apresentados nas Tabelas 1 e 2.

Relacionando dois sintomas otológicos muito freqüentes (otalgia e zumbido) com os resultados audiológicos obtidos, observou-se que a otalgia foi mais referida por mulheres (70%) (Tabela 3). Em relação ao zumbido, houve também predomínio do sexo feminino (80%) (Tabela 4).

Os testes que apresentaram maior alteração audiológica relacionada ao lado da queixa otalgia, foram a audiometria mostrando perda auditiva em freqüências isoladas e a timpanometria com curva tipo As (Tabelas 5 e 6).

Encontrou-se também diminuição do limiar ou ausência do reflexo estapediano em freqüências isoladas de 500 e 4k Hz, em 20% dos casos; complacência estática diminuída em 30% dos indivíduos.

A timpanometria foi o teste com maior alteração nos pacientes que tinham zumbido (40%). O predomínio foi bilateral e caracterizado por curvas tipo As (Tabelas 7 e 8).

Na etapa de pós-tratamento odontológico, 80% dos pacientes afirmaram melhora total do zumbido e 44% da otalgia. O único paciente com vertigem teve recuperação total deste sintoma.

Nos resultados audiológicos dos 10 indivíduos, obteve-se os resultados conforme a Tabela 9. O teste que teve uma mudança representativa foi a complacência estática. Dos 9 pacientes com otalgia, 4 apresentaram variação da complacência estática (40%), e dos 5 com zumbido, 2 deles tiveram também mudança no resultado (20%) (Tabela 10). Deve-se ter em conta que um dos indivíduos com zumbido também apresentava otalgia.

É importante esclarecer que estes resultados permaneceram dentre os parâmetros de normalidade. Embora tenham sido observadas variações, todas mantiveram-se dentro da normalidade.





















DISCUSSÃO

Este estudo confirmou a prevalência do sexo feminino em pacientes com disfunção têmporo-mandibular, sendo que diversos autores já ressaltaram esse fato 7,12,13,14,10.

A maioria dos pacientes referiu de dois a quatro sintomas auditivos, sendo o mais comum a otalgia, a qual teve a mesma importância nos estudos realizados por Bush, Toller & Juniper, Donegá et. al e Felício et. al.7,12,9,15.

A terceira maior queixa foi zumbido, com uma porcentagem similar à apontada por Bromberg et. al e por Rizzatti-Barbosa8,10. Por outro lado, o sintoma menos frequente foi a vertigem, fato encontrado também por Rizzatti-Barbosa 10, ao contrário do que encontraram Donegá et. al 9. Em relação aos resultados audiológicos antes do tratamento odontológico, encontrou-se que a maioria dos pacientes com DTM apresentou perda auditiva isolada nas freqüências de 250 e 500 Hz. Baldursson & Blackmer 11, encontraram perda auditiva em freqüências isoladas em seu estudo, entretanto nas freqüências de 1000 e 2000 Hz. Os autores acharam resultados normais nos timpanogramas e nas complacências estáticas, dado que se confirmou no nosso trabalho.

Embora a pesquisa do reflexo estapediano não tenha sido alvo de estudos na área das disfunções da articulação têmporo-mandibular, nosso interesse se deu devido à intrínseca relação anatômica dos ligamentos à cadeia ossicular, assim como do tendão do músculo estapediano. Entretanto os resultados apresentaram-se eminentemente normais na maioria dos pacientes.

Após o tratamento odontológico observou-se melhora significativa do zumbido. Giordani & Nóbilo13 relatam melhora do zumbido em 80% - 100% de seus casos após o tratamento odontológico, sem entretanto haver correlação ou melhora na audiometria tonal, da mesma forma que em nosso estudo.

Apesar da presença de perdas isoladas nas freqüências graves em mais da metade dos casos acompanhados (60%), em nosso estudo, não houve variação significativa da mesma após o tratamento. Tal observação pode ser justificada pelo fato de que uma vez instalada a perda sensorioneural, não haveria recuperação da mesma.

Os resultados da audiometria vocal, timpanometria e reflexo estapediano no pós-tratamento também permaneceram sem variação na maioria dos casos. Provavelmente pelo fato de que antes do tratamento, praticamente não foram encontradas alterações nesses testes.

Não foi possível afirmar que a DTM não interfere no sistema auditivo simplesmente pelo fato de que não houve alteração no pós-tratamento, pois considerando-se que foram identificadas perdas na vigência da DTM, o fato de que não tenham sido recuperadas não exclui a interferência.

O dado mais importante foi a variação da complacência estática em metade dos pacientes. Toller e Juniper12 também encontraram diminuição da complacência nos indivíduos com DTM, entretanto não referem a variação pré e pós-tratamento odontológico.

Embora a literatura pesquisada não faça alusão quanto à variabilidade da medida da complacência estática tanto em indivíduos com e sem queixas auditivas ou de disfunção da ATM, considerou-se significativo do ponto de vista clínico, a variação desta medida obtida no pós-tratamento. Poderíamos supor que o tratamento odontológico pode favorecer a melhor mobilidade do sistema auditivo, liberando forças e contrações da musculatura e ligamentos do sistema tímpano-ossicular, presentes antes do tratamento.

CONCLUSÃO

Encontraram-se alterações auditivas relacionadas com o lado da queixa otológica. Frente à melhora dos sintomas auditivos na maioria dos pacientes, os resultados audiológicos permaneceram sem mudanças significativas após o tratamento odontológico.

Observou-se uma mínima variação nos resultados audiológicos (pré e pós-tratamento odontológico), porém considerou-se significativo do ponto de vista clínico a variabilidade da complacência estática.

Estima-se importante a realização de uma nova pesquisa que possa utilizar uma amostra maior de pacientes con Disfunção Têmporo-mandibular e assim estudar mais profundamente a modificação da complacência estática antes e depois do tratamento odontológico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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* Fonoaudióloga estagiária do setor de Audiologia da Divisão da Clínica Otorrinolaringológica do Hospital Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, especialista em Motricidade Oral pelo CEFAC.
** Fonoaudióloga do setor de Audiologia da Divisão da Clínica Otorrinolaringológica do Hospital Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Doutora em Ciências dos Distúrbios da Comunicação Humana, Universidade Federal de São Paulo.
*** Médico Assistente da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
**** Professor Associado da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
***** Odontologista Assistente da Divisão de Odontologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
****** Odontologista Doutor e Supervisor da equipe de dor facial da Divisão de Odontologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Trabalho realizado na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital Clínicas da Faculdade de Medicina na Universidade de São Paulo (FMUSP).
Endereço para contato: Judith Ximena Diago - Rua Domingos de Soto, 101 apto 107 - Vila Mariana - CEP: 04116-040 - São Paulo - SP - E-mail: judiago@hotmail.com
Artigo recebido em 15 de fevereiro de 2001. Artigo aceito em 13 de maio de 2001.
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