INTRODUÇÃO
Na adaptação de aparelhos de amplificação sonora individual (AASI) existem duas variáveis que podem beneficiar o deficiente auditivo: a eletroacústica e a psicoacústica. A eletroacústica preocupa-se com as características eletrônicas do AASI, enquanto a psicoacústica consiste na forma com que o paciente, subjetivamente, adapta-se aos estímulos fornecidos pelo AASI.
FLETCHER (1953)1 realizou vários estudos relacionando energia de fala, faixas de freqüências e inteligibilidade da fala. Referiu que abaixo de 500 Hz, a contribuição é de apenas 5%, embora 60% da energia esteja concentrada nesta faixa; já nas freqüências de 500 Hz a 1 KHz, tanto a energia quanto a inteligibilidade situam-se em torno de 35%; finalmente, acima de 1 KHz, encontra-se apenas 5% de energia acústica, mas que é responsável pelo impacto de 60% da inteligibilidade da informação.
SPEAKS (1967a)2, considerando a curva de passa-baixos para sentenças sintéticas, verificou a pequena importância da energia acima de 1 KHz. Os dados sugeriram considerável importância à energia de baixa freqüência de fala.
HAYES et al. (1983)3 quando compararam os resultados do teste SSI em campo livre, observaram que na condição MCR= 0dB, os pacientes começavam a ser diferenciados e, finalmente, na condição de MCR= -10dB, houve uma nítida diferença entre pacientes satisfeitos e insatisfeitos. Os grupos que referiram ter o uso do AASI \"muito útil\" ou \"satisfatório\" apresentaram escores na condição de MCR= -10dB, em média, 30% melhores do que aqueles que estavam menos satisfeitos.
CAETANO (1991)4 aplicou o teste SSI (adaptado por ALMEIDA; CAETANO, 1988)5 em indivíduos deficientes auditivos e observou que a condição de MCR= 0dB já mostra uma relação sistemática com a satisfação do paciente, o que nos permite utilizá-la na nossa clínica como um parâmetro indicativo de melhor AASI ou conjunto de AASI para a língua portuguesa.
LEENAN, SOEDE; (1992)6 mostraram a relação sinal-ruído (SNR) versus a inteligibilidade para ouvintes normais e deficientes auditivos. Os ouvintes normais alcançaram 50% de inteligibilidade em aproximadamente -7 dB de SNR e 100% de inteligibilidade a 0 dB de SNR. Os deficientes auditivos com disacusia neurossensorial, entretanto, alcançaram 50% de inteligibilidade a 0 dB de SNR e requereram + 10 dB de SNR para alcançar 100% de inteligibilidade.
KILLION (1997b)7, usando o teste de fala sob ruído (SIN), ajustou a relação sinal-ruído (SNR) até que os ouvintes entendessem a fala com 50% de acerto. Os resultados mostraram que à medida que a perda auditiva aumenta, a SNR requerida para alcançar 50% do desempenho aumenta também.
TASEL (1998)8 alertou que não importa o quão sofisticado seja o AASI digital, porque o seu desempenho dependerá das características da deficiência auditiva do paciente, caracterizada pela natureza e extensão da lesão do seu sistema auditivo.
VOLL (2000)9 mostrou um aumento na SNR de 3dB que poderia resultar em 40% de melhora na inteligibilidade.
CHRISTENSEN (2000)10 observou que os ouvintes normais podem identificar 90% das palavras nas sentenças com uma SNR de + 5dB. Os deficientes auditivos requerem uma SNR de + 15dB em média para alcançar o mesmo nível de desempenho no teste SIN. Com relação ao tipo de processamento de sinal utilizado (analógico ou digital), a perda de SNR permanece. Segundo o autor, nenhum circuito parece resolver o problema de \"escutar sob ruído\", mas ressaltou que AASI com microfones direcionais podem ser uma opção melhor para muitos pacientes.
Segundo ELBERLING et al. (1993)11 alguns algoritmos rendem uma melhora objetiva na SNR, mas raramente é acompanhado de uma melhora na inteligibilidade da fala e normalmente com uma qualidade de som artificial.
ZUREK (1993)12 referiu que promover inteligibilidade de fala sob ruído pelo aumento da SNR parece ser uma das tarefas do processador de sinal digital (DSP). O autor relatou que os deficientes auditivos podem requerer uma SNR de 10dB a 14dB maior do que ouvintes normais requerem para a percepção da fala sob ruído.
KILLION (1997a)13 referiu que o uso de microfones direcionais e a introdução do DSP nos AASI permitem técnicas mais sofisticadas que podem ser implementadas, porém é importante salientar que não há nada de inerente ao DSP que melhore o processamento do sinal por si só.
O presente trabalho tem o objetivo de comparar, do ponto de vista psicoacústico, o desempenho dos indivíduos com AASI analógicos e digitais, utilizando o teste de SSI (Identificação de Sentenças Sintéticas) em campo sob mensagem competitiva.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram estudados 42 indivíduos com disacusia neurossensorial de maneira comparativa, simples cega e randomizada.
O protocolo do estudo bem como o Termo de Consentimento Pós-Informação foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Critérios de inclusão: Homens e mulheres com mais de 18 anos, portadores de disacusia neurossensorial leve a severa uni ou bilateral com indicação médica de uso de AASI; pacientes sem uso prévio, mas com predisposição ao uso de AASI, motivação e satisfação em participar da pesquisa; pacientes que compreenderam os procedimentos e concordaram em participar do estudo, dando consentimento por escrito.
Critérios de exclusão: Homens e mulheres com idade inferior a 18 anos; história de otorréia; realização prévia do teste SSI e uso anterior de AASI; história de qualquer doença que, na opinião do investigador, pudesse confundir os resultados do estudo ou impor risco adicional à adaptação de AASI.
Avaliação audiológica básica: Para caracterizar a perda auditiva quanto à intensidade e localização, foram feitos os seguintes testes auditivos: audiometria tonal liminar com fones; audiometria tonal em campo livre sem AASI; índice de reconhecimento de fala máximo (IRFM) com fones; IRFM em campo livre sem AASI; Limiar de Reconhecimento de Fala (LRF) com fones; LRF em campo livre sem AASI; Limiar de Detecção de Voz (LDV) com fones; LDV em campo livre sem AASI; imitanciometria.
Instruiu-se o indivíduo para as consultas de retorno, a fim de repetir os testes audiológicos. Numa segunda visita, foi realizada a randomização que possibilitou a alocação do paciente ao grupo do aparelho 1 ou ao grupo do aparelho 2 com a mesma chance.
Num primeiro momento, todos os pacientes foram submetidos ao teste SSI sem AASI em campo livre, para as condições MCR +10dB, 0dB, -10dB e -20dB, respeitando-se esta ordem. Posteriormente, o mesmo teste foi realizado com AASI, também em campo livre. Cada paciente testado com AASI foi submetido ao teste com aparelho analógico na primeira testagem e com digital na segunda testagem ou vice-versa.
Os modelos dos dois tipos de AASI tiveram aparência idêntica. Foram utilizados 42 AASI analógicos, que embora de procedências e características distintas, foram considerados semelhantes para esse estudo, por apresentarem em comum a mesma tecnologia. Quanto aos modelos, foram utilizados 21 aparelhos microcanais, 14 intracanais, 2 intra-auriculares e 5 meia-conchas, com 23 amplificadores classe D, 3 classe A e 1 classe B, 10 K-AMP e 5 MPO-PC.
Foram utilizados 42 AASI digitais, dos quais 21 aparelhos microcanais, 14 intracanais, 2 intrauriculares e 5 meia-conchas, sendo todos estes manipulados por programador manual modelo LP2.
A orelha que recebeu a adaptação dos AASI foi sempre aquela prescrita pelo médico otorrinolaringologista. A duração do estudo foi de aproximadamente dois meses para cada paciente.
Técnica do teste SSI: As sentenças sintéticas foram apresentadas inicialmente em campo na intensidade de 65 ou 70dBNA à frente do paciente, por meio de uma caixa acústica, com mensagem competitiva na intensidade de 75 ou 80dBNA atrás, por intermédio de uma outra caixa acústica.
Os pacientes permaneceram sentados dentro da cabina acústica de frente a um painel, contendo uma fila de 10 botões de apertar, dispostos verticalmente, e duas luzes acima que transmitiram os sinais escritos \"escute\" e \"descanse\", respectivamente. Este painel continha uma folha de papel medindo 20 cm por 17 cm, onde estava impressa uma lista de 10 sentenças sintéticas (sentenças que apresentavam uma relação de terceira ordem de aproximação), correspondendo a cada botão uma sentença.
As sentenças utilizadas foram adaptadas à língua portuguesa por ALMEIDA, CAETANO (1988)5 e são as seguintes.
QUE IGNORA O FIM PRINCIPAL É GANHAR
A PORTA LARGA PARA SER MAIS RÁPIDO
GOSTA MUITO CRER TE DA MUITO PARA
QUARTO GOLPE DE ESTADO E O CAMPO
SEMPRE E CORRE MUITO MAIS BONITO QUE
CONFIANÇA EM MINHA ALMA CAI DENTRO DE
AÇÃO HUMILDE É BEM CLARO O CÉU
SOBRE MINHA CABEÇA ESTÁ DE DEUS PAI
GRANDE GENERAL CHEGA JÁ E NÃO CREIAS
ASSISTA A AULA DE PAPEL BRANCO NA
A mensagem competitiva que foi utilizada na pesquisa constitui-se de um discurso contínuo na forma de um trecho de um livro de história do Brasil14.
Primeiramente, a intensidade das sentenças foi de 65dB ou 70dB NA, conforme o nível de conforto auditivo do paciente, e não variou durante o procedimento do teste. A competição de fala foi de 75dB ou 80dB NA.
Cada combinação de níveis de intensidade foi definida como \"relação mensagem-competição\" (MCR). O procedimento atual do teste começou na condição de +10 dB.
A duração da testagem teve previsão de 20 minutos.
Avaliação do Desempenho do Indivíduo com AASI por meio das Sentenças Sintéticas: Todos os pacientes foram submetidos aos seguintes testes: aplicação do teste SSI na presença de mensagem competitiva sem AASI em campo livre; aplicação do teste SSI na presença de mensagem competitiva com AASI analógico ou digital em campo livre; aplicação do teste SSI na presença de mensagem competitiva com AASI diferente da primeira testagem.
Análise estatística: A comparação primária de interesse foi o desempenho de indivíduos no teste SSI com AASI digital e analógico. A hipótese está centrada na equivalência do desempenho do AASI analógico versus desempenho do AASI digital.
Os dados da audiometria e do teste SSI foram representados por meio de medidas descritivas: média, desvio-padrão, mediana e valores mínimo e máximo.
Em cada condição de MCR (-20, -10, 0 e +10), a comparação entre os aparelhos analógico e digital foi realizada a partir do teste não paramétrico de Wilcoxon. Além disto, foi calculado o intervalo de 95% de confiança da diferença entre os valores médios do SSI com AASI digital e analógico.
Neste trabalho, foi adotado o nível de significância de 5% e o sistema estatístico SPSS® foi utilizado para os cálculos estatísticos.
RESULTADOS
Sexo: Dos 42 pacientes estudados, 21 eram do sexo feminino (50%) e 21 do sexo masculino (50%).
Idade: Observou-se uma média de 54,8 anos e desvio padrão de 12,4 anos.
Orelhas selecionadas: Foi selecionada apenas uma orelha para estudo em cada paciente, sendo 20 orelhas direitas e 22 orelhas esquerdas. O número foi semelhante para excluir a possibilidade de erro devido à lateralidade.
Limiares auditivos tonais: Não houve diferença estatisticamente significante entre as orelhas selecionadas e as contralaterais nas três freqüências (p=0,874, p=0,633 e p=0,809). Em média, os valores obtidos na situação de cabina são maiores que os com fone.
Na Tabela 1, para o subgrupo de sete pacientes com perda auditiva leve, houve diferença estatisticamente significante entre a condição com AASI digital e as demais (p = 0,011, p = 0,038, p = 0,024) que, por sua vez, foram semelhantes entre si. No subgrupo de 24 pacientes com perda auditiva moderada, houve diferença significante (p = 0,002, p < 0,001, p < 0,001) entre os resultados das três condições (comparadas duas a duas).
As condições com AASI analógico e com AASI digital não apresentaram diferença significante dentro do subgrupo de nove pacientes com perda moderadamente severa (p = 0,157), mas foram significantemente diferentes da condição sem AASI (p = 0,017, p = 0,017).
Na Tabela 2, para o subgrupo de 16 pacientes com IRFM < 60%, houve diferença estatisticamente significante entre AASI analógico e digital (p = 0,021). O mesmo ocorreu para o subgrupo de indivíduos com IRFM > 70% (p = 0,008). Para os indivíduos com IRFM intermediária, entre 60 e 70%, esta diferença não atingiu significância estatística (p = 0,096), embora em média o AASI digital também tenha apresentado valores maiores que o analógico.
Influência dos limiares tonais sobre o desempenho dos AASI analógico e digital: Embora estatisticamente não significante, os limiares auditivos tonais em campo livre foram piores do que os obtidos com fone em cabina, sendo a freqüência de 4KHz mais comprometida que as demais.
Indivíduos com perda auditiva leve apresentaram melhor desempenho com AASI digital do que com AASI analógico e sem AASI. (Tabela 1 p1). Nestes indivíduos, não houve diferença entre o desempenho no teste SSI com AASI analógico ou sem AASI. Por outro lado, o AASI digital apresentou desempenho significantemente melhor que as duas condições anteriores, o que favorece a indicação de AASI digital para indivíduos com limiares auditivos de 25 a 40dB (Tabela 1 p4).
Independentemente do tipo de AASI, foi observado melhor desempenho dos indivíduos com perda auditiva leve do que os com perda auditiva moderada (Tabela 1 p1).
Os indivíduos com perda auditiva moderada apresentaram melhor desempenho com AASI digital quando comparado com AASI analógico e sem AASI (Tabela 1 p1).
Para as perdas auditivas moderadamente severas, o desempenho no teste SSI foi semelhante com AASI analógico e digital, porém significantemente melhor quando comparado com a situação sem AASI, o que favorece a indicação de ambos os tipos de AASI para indivíduos com limiares auditivos de 55 a 70dB (Tabela 1 p1).
Nas perdas moderadamente severas não houve diferença estatisticamente significante entre os dois tipos de AASI, embora haja uma tendência do AASI digital ser melhor do que o analógico. Entretanto, pelo pequeno número de casos com este grau de perda (n=9), sugerimos estudos posteriores com maior população de indivíduos para confirmar esta tendência (Tabela 1 p1).
Importância do Índice de Reconhecimento de Fala Máximo (IRFM) na seleção dos AASI: No presente estudo, foi observado que indivíduos com IRFM >70% apresentam melhor desempenho no teste SSI do que os indivíduos com IRFM de 60 a 70% e IRFM<60%, sugerindo haver relação entre os escores de IRFM e os de SSI para indivíduos com IRFM>70%, o que não foi observado nos indivíduos com IRFM de 60 a 70% e IRFM<60%.
Sentenças sintéticas: Procuramos utilizar o teste SSI com mensagem competitiva para estimar o melhor AASI. Embora tenhamos empregado competição de fala e não ruído, esses estímulos se equivalem quando comparamos escores de inteligibilidade de fala sob qualquer competição, seja fala ou ruído.
Desempenho dos AASI na presença de recrutamento: Quando os indivíduos se utilizaram de AASI analógico, o desempenho dos indivíduos não-recrutantes foi significantemente melhor do que os recrutantes, não ocorrendo o mesmo quando se utilizaram de AASI digital.
Não houve diferença estatisticamente significante entre os indivíduos recrutantes e não-recrutantes sem AASI (p = 0,103) e com AASI digital (p = 0,198), mas houve para o AASI analógico (p = 0,038). Em média, o desempenho no teste SSI dos indivíduos não-recrutantes foi significantemente maior que o dos indivíduos recrutantes com AASI analógico.
Comparação entre os AASI analógico e digital quanto ao desempenho no teste SSI: Em todas as condições de MCR (-20, -10, 0 e +10) foram encontradas diferenças significantes (p <0,001 e p < 0,01) entre as respostas dos AASI digitais e analógicos, quanto aos valores obtidos no teste SSI (Tabela 3).
Os dois tipos de AASI produziram melhores respostas que a condição sem AASI, e as médias do AASI digital são maiores que as do analógico.
DISCUSSÃO
Orelhas selecionadas: Nesta pesquisa, optou-se por selecionar apenas uma orelha em cada paciente (pesquisa monoaural) porque a maioria não apresentou disposição para uso de dois AASI e porque as fábricas não possuíam disponibilidade de AASI suficiente para viabilizar a pesquisa.
Influência dos limiares tonais sobre o desempenho dos AASI analógico e digital: A freqüência de 4KHz está mais comprometida que as demais. Relacionando esse achado com a informação de FLETCHER (1953)1, pode ser entendido que os voluntários deste trabalho, como uma amostra da população em geral, apresentam diminuição da inteligibilidade da fala provocada pela perda auditiva.
Esses achados são concordantes com os de MUSIEK et al. (1993)15 quando salientaram que a maioria das disacusias neurossensoriais apresenta um \"déficit\" muito menor nas freqüências baixas (importante para a audibilidade) em relação às freqüências altas, ponto crítico para a inteligibilidade.
Na literatura, foi relatado que a satisfação dos indivíduos em relação a diferentes tipos de AASI não depende do limiar auditivo que possuem (JERGER et al., 1968)16. Em contrapartida, TASEL (1998)8 lembrou que não importa quão sofisticado possa ser um AASI digital porque seu desempenho dependerá das características da deficiência auditiva do indivíduo, acreditando que quanto menos severa for a deficiência auditiva, maior será a expectativa para corrigi-la pelo uso de AASI.
Para as perdas moderadamente severas, o desempenho no teste SSI foi semelhante com AASI analógico e digital, porém significantemente melhor quando comparado com a situação sem AASI, o que favorece a indicação de ambos os tipos de AASI para indivíduos com limiares auditivos de 55 a 70dB (Tabela 1 p1). Não houve diferença estatisticamente significante entre os dois tipos de AASI, embora haja uma tendência do AASI digital ser melhor do que AASI analógico.
Importância do Índice de Reconhecimento de Fala Máximo (IRFM) na seleção dos AASI: O AASI digital foi melhor que o AASI analógico, o que favorece sua indicação para os indivíduos com IRFM>70%. (Tabela 2 p1)
Para os indivíduos com IRFM de 60 a 70%, o desempenho com AASI foi significantemente melhor do que sem AASI, favorecendo sua indicação, independente se analógico ou digital (Tabela 2).
Para os indivíduos com IRFM <60%, houve diferença significante entre o uso do AASI digital e o analógico, favorecendo a indicação do uso do AASI digital para os indivíduos com IRFM <60%.
No presente estudo, foi observado que indivíduos com IRFM>70% apresentam melhor desempenho no teste SSI do que os indivíduos com IRFM de 60 a 70% e IRFM<60%, sugerindo haver relação entre os escores de IRFM e os de SSI para indivíduos com IRFM>70%, o que não foi observado nos indivíduos com IRFM de 60 a 70% e IRFM<60%. Este fato sugere que os indivíduos portadores de IRFM<70% apresentam maior dificuldade de comunicação que os demais e que essa dificuldade diminui com o uso de AASI analógico e mais ainda com os digitais.
Sentenças sintéticas: O uso de sentenças sintéticas como objeto de testes auditivos permite maior semelhança aos estímulos do dia-a-dia, quando é mais fácil identificar sentenças do que palavras isoladas, e não exige um reconhecimento exato de todos os elementos da frase. Observa-se que as curvas de identificação das sentenças sintéticas em ouvintes normais são próximas às curvas obtidas pelo LRF (limiar de reconhecimento de fala) o que colaborou para optarmos pela escolha do teste para comparar desempenho obtido com o uso de AASI.
HAYES et al. (1983)3 aplicaram o teste SSI com mensagem competitiva e observaram que na condição de MCR= -10dB houve uma diferença de 30% entre os indivíduos satisfeitos com o seu AASI e os não-satisfeitos, o que favoreceu a utilização do teste para diferenciar AASI. Da mesma forma, CAETANO (1991)4 quando aplicou o teste SSI com mensagem competitiva observou já uma diferença entre os grupos de satisfeitos e não-satisfeitos na condição de MCR= 0dB, porém na condição de MCR= -10dB, esta diferença se acentuava ainda mais.
LEENAN; SOEDE (1992)6 mostram a relação sinal-ruído (SNR) versus a inteligibilidade para ouvintes normais, que alcançam 50% de inteligibilidade em aproximadamente - 7dB de SNR e 100% a 0dB de SNR. Consideramos a condição de MCR= -10dB como a mais apropriada para avaliar o desempenho do AASI porque mostra uma relação sistemática com a satisfação do paciente, o que nos permite utilizá-la na clínica como um parâmetro indicativo do melhor AASI ou conjunto de AASI.
Da mesma forma, KILLION (1997b)7 demonstrou pela aplicação do teste SIN (Fala sob ruído) a SNR necessária para o reconhecimento de 50% das palavras relativas à audição normal. Seus achados são concordantes com os de LEENAN; SOEDE (1992)6, referindo uma SNR de 0dB para ouvintes normais e -7dB para indivíduos com perda auditiva de aproximadamente 60dB.
VOLL (2000)9 refere que um aumento de 3dB na SNR pode melhorar a inteligibilidade até em 40% dos indivíduos deficientes auditivos, o que vem ao encontro da escolha de MCR= -10 neste presente estudo para se testar AASI, condição considerada difícil. Entretanto, se o deficiente auditivo responder bem ao teste, em geral esperamos aumento na inteligibilidade de fala de forma significativa.
Adicionando a isto, CHRISTENSEN (2000)10 refere que os resultados do teste SIN (Fala sob ruído) podem ser usados de diversas formas. Primeiramente definida pelo autor como a medida da \"perda da SNR\", pode determinar quem são candidatos ao uso de microfones direcionais e estimar o benefício do uso. Lembrou ainda que os AASI com microfones direcionais podem aumentar a SNR de 4 a 5dB. Então, deficientes auditivos com perda de SNR de 5dB ou menos podem freqüentemente ter um desempenho semelhante a ouvintes normais sob condições de ruído usando AASI com microfones direcionais.
SPEAKS (1967a)2 também concordou em utilizar as sentenças sintéticas, salientando que foi evidente a pouca importância de energia acima de 1 KHz, quando considerou a curva de passa-baixos, o que diferiu substancialmente das palavras monossilábicas, onde o espectro importante era acima de 1 KHz. Esse fato foi observado no presente estudo quando foram relacionados os escores da IRFM com o desempenho do teste SSI. (Tabela 2)
À semelhança, JERGER et al. (1968)16 verificaram que o teste SSI com mensagem competitiva foi o único que conseguiu distinguir com significância a eficiência do AASI, possibilitando separar os indivíduos satisfeitos com o uso de seu AASI daqueles não-satisfeitos.
Os argumentos acima mencionados justificam a escolha do teste de SSI com mensagem competitiva para o método do presente trabalho com a finalidade de avaliar a eficiência dos AASI.
Desempenho dos AASI na presença de recrutamento:
Os dados sugerem que para os indivíduos portadores de recrutamento deva ser indicado o uso de AASI digitais, porque apresentam melhor desempenho que os analógicos.
Tecnologia analógica e digital: Na literatura observa-se a preocupação de se avaliar o aproveitamento do AASI por meio de testes mais sofisticados, em campo. ELBERLING et al. (1993)11 e CHRISTENSEN (2000)10 foram céticos em relação à possibilidade da melhora da percepção da fala em ambiente social com ajuda de AASI, outros como LEENAN; SOEDE(1992)6, MUSIEK et al. (1993)15, KILLION (1997a), KILLION (1997b) e TASELL (1998) vêm notando que com os progressos eletrônicos dos AASI (preocupação em amplificar, selecionar a amplificação e minimizar a influência do ruído de fundo) o número de deficientes auditivos que alcançam comunicação satisfatória está aumentando. Entre esses avanços recentes, o aperfeiçoamento dos microfones direcionais e a tecnologia digital foram motivo de otimismo entre os pesquisadores clínicos que, referindo-se aos seus achados, fizeram comentários como: \"as estratégias para melhorar o reconhecimento de fala sob ruído consistem em melhorar a SNR na membrana timpânica, fazer uso de microfones direcionais e realizar a adaptação de AASI binaurais\" (ZUREK, 1993) e \"defendeu o uso de microfones direcionais na concha do AASI intracanal, possibilitando à aurícula o efeito da curva sombra que naturalmente aumenta as freqüências altas\" (VOLL, 2000).
No presente trabalho, o uso de qualquer tipo de AASI (analógico e digital) produziu desempenho significantemente melhor quando comparado com aquele sem AASI. Observa-se, então, que de alguma forma, o AASI (analógico ou digital) melhorou a inteligibilidade da fala sob competição, tendo o AASI digital apresentado um resultado melhor do que o analógico em todas as condições de MCR.
CONCLUSÕES
1. A inteligibilidade da fala sob competição foi melhor com AASI, independentemente se analógico ou digital, quando comparada com a condição sem AASI.
2. O desempenho dos indivíduos com AASI, independentemente se analógico ou digital, foi melhor nas perdas auditivas leves em relação aos indivíduos com perdas auditivas moderadas.
3. Em relação ao Índice de Reconhecimento de Fala Máximo (IRFM), quando > 70% e também quando < 60%, o AASI digital ofereceu melhor resultado do que o AASI analógico, porém com IRFM de 60 a 70% não houve diferença significante entre as duas tecnologias.
4. Os indivíduos com perdas auditivas leves apresentaram melhor desempenho com AASI digital do que com o analógico.
5. A tecnologia digital permitiu melhor comunicação do que a analógica nos pacientes portadores de recrutamento.
6. Quando avaliados pelo teste SSI, os AASI digitais ofereceram melhor resultado do que o analógico em todas as condições de relação mensagem-competição (MCR).
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Clemente Isnard Ribeiro de Almeida, Professor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí, meu Mestre, a quem devo a sugestão deste trabalho, e a possibilidade dos meios para a sua realização, pela sua sabedoria, pelo carinho e apoio que sempre me dedicou.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. FLETCHER, H. - Speech and hearing in communication. In: Princeton, N.J.: New York, D. Van Nostrand, 1953, 100-35p.
2. SPEAKS, C. - Intelligibility of filtered synthetic. J. Speech Hear. Disorder. 10, p.281-8, 1967a.
3. HAYES, D.; JERGER, J.; TAFF, J.; BARBER, B. - Relation between aided synthetic sentence identification score and hearing aid user satisfaction. Ear. Hear. 4, p. 158-61, 1983.
4. CAETANO, M.H.U. - Utilização do teste de identificação de sentenças sintéticas (SSI) com mensagem competitiva em avaliação de próteses acústicas. Dissertação (Mestrado) Faculdade de Fonoaudiologia, UNIFESP, São Paulo, 1991.
5. ALMEIDA, C.I.R.; CAETANO, M.H.U. - Logoaudiometria utilizando sentenças sintéticas. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 54, p. 68-72,1988.
6. LEENAN, J.; SOEDE, W. - Verbesserung des Sprachverstehens durch richtungsempfindliches Horen. [Improvement in speech understanding through directional sensitive hearing], Horakustik. 7, p. 45-67, 1992
7, KILLION M.C. - SNR loss: I can hear what people say, but I can\'t understand them. Hear. Rev. 31, p.4-14, 1997b.
8. TASELL D.J.V. - New DSP instrument designed to maximize binaural benefits. Hear. J. 51, p. 1-4, 1998.
9. VOLL, L. M. - Application of technology to improve signal-to-noise ratio. Semin. Hear. 21, p.157-67, 2000.
10. CHRISTENSEN, L. A. - Signal-to-noise ratio loss and directional-microphone hearing aids. Semin. Hear. 21, p. 179-220, 2000.
11. ELBERLING, C.; LUDVIGSEN, C.; KEIDSER G. - The design and testing of a noise reduction algorithm based on spectral subtraction. Scand. Audiol. 22, p. 39-49, 1993.
12. ZUREK P.M. - Binaural advantages and directional effects in speech intelligibility. In: STUDEBAKER G.A.; HOCKBERG I., ed. Acoustical Factors Affecting Hearing Sif Performance. 2. ed. Boston, Allyn & Bacon , p. 132-48, 1993.
13. KILLION, M.C. - Hearing Aids: past, present, future: moving toward normal conversation in noise. Br. J. Audiol. v. 53, ,p. 141-8, 1997a.
14. LIMA, J. - Anchieta e a Fundação de São Paulo. In: Ensaios Paulistas. São Paulo, Ed. Anhembi, p. 90-5, 1958.
15. MUSIEK, F.E.; BARAN, J.; PINHEIRO, M. - Neuroaudiology: cases studies, San Diego, Singular Press, 1993, p. 150-80.
16. JERGER, J.; SPEAKS, C.C.; TRAMMELL, J.L. - A new approach to speech audiometry. J. Speech Hear. Disorder. 33, p. 318-28,1968.
* Fonoaudióloga Doutora pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Tese apresentada à FMUSP para obtenção do título de Doutor em Ciências em 27/03/2001.
Endereço para correspondência: Rua Prof. Picarolo 103 Ap. 11-A - CEP 01332-020 - São Paulo - SP - Tel/fax: (11)287-0956 - Email: mhelena48@hotmail.com
Artigo recebido em 2 de maio de 2001. Artigo aceito em 9 de junho de 2001.