Introdução
A "microscopia ótica" foi utilizada ao nível da faringe inicialmente em 1994, com os trabalhos de Andréa e Dias (Universidade de Lisboa), especificamente para realização de tonsilectomia. Inspirados nos benefícios trazidos pela microscopia otológica e principalmente pela microscopia laríngea, estes dois autores introduziram-na como opção terapêutica na faringe1,2.
A cirurgia microscópica apresentou a grande vantagem de proporcionar magnitude de imagem, tornando a técnica cirúrgica mais segura, uma vez que as estruturas anatômicas faríngeas podem ser identificadas com bastante clareza. Em particular na microtonsilectomia, essa técnica orienta melhor a delimitação da loja tonsilar e identifica pontos de reparo anatômicos como nervos (ramos) e vasos (colaterais), diminuindo a chance de traumas teciduais desnecessários que podem acontecer com técnicas que não permitem a mesma definição anatômica.
Segundo Andréa; Dias, em 1994, a microcirurgia de tonsilas praticamente proporcionou ausência de sangramento tanto no trans como no pós-operatório, devido à preservação das estruturas e hemostasia vascular eficaz. Além disso, promoveu diminuição importante do quadro doloroso característico das tonsilectomias pela maior identificação e preservação de estruturas nervosas periféricas, principalmente de ramos do nervo glossofaríngeo1,2. É importante salientar que esta técnica original utiliza, de rotina, os bisturis mono e bipolar intercaladamente.
O bisturi ultracision (BU), também conhecido por bisturi harmônico, já é utilizado em outras áreas cirúrgicas da medicina com sucesso. Caracteriza-se por apresentar energia mecânica vibratória com freqüência em torno de 55,5 kHz. Este bisturi atua promovendo de maneira ordenada, a depender da necessidade, o corte e a coagulação, que podem atuar simultaneamente. Ambos os processos são adaptados através da modificação da potência (kHz), tipo de lâmina de titânio (tesouras coaguladoras e ganchos), tração do tecido e pressão na lâmina da ponteira. A coagulação tem a característica de ser coativa, com oclusão mecânica dos vasos.
Basicamente o sistema é composto por gerador compacto, uma ponteira, lâminas, chave inglesa e carro transportador próprio. Não há necessidade de conexão elétrica ou de refrigeração especiais. A unidade é ativada através de pedal acoplado. Este aparelho produz leve fumaça tipo névoa, que é debelada com a utilização de aspiração loco-regional constante.
É importante registrar também que o BU apresenta um maior período de latência com relação ao início dos seus efeitos, o que deve ser considerado pelo cirurgião durante o ato. Principalmente quando comparado com o laser e bisturi elétrico cujos efeitos são praticamente imediatos.
Portanto, apresenta vantagens como: promoção de corte e de coagulação simultâneos, não utilização de corrente elétrica (sem riscos de queimaduras), mínima carbonização tecidual, além de ser de fácil instalação e manipulação.
O objetivo do estudo é relatar as vantagens do bisturi ultracision nas microtonsilectomias.
Material e Método
Temos até a momento, uma casuística de 26 pacientes com idade variando de 3 a 48 anos, sendo 16 do sexo masculino e 10 do femininos.
Todos os pacientes foram submetidos a tonsilectomia sob anestesia mista (geral e local), através de intubação oral e permaneceram internados por período máximo de 24 hs. Foram utilizados os princípios básicos metodológicos da microscopia de tonsilas1,2.
As Figuras 1, 2 e 3 mostram a evolução da cirurgia.
Figura 1. Incisão inicial: demonstração da cirurgia ao nível de pólo inferiorda tonsila palatina.
Figura 2. Dissecção: descolamento dos tecidos com ponteira em forma de gancho.
Figura 3. Exérese da tonsila palatina: situação final da loja amigdaliana totalmente ex-sangüe.
A terapêutica clínica consiste de antibiótico por um período de 7 dias, anti-inflamatório não hormonal e analgésico, conforme necessidade de cada caso.
Foram analisados os seguintes aspectos cirúrgicos: duração do procedimento, sangramento trans e pós-operatório, dor pós-operatória e período de cicatrização.
Resultados
A duração média do ato cirúrgico para cada tonsila foi de 14 minutos.
Houve excelente controle do sangramento trans-operatório em quase todos os vasos da região da loja tonsilar. Em relação aos vasos mais calibrosos, houve necessidade de cauterização elétrica com o bisturi elétrico bipolar em 50% dos pacientes, com controle total do sangramento. No pós-operatório imediato e tardio não aconteceram complicações hemorrágicas.
A dor pós-operatória foi um sintoma pouco referido por este grupo de pacientes. A cicatrização foi analisada através do acompanhamento das pseudomembranas da loja tonsilar. Estas tiveram um período de descolamento total em torno do 18º dia de pós-operatório. Apesar deste fato, o período de duração da dor variou de 8 a 10 dias.
Discussão
A evolução tecnológica deve ser bem aceita em qualquer área, contudo devemos ter discernimento para avaliar o custo benefício na aplicação desta nova tecnologia. A associação da microscopia ópitca com o bisturi ultracision parece mostrar resultados animadores
Iniciamos desta forma um estudo preliminar com 26 casos, especificamente para realização da tonsilectomia1, 2. Notamos que a principal vantagem da microscopia em relação a técnica macroscópica de tonsilectomia com B.U. seguida por Tenton (Toronto, 1999) está no fato da microscopia proporcionar magnitude de visão, com possibilidade de identificação mais apurada de estruturas anatômicas como vasos, nervos e limites.
Portanto, a possibilidade de benefícios desta associação de métodos incentivou esse estudo preliminar, objetivando proporcionar maior controle, desenvoltura técnica e segurança às tonsilectomias.
Observamos que o tempo de duração do ato cirúrgico se equivale ao tempo das técnicas clássicas de dissecção.
A possibilidade, pela microscopia, de identificação de vasos antes de serem cortados, permitiu hemostasia mais eficiente durante o procedimento de dissecção e exérese das tonsilas, assim como controle pós-operatório imediato de possíveis vasos sangrantes. Desta forma, foram eliminadas hemorragias a curto, médio e longo prazo, embora 50% dos casos tenham necessitado também da utilização do bisturi elétrico bipolar.
Apesar da introdução da técnica mista de anestesia (geral e local pré-operatória imediata), não encontramos diferença no controle da dor pós-operatória em relação à literatura.
A cicatrização, outro parâmetro analisado, que se realizou completamente em torno do 18º dia (em média) do pós-operatório, não influenciou no quadro doloroso, apesar do alongamento deste tempo com relação ao de outras técnicas.
Conclusão
A microscopia ótica permitiu um bom nível de preservação dos tecidos, vasos e nervos, diminuindo a chance de traumas e facilitando o controle total do sangramento. O Bisturi Ultrassônico foi um importante aliado neste processo associativo.
Apesar de ser uma avaliação preliminar, a associação destes dois métodos contribuiu para a boa evolução dos casos. Assim, sugerimos sua realização nos serviços com disponibilidade para tal.
Referência Bibliográfica
1. Andréa, M. - Microsurgical Bipolar Cautery Tonsilectomy, Laryngoscope, 103: 1177-8, 1993.
2. Kujawski, O.; Dulguerov, P.; Gysin, C.; Lehmann, W. - Microscopic tonsilectomy: a double blind randomized trial. Otolaryngology Head and Neck Surgery, 117(6): 641-7, 1997.
* Professor Chefe da Disciplina Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Sergipe.
** Médico Diretor do Hospital São Lucas.
*** Médico do Hospital dos Servidores do Estado de Pernambuco.
**** Médico da Clínica de Otorrinolaringologia Dr. Jéferson D'Avila.