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Ano: 2003  Vol. 7   Num. 4  - Out/Dez Print:
Original Article
Mastoidectomia Radical Modificada Tipo Bondy Sem Meatoplastia: Proposta Terapêutica
Bondy´s Modified Radical Mastoidectomy Without Meatoplasty: Therapeutic Proposal
Author(s):
Ronaldo C. Santos Júnior*, Arlete Cristina G. Santos**, Lauro do N. Abud***, Eduardo P. F. de Jesus****.
Palavras-chave:
mastoidectomia, Bondy, meatoplastia.
Resumo:

Introdução: O tratamento do colesteatoma é cirúrgico. A mastoidectomia radical modificada tipo Bondy (MRMTB) é uma opção do tratamento para pequenos colesteatomas ático-antrais. Objetivo: Apresentar e analisar uma proposta terapêutica conservadora através da realização da MRM-TB sem a meatoplastia. Métodos: 16 pacientes (7 do sexo masculino e 9 do feminino), com idade média de 31,4 anos, foram submetidos a MRM-TB e avaliados quanto ao seu follow-up, alterações auditivas pós-operatórias e resultados estéticos. Resultados: Após 3 anos da cirurgia 94% dos pacientes apresentavam-se sem otorréia, recidiva ou colesteatoma residual; 56% apresentaram melhora parcial da audição e 88% estavam satisfeitos com a cirurgia. Conclusões: A MRM-TB sem meatoplastia é uma opção cirúrgica conservadora eficiente no tratamento de pequenos colesteatomas ático-antrais.

INTRODUÇÃO

A otite média crônica (OMC) é definida como um processo inflamatório crônico, localizado na fenda auditiva, associado ou não a uma perfuração da membrana timpânica e a otorréia crônica (1,2). A OMC geralmente está associada a quadros inflamatórios mais insidiosos, persistentes e destrutivos. Essas características lhe conferem maior agressividade, que se traduz clinicamente por uma série de complicações e/ou seqüelas anatômicas e funcionais (3). Clinicamente, a OMC é dividida em dois grandes grupos perfeitamente individualizados e distintos:

1. A OMC simples e a OMC supurativa não-colesteatomatosa, de prognóstico benigno, sem tendência a complicações graves;

2. A OMC colesteatomatosa (OMCC), de prognóstico reservado, podendo levar a complicações graves em direção ao endocrânio, labirinto, nervo facial etc (4). Historicamente, o colesteatoma foi descrito primeiramente por DUVERNEY em 1683 e chamado de um “steatoma” (5).

JOHANNES MULLER, em 1838, foi o primeiro a utilizar o termo colesteatoma com finalidade de descrever um tumor perolado, lamelado e formado por gordura, com cristais de colesterol dispersos entre células poliédricas. FRIEDMANN E SCHUKNECHT ainda o descreveram de maneiras diferentes, porém, do ponto de vista histopatológico, o colesteatoma associado à OMC pode ser definido como uma lesão destrutiva, contendo fibroblastos, queratinócitos e células inflamatórias, acometendo a caixa do tímpano, processo mastóideo ou ambos (6,7). O tratamento mais eficiente da OMCC é cirúrgico. A mastoidectomia é a técnica cirúrgica em que as células da mastóide são abordadas (6,8). Historicamente há relatos sobre a infecção da orelha e mastoidite desde os trabalhos de HIPÓCRATES (9).

A idéia de drenagem mastóidea surge inicialmente com o cirurgião medieval Ambroise Paré, com finalidade de melhorar o sofrimento do rei Charles II da França em “delírio febril” e supuração auricular. Em 1774 JEAN PETIT descreve a primeira intervenção da mastóide com sucesso (9). A mastoidectomia passa a ser, então, um procedimento de uso constante e logo tem suas indicações expandidas.

VON BERGMAN, em 1889, introduz o termo “mastoidectomia radical” para cirurgias de colesteatoma com a necessidade de limpeza total da mastóide, com a derrubada das paredes ósseas posterior e superior do CAE, com a preocupação de erradicação da doença e exteriorização da cavidade timpânica e mastóidea, para um controle visual direto de eventuais recorrências e para permitir a limpeza da cavidade pelo CAE6.

A padronização dessa técnica foi proposta por ZANFAL e STACHE (9). Surge, então, no final do século XIX, a preocupação com a perda auditiva e a paralisia facial. JANSEN e KÖRNER sugerem modificações mais conservadoras para a cirurgia radical clássica. A consolidação dessa preocupação ocorre em 1910 quando GUSTAV BONDY propõe a sistematização das indicações e técnica da chamada “mastoidectomia radical modificada” (9). No início da década de 50 surge, com WÜLLSTEIN e ZÖLLNER, a timpanoplastia para reconstrução do sistema timpanossicular (9). Já no final da década de 50, a House Ear Clinic, em Los Angeles, começa a empregar a chamada “técnica fechada”, com preservação da parede posterior do CAE, no tratamento da OMCC, iniciando, assim, uma discussão quanto à eficiência dessas técnicas. Sendo assim, de uma maneira geral, as mastoidectomias são divididas em cavidades fechadas (a parede posterior do CAE é preservada, não havendo comunicação permanente entre o exterior e a cavidade cirúrgica) e cavidades abertas (sem preservação da parede posterior, havendo comunicação entre o exterior e a cavidade cirúrgica) (8). Essas duas categorias de mastoidectomias, entretanto, carregam diferentes resultados na audição, no aspecto físico e estético e nos cuidados pós-operatórios.

As técnicas fechadas podem necessitar de várias operações para erradicação da doença e apresentar uma maior taxa de recidiva e de colesteatoma residual, porém apresentam melhores resultados funcionais.

Já as técnicas abertas, freqüentemente, levam a piores resultados funcionais e necessitam de um maior cuidado pós-operatório, porém, apresentam menor índice de recidiva e de colesteatoma residual (3). O tratamento da OMCC é primariamente cirúrgico e apresenta como objetivo primordial a total remoção do tecido doente, promovendo um ouvido médio seco e seguro, isto é, livre de infecções e complicações. Tem ainda como objetivos: a eliminação de condições anatômicas propícias a recorrências e manutenção ou restauração da audição, sendo esses considerados secundários, mas, obrigatoriamente, ponderados na escolha cirúrgica (6,10-12). Especificamente, a mastoidectomia radical modificada tipo Bondy é indicada nos casos de pequenos colesteatomas ático-antrais, com mesotímpano normal, cadeia ossicular intacta, perfuração timpânica limitada à parte flácida e boa audição (3,10,13,14).

Oferece, como resultado cirúrgico, boa audição, baixa incidência de recorrência da doença e cuidado pós-operatório menos trabalhoso (13). A meatoplastia é um procedimento cirúrgico, descrito inicialmente por STACKE em 1893, que tem como finalidade ampliar a abertura da orelha externa e criar um retalho de pele que servirá de matriz de epitelização da neocavidade (15-17).

A meatoplastia tornou-se um procedimento cirúrgico complementar imprescindível nas timpanomastoidectomias de cavidade aberta e nas cirurgias do CAE estenosado, mas é um coadjuvante nas canaloplastias, timpanoplastias, timpanomastoidectomias de cavidade fechada e em alguns procedimentos otoneurocirúrgicos (1,15,16,18-20). Tal procedimento apresenta como vantagens uma abertura meatal adequada que permite acesso fácil ao CAE, membrana timpânica e às neocavidades, sendo essencial para manter tais cavidades “secas” e facilitar o devido toillet pós-operatório (16). Segundo VINCENT et al., a presença de um meato largamente aberto é fundamental ao sucesso da timpanomastoidectomia (17). Quando inadequadamente aberto, interfere com a autolimpeza da cavidade mastóidea e pode também dificultar o exame clínico e limpeza periódicos.

Acúmulos de debris podem, ainda, piorar a condução auditiva, resultar em infecção crônica e recidiva da doença (Tabela 1). Existem várias técnicas para meatoplastia (15,17-20) desde as que utilizam meatos excessivamente amplos aos mais conservadores, mantendo meatos reduzidos ao mínimo e há ainda aqueles que chegam a utilizar stents para manutenção da abertura meatal. A meatoplastia apresenta, contudo, algumas limitações como: a não capacidade plena de autolimpeza da neocavidade, atribuição teórica a tal procedimento (16) e estreitamento pós-operatório (21). Outra limitação seria o fator estético, de fundamental importância para os pacientes, principalmente, relacionados a meatos amplos (19), sem esquecer dos distúrbios vestibulares causados pelo frio ou sons altos (19).

Algumas outras complicações são descritas como: dor pós-operatória inexplicável, infecção local, condrites e estenose do canal, sendo essa a grande preocupação da meatoplastia (15,16,19). O presente estudo tem como objetivo analisar a mastoidectomia radical modificada tipo Bondy sem a realização da meatoplastia em pequenos colesteatomas ático-antrais, avaliando seus resultados estéticos, seu followup no que se refere a supurações recorrentes, recidiva ou colesteatoma residual e alterações auditivas pós-operató- rias.

PACIENTES E MÉTODOS

Foi feito um estudo retrospectivo e prospectivo de pacientes submetidos a mastoidectomia radical modificada tipo Bondy, durante o período de fevereiro de 1998 a fevereiro de 2003.

Todos os procedimentos foram realizados pelo mesmo cirurgião, obedecendo sempre os mesmos critérios de seleção e padronização da técnica. A indicação para a técnica foram os casos de pequenos colesteatomas ático-antrais, com mesotímpano normal, cadeia ossicular intacta, perfuração timpânica limitada à parte flácida e boa audição. A técnica utilizada é explicada a seguir: Os pacientes foram posicionados em decúbito dorsal com a cabeça rodada para o lado oposto ao da cirurgia, tomando-se o cuidado para que a rotação não fosse extrema.

A cabeça foi elevada 20º em relação à mesa cirúrgica, com o uso de uma rodilha. Procedeu-se então a anti-sepsia do campo operat ório e colocação dos campos cirúrgicos. Seguiu-se então a infiltração local com solução de lidocaína a 2% com adrenalina (1:80.000). A incisão foi retroauricular com extensão temporal, por planos, preservando-se a fáscia muscular (temporal) subjacente, que serviu como fonte de enxerto para a membrana timpânica.

A dissecação, no plano da fáscia superficial, prosseguiu até a exposição do contorno da porção membranosa do CAE, da região correspondente ao início do processo zigomático, acima, e da ponta da mastóide, abaixo.

Seguiu-se a realização do retalho musculoperiosteal, realizando-se duas incisões, uma superior, outra inferior ao CAE, unidas posteriormente por uma incisão vertical em continuidade à porção membranosa do CAE.

O descolamento foi realizado no plano subperiosteal. Partiuse para a realização da incisão da pele do CAE; tal incisão foi realizada a aproximadamente 2 a 3 mm abaixo da borda óssea do CAE, procedendo-se a um descolamento subperiosteal do músculo temporal, superiormente, e das inser- ções musculares das regiões posterior e inferior da ponta da mastóide, sendo afastadas por dois afastadores autoest áticos tipo Jansen.

A seguir, confeccionou-se os retalhos de pele do meato acústico externo que serviram como retalhos nutricionais/vasculares para o enxerto da membrana timpânica e fonte de tecido epitelial, com incisões verticais respectivamente à altura de 6 e 9 horas que foram prolongadas até o anel timpânico. O retalho timpanomeatal foi rebatido acessando a caixa do tímpano, procedendo-se à sua inspeção detalhada. Partiu-se para a mastoidectomia propriamente dita, com brocamento ósseo, obedecendo aos seguintes limites iniciais:

superiormente a um prolongamento da linha temporal, anteriormente pela parede posterior do CAE e, posteriormente por uma linha imaginária que estaria posicionada ao longo do seio sigmóide.

Reconhecemos, após certo tempo, o tegumento mastóideo, o antro, a posição do seio sigmóide (ou seio lateral), o ramo longo da bigorna, as células da ponta da mastóide e o bloco labiríntico, identificando a partir do alargamento do antro e visualização do canal semicircular lateral.

A parede posterior do CAE foi removida superiormente até o nível do ânulo timpânico, diferentemente da mastoidectomia radical clássica na qual a parede posterior do CAE é rebaixada até o canal do nervo facial na qual, dessa forma, nivela o assoalho da caixa timpânica com o assoalho da cavidade mastóidea.

É importante a remoção do maior número de células possível para reduzirmos ao máximo a quantidade de mucosa doente residual, permitindo, ao final de todo o brocamento, a confecção de uma cavidade de paredes lisas. A seguir, o colesteatoma foi removido do ático e posteriormente do antrum podendo ser retirado por inteiro, sem rompê-lo, preservando sua matriz. O retalho de pele foi rodado para cobrir a região atical e mastóide. Finalmente realizamos a timpanoplastia com enxerto de fáscia do músculo temporal. O conteúdo do ouvido médio foi preservado intacto. Achamos desnecessária a realização da meatoplastia como descrito pela técnica da mastoidectomia radical modificada tipo Bondy (3,9,13,14). Todos os pacientes foram, então, analisados quanto ao sexo, idade, follow-up da cirurgia por um período de três anos, resultados auditivos pós-operatórios e satisfação do paciente, sob forma de protocolo.

O follow-up da cirurgia foi separado por períodos (3 semanas; 2 meses; 6 meses; 1 ano; 1,5 anos; 2 anos e 3 anos) e analisados quanto a epitelização da cavidade, pega do enxerto, presença ou não de otorréia, recidiva ou colesteatoma residual.

Nesse follow-up utilizamos, para visualização de toda a neocavidade, procedimentos complementares como a microscopia e a otoendoscopia.

Vale frisar que ainda foi analisado se a otorréia, quando presente, necessitou de tratamento com antibiótico tópico apenas, tópico e sistêmico ou não houve melhora com essas medidas.

Já o resultado funcional foi analisado pela audiometria pós-operatória e comparado com os resultados pré-operatórios e, então, classificados em:

inalterada, melhora total (fechamento do gap), melhora parcial (melhora parcial do gap) ou piora (piora do gap ou perda neurossensorial). Finalmente, analisamos a satisfação do paciente, principalmente no que concerne ao aspecto estético, classificando-os em: satisfeito, insatisfeito e indiferente. RESULTADOS Foram analisados 16 orelhas de 16 pacientes submetidos à mastoidectomia radical modificada tipo Bondy sem a realização da meatoplastia. Desses, 56% (N=9) eram do sexo feminino e 44% (N=7) do sexo masculino (Gráfico 1).

A idade variou de 11 a 69 anos, sendo a média de 31,4 anos (Tabela 2). Quanto ao follow-up desses pacientes, classificados por períodos, observamos no segundo mês que 56% (N=9) dos pacientes não apresentavam epitelização total da cavidade apesar de na 3ª semana 75% (N=12) dos pacientes apresentarem epitelização parcial.

Observamos, ainda no 2º mês, que 69% (N=11) dos pacientes apresentavam pega do enxerto e 75% (N=12) não apresentavam otorréia. Com 6 meses observamos que 69% (N=11) dos pacientes não apresentavam otorréia e 94% (N=15) não apresentavam recidiva ou colesteatoma residual. Com 1 ano observamos que 94% (N=15) dos pacientes não apresentavam otorréia, recidiva ou colesteatoma residual.

Nesse período, uma paciente apresentava otorréia refratária ao tratamento clínico e com colesteatoma residual, sendo reoperada. Já com 1,5; 2 e 3anos de follow-up observamos que os mesmos 94% dos pacientes mantiveram-se sem otorréia, recidiva ou colesteatoma residual (Gráfico 2). Com relação à otorréia observamos que durante toda a evolução 44% (N=7) dos pacientes apresentaram tal sinal, sendo que 1 melhorou apenas com antibiótico tópico, 5 com antibióticos tópico e sistêmico e 1 não melhorou com as medidas medicamentosas (Gráfico 3). Com relação aos resultados funcionais, observamos que 56% (N=9) dos pacientes apresentaram melhora parcial do gap, 19% (N=3) apresentaram melhora total e 25% (N=4) dos pacientes mantiveram suas audiometrias inalteradas (Gráfico 4). No que concerne à satisfação, 88% (N=14) dos pacientes encontravam-se satisfeitos com os resultados estético, funcional e físico da cirurgia, sendo 1 paciente indiferente e 1 insatisfeito (Gráfico 5). Uma paciente apresentou colesteatoma residual, com otorréia refratária ao tratamento medicamentoso, resultado funcional inalterado e, por conseqüência, estava insatisfeita com os resultados.

Foi reoperada com 1 ano, apresentando bons resultados pós-operatórios. Nesse caso em particular foi realizado mastoidectomia radical clássica com realização de meatoplastia, sendo a mesma excluída do follow-up de 1,5; 2 e 3 anos.















DISCUSSÃO

O tratamento mais eficiente da OMCC é o cirúrgico através da mastoidectomia (6,8). Tal procedimento passou por toda uma evolução histórica na qual inicialmente o objetivo primordial era a erradicação da doença sem a preocupação com os aspectos estético e funcional. Passase então a uma grande fase de preocupação com o aspecto funcional, realizando procedimentos mais conservadores, como os descritos inicialmente por JANSEN, KÖRNER e o próprio GUSTAV BONDY com a mastoidectomia radical modificada (9).

Tal evolução conservadora ganha maior impulso com a introdução da timpanoplastia no início da década de 50 e a introdução da chamada técnica fechada, com preservação da parede posterior do CAE, no final da mesma década (9). Atualmente podemos adotar uma postura mais conservadora em alguns casos, pois os meios diagnósticos como a microscopia, otoendoscopia, TC e RNM, facilitam o diagnóstico em fases mais precoces de possíveis recidivas ou colesteatomas residuais, quando esses se encontram restritos e menos agressivos, possibilitando delimitação da região acometida e escolha mais adequada do tratamento complementar.

Além dessa evolução, vemos ainda a redu- ção dos índices de complicações extra e intracranianas pela OMCC na era antibiótica (22). A meatoplastia é um procedimento cirúrgico adjuvante às mastoidectomias de uma maneira geral e apresenta como finalidade ampliar a abertura meatal, facilitando a auto-limpeza do ouvido e o controle clínico periódico, e criar um retalho de pele que servirá de matriz de epitelização da neocavidade (9,15,17). OSBORNE et al.

(1985) apresentaram técnica de meatoplastia ampla com finalidade de proporcionar fácil acesso a cavidade mastóidea, para sua devida limpeza no pós-operatório, provendo boa ventilação e prevenindo a otorréia (19). Alguns pontos negativos, porém, acompanharam tal procedimento como: 9% dos pacientes reclamaram do aspecto estético; 16% relataram vertigem com sons altos, como resultado do fenômeno de Tullio; e 36% relataram tonturas causadas pelo frio. HOFFMAN et al., preocupados com o aspecto estético da meatoplastia, porém cientes da sua importância, apresentaram, em 1997, técnica de meatoplastia reduzida por um retalho condrocutâneo confeccionado a partir da hélice, com bons resultados (18). A meatoplastia nem sempre permite a autolimpeza da neocavidade, sendo importante a remoção de crostas e descamação epitelial em média uma vez por ano e, ocasionalmente, com maior freqüência (16).

Segundo PAPARELLA e MEYERHOFF é quase impossível a realização de um meato muito largo; por outro lado, é um erro comum criar um meato pequeno, que apresenta uma constante tendência ao estreitamento pós-operatório (21). Vê-se, portanto, que a meatoplastia é um procedimento cirúrgico importante.

Contudo, apresenta algumas limitações e complicações inerentes a qualquer procedimento cirúrgico. Partindo da observação de alguns autores e da nossa experiência pessoal, adotamos uma postura mais conservadora, não realizando a meatoplastia na mastoidectomia radical modificada tipo Bondy, já que essa técnica apresenta baixa incidência de complicações e de recorrência da doença, uma vez que os colesteatomas dificilmente recidivam quando são pequenos e bem delimitados (13,14). Essa postura conservadora nos permite, teoricamente, associar os bons a excelentes resultados pós-operatórios, próprios da mastoidectomia radical modificada tipo Bondy, a uma boa visualização de toda a neocavidade, através da utilização de procedimentos complementares como a microscopia e otoendoscopia, no seu follow-up, em substitui ção da meatoplastia. Com relação ao follow-up das mastoidectomias, seu objetivo principal é avaliar a cicatrização, através da epitelização parcial ou total da cavidade, e detectar, o mais precoce possível, a presença de complicações e de recidiva ou colesteatoma residual.

Sua divisão em períodos é um critério metodológico utilizado para o acompanhamento em cirurgias otológicas para as patologias infecciosas (OMC). O conceito de ouvido “seco” (dry ear), saudável, é definido como a presença de uma cavidade completamente epitelizada com ausência de otorréia intermitente ou recorrente, sem a necessidade de tratamento tópico e sem tecido de granulação ou colesteatoma (23), sendo este o objetivo primordial da mastoidectomia (23).

Conclui-se, portanto, que a falha cirúrgica encontra-se em falha na obtenção desses objetivos, sendo o principal sinal a otorréia. A incidência de otorréia pós-operatória é da ordem de 20% a 60% nas técnicas abertas (10,20), podendo chegar a 10% em mãos experientes (10,23). Os principais fatores relacionados com a otorréia pós-operatória são: um “muro do facial” alto com remoção da parede posterior do CAE incompleta e o formato de rim da cavidade pósmastoidectomia (24).

Outros fatores são: ponta da mastóide proeminente que abriga debris e favorece a umidificação da cavidade e otorréia; meato pequeno, não permitindo visualização de toda a cavidade e presença de tecido de granulação (20,23,24). SADÉ et al.

demonstraram que as cavidades mastóideas teriam uma tendência a permanecerem “secas” se essas não fossem excessivamente largas, apresentassem um “muro do facial” baixo, um meato adequadamente aberto e o ouvido médio fechado (24). PAPPAS descreve a mastoidectomia radical modificada tipo Bondy realizada em 52 pacientes e acompanhados por um período de 5 anos.

Observou que 43 pacientes mantiveram-se livres de complicações e com audição normal ou próximo do normal. A taxa de otorréia foi da ordem de 11,5% e observou 01 caso de colesteatoma residual. Conclui, enfim, que a técnica descrita por Bondy é um procedimento com bons a excelentes resultados, baixa incidência de complicações e de recidiva ou colesteatoma residual (13). Nessa série observamos inicialmente uma taxa de otorréia da ordem de 25% que, com o tratamento clínico, reduziu para 6%, condizentes com os resultados apresentados por outros autores para as técnicas abertas e, especificamente, para a mastoidectomia radical modificada tipo Bondy (10,13,20,23). Já a taxa de recidiva do colesteatoma, na literatura, varia entre 2% a 29% na técnica aberta (6,13,25), sendo maior na população infantil pelo fato do colesteatoma ser mais agressivo nessa faixa etária (25).

As razões apontadas para essa maior agressividade são: os colesteatomas são geralmente maiores e relacionam-se freqüentemente com destruição da cadeia ossicular, retrações aticais ou membrana timpânica atelectásica (25). HULKA et al. (26), em estudo duplo cego randomizado, compararam a capacidade de visualização de quatro pontos pré-estabelecidos (o seio timpânico, ramo posterior da bigorna, epitímpano lateral e o orifício da tuba auditiva) em ossos temporais dissecados pelas técnicas fechada e aberta. Concluíram que a técnica aberta apresenta uma melhor capacidade de visualização, estatisticamente significativa, dos três primeiros pontos, sendo igual à técnica fechada na visualização do orifício da tuba auditiva.

Portanto, teoricamente, removendo-se a maior parte do colesteatoma e/ou doença, devido a melhor visualização de pontos importantes de doença residual, acredita-se na redução da taxa de recidiva ou colesteatoma residual. Na presente série a taxa de recidiva foi de 6,25% (N=1) representado por um colesteatoma residual, concordante com os dados da literatura (5,21,25).

Consideramos esse caso como colesteatoma residual, pois achamos que o tempo de evolução de 1,5 ano seria pequeno para ocorrer a real recidiva do colesteatoma. A utilização de exames complementares, como a microscopia e, mais recentemente, a otoendoscopia com angulações diversas (0o, 30o, 45o e 70o) no follow-up dos pacientes submetidos a mastoidectomia, facilita a visualização de pontos importantes e sedes de colesteatoma residual ou recidiva, ou locais de acúmulo de debris e formação de tecido de granulação responsáveis por infec- ção recorrente e otorréia.

Conclui-se, portanto, que a correta utilização desses procedimentos, em um follow-up rigoroso, substitui, em parte, essa atribuição da meatoplastia. Outro ponto importante no follow-up pós-operató- rio da timpanomastoidectomia é a audição. De acordo com a literatura, o índice mais empregado para a comparação de resultados é a diferença aéreo-óssea (gap), que deve situar-se abaixo de 30 dB para se considerar o resultado funcional satisfatório (6,25,27). Entretanto, o fechamento do gap pode não expressar a realidade do resultado funcional, uma vez que esse fechamento pode ser devido a perda neurossensorial (6).

A perda auditiva após cirurgia da mastóide pode ser devido a alterações na estrutura do ouvido médio ou dano coclear (27). BLACK propôs o score “SPITE”, para determinar o grau de dificuldade nas timpanomastoidectomias no que concerne aos resultados auditivos (28).

Portanto, segundo ele, os resultados auditivos são afetados adversamente pela necessidade de cirurgia extensa (S); pela descontinuidade ossicular, requerendo colocação de prótese (P); por infecção (I); por condição ruim da mucosa da orelha média (T) e por disfunção da tuba auditiva representada por efusão da orelha média ou colesteatoma posterosuperior (E).

Esse escore não foi utilizado na metodologia do presente trabalho, pois não se enquadram na mastoidectomia radical modificada tipo Bondy.

Entretanto, o citamos aqui por concordarmos que os cinco critérios utilizados por BLACK são os mais comumente associados a resultados auditivos adversos. Observamos que 56% (N=9) dos pacientes apresentaram melhora parcial do gap e 19% (N=3) apresentaram melhora total, enquanto 25% (N=4) mantiveram inalteradas suas audiometrias.

Vemos, portanto, que 75% dos pacientes apresentaram melhora funcional, apesar do risco de perda neurossensorial por transmissão do ruído causado pelo brocamento (13,14). Um ponto importante para validade dessa série refere-se à obtenção da nossa amostra, uma vez que os artigos sobre mastoidectomia radical modificada tipo Bondy utilizados como referência, estudaram 37 (14) e 52 (13) pacientes em um período de 7 e 5 anos.

Harkness et al. fizeram grande levantamento no Reino Unido sobre mastoidectomias, analisando quais as mais realizadas, seus resultados e complicações (29).

Observaram que a média de mastoidectomias realizadas por ano, quer técnica aberta ou fechada, foi da ordem de 11 por cirurgião.

Analisamos, no presente estudo, 16 pacientes submetidos a mastoidectomia radical modificada tipo Bondy em um período de 2 anos, casuística que consideramos significativa quando comparada à de outros estudos. Com relação à satisfação do paciente, principalmente no que concerne ao aspecto estético, observamos que 88% (N=14) apresentavam-se satisfeitos, percentagem que consideramos significativa. OSBORNE et al. relatam que 9% dos pacientes submetidos a meatoplastia ampla reclamam do aspecto estético (18). Abrangemos, nessa satisfa- ção, os aspectos funcional e físico da cirurgia, apesar de ser em um plano secundário, por compreendermos que esses aspectos são inseparáveis e muito subjetivos de serem avaliados.

CONCLUSÕES

A mastoidectomia radical modificada tipo Bondy sem a meatoplastia é uma opção cirúrgica conservadora efetiva no tratamento de pequenos colesteatomas áticoantrais, pois consegue atingir o objetivo principal da mastoidectomia, a erradicação da doença e baixo índice de complicações em uma grande percentagem de pacientes, apresentando ainda bons resultados funcionais e satisfação do paciente. Vale ressaltar, também, que observamos uma boa visualização de toda a cavidade e facilidade de limpeza nos exames periódicos através da microscopia e otoendoscopia, atribuição teórica da meatoplastia.

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* Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da USP. Professor da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Sergipe.
** Professora da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Sergipe.
*** Médico Residente em ORL do Hospital de Bases de Brasília.
**** Médico graduado pela Universidade Federal de Sergipe.

Trabalho realizado na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital Universitário da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS).
Apresentado no 36º Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia, em Florianópolis, SC, 19 a 23 de novembro de 2002.
Endereço para correspondência: Av Gonçalo Prado Rollemberg, 211 - Sala 412 . Aracaju / SE . CEP: 49010-410 . Telefone: (79) 211-4576 . Fax: (79) 211-4517 .
E-mail: isbo@infonet.com.br
Artigo recebido em 12 de maio de 2003. Artigo aceito em 20 de agosto de 2003.
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