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Ano: 1997  Vol. 1   Num. 4  - Out/Dez Print:
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Turbinectomia Inferior Parcial e suas Complicações. A Influência da Duração do Tampão Nasal
Author(s):
Márcia S. Murakami, Michel B. Cahali, Tanit G. Sanchez, Ossamu Butugan
Palavras-chave:
INTRODUÇÃO

A obstrução nasal é a nona queixa mais freqüente de consulta médica nos Estados Unidos1, sendo que a hipertrofia de cornetos inferiores e desvio de septo apresentam importante participação nessa estatística. A conduta inicial deve ser a utilização de medicamentos tópicos e/ou sistêmicos, porém em casos de insucesso, torna-se necessário recorrer a outros procedimentos.

Desde 1908, têm-se elaborado técnicas cirúrgicas para correção da obstrução nasal, incluindo procedimentos em cornetos inferiores, como ressecção mucosa e óssea (com tesoura, laser e criotecnologia) e retração mucosa cicatricial por eletrocoagulação, associados ou não a septoplastia1.

As principais complicações da cirurgia do corneto inferior são rinite seca, atrófica e ozena2, epistaxe, formação de crostas, sinéquias e infecção, sendo raras epífora e perfuração septal3.

A exérese total dos cornetos inferiores era mais praticada antigamente3, com sucesso descrito em até 94% dos casos. Atua como boa técnica a curto prazo, porém apresenta complicações tardias freqüentes, representadas por 16 a 89% de crostas e ressecamento, faringite, laringite seca, 39% de odor fétido com secreção,3% de epífora, 4% de sinéquias e 1% de perfuração septal2,4. Como conseqüência, a tendência da atualidade é a escolha de procedimentos mais conservadores, que preservem o máximo possível de área mucosa2,5,6.

Com este intuito, a diatermia submucosa foi desenvolvida, porém com efetividade a curto prazo, necessitando comumente de tratamento cirúrgico adicional7,8. Hemorragia pós-operatória é rara9, mas pode ser severa, com formação de crostas10. Eventualmente, evolui com seqüestro ósseo do corneto inferior, causando rinorréia purulenta e crostas e necessitando de debridamento cirúrgico9.

A turbinoplastia refere-se à ressecção óssea submucosa do corneto, que tende a diminuir o índice de epistaxe , mas que pode deixar restos posteriores, com maus resultados cirúrgicos7. Por preservar maior área de mucosa nasal e apresentar índices baixos de complicações, é a mais defendida por alguns autores11.

Os melhores resultados quanto à função olfatória e permeabilidade nasal são encontrados com a turbinectomia parcial, além de diminuir a severidade e freqüência das infecções de vias aéreas superiores5,12. Alguns autores relatam, como complicação comum, o ressecamento e crostas nasais, com formação rara de sinéquias (4%)3,7,10,11, porém, sua principal complicação é a hemorragia, estimada em 4-9% dos casos3,8,11,12. Para evitar tais sangramentos, alguns trabalhos recomendam tampão nasal anterior por 2 a 5 dias, associado a antibiótico sistêmico, até que a mucosa nasal se regenere13,14.

Os autores estudaram prospectivamente 44 pacientes submetidos a turbinectomia parcial com ou sem septoplastia, dando ênfase às complicações, como epistaxe, sinéquias, infecção e ressecamento da mucosa nasal com formação de crostas, em relação à técnica utilizada e ao tempo de tamponamento nasal pós-operatório.

PACIENTES E MÉTODOS

Foram estudados 44 pacientes submetidos a turbinectomias inferiores parciais (TIP) na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, por diferentes cirurgiões, no período de junho de 1995 a abril de 1997.

Quanto ao sexo, 23 pacientes eram homens e 21 mulheres. Havia 25 pacientes (56,8%) com idade até 20 anos, 15 (34,1%) com idade entre 20 e 40 anos e apenas 4 (9,1%) com mais de 40 anos. Em 21 pacientes foi realizada turbinectomia unilateral, sendo realizada a cirurgia bilateral em 23 pacientes. Na maioria dos casos (36 = 81,8%), a cirurgia foi realizada adicionalmente à septoplastia, enquanto nos demais pacientes realizou-se apenas a turbinectomia. A distribuição dos pacientes segundo o sexo e o tipo de cirurgia realizada encontra-se na Tabela I.

Em todos os casos procurou-se ressecar parcialmente a cauda e a porção média do corneto, preservando-se a cabeça do mesmo. Em 41 pacientes (93,2%), foi realizada infiltração do corneto inferior com 2 ml de solução de xilocaína a 2%, com adrenalina 1:80000, previamente à secção do mesmo. Nos demais pacientes não foi realizada infiltração. Em nenhum caso foi utilizada eletro-cauterização.

Em 42 casos (95,4%) foram utilizados tampões tipo dedo de luva (porção do dedo de uma luva estéril recortada e preenchida com gaze), em 1 caso utilizou-se rayon e em 1 caso utilizou-se Merocel® canulado. Os tampões foram retirados em período de 24 horas em 15 casos (34,1%), em período de 48 horas em 28 casos (63,6%) e em 72 horas em apenas um caso (2,3%), utilizando-se de antibiótico sistêmico em todos os pacientes. Os casos foram acompanhados por 30 dias após a cirurgia, quando se observou a ocorrência de epistaxes e sinéquias na fossa nasal.

Os resultados foram submetidos a análise estatística, utilizando-se o teste de qui quadrado, com a correção de Yates, adequado para o tamanho da amostra. Considerou-se o nível de significância de 0,05.

RESULTADOS

A ocorrência de sinéquias e epistaxes pós-operatórias, segundo o tempo de retirada do tampão, está assinalada na Tabela II. Podemos observar que dois pacientes apresentaram ambas as complicações. Os resultados mostraram que não houve diferença estatisticamente significantiva na ocorrência de sinéquias e de epistaxes segundo o tempo de retirada dos tampões nasais.

A Tabela III mostra a ocorrência de complicações segundo o tipo de cirurgia realizada (turbinectomia com septoplastia X turbinectomia isolada). A análise estatística mostra não haver diferença na presença de complicações segundo o tipo de cirurgia realizada.

Não encontramos caso de rinite atrófica e infecção pós-operatória no período estudado.

DISCUSSÃO

O corneto inferior é estrutura com importante papel no turbilhonamento, aquecimento, filtração e umidificação aérea nasal. Portanto, a indicação de procedimentos cirúrgicos para sua redução deve ser cuidadosamente estudada e a técnica escolhida deve preservar ao máximo sua função mucociliar, promovendo permeabilidade nasal.

Ainda existe muita discórdia quanto ao procedimento cirúrgico mais adequado para correção da obstrução nasal por hipertrofia de cornetos inferiores. Entretanto, a maioria advoga medidas mais conservadoras, como turbinectomia parcial, turbinoplastia e diatermia submucosa, no intuito de preservar a função, mucociliar dessas estruturas e minimizar complicações, como hemorragia severa, crostas, sinéquias e ressecamento nasal6.

Com o advento dessas cirurgias, houve a somação dos riscos anestésicos; é descrito 1 caso de complicação neurológica após turbinectomia inferior bilateral sob anestesia geral, com paralisia dos III e V pares cranianos, provavelmente por migração de microêmbolo ou fluxo retrógrado da substância vasoconstritora infiltrada15.

Na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, a cirurgia de corneto inferior mais utilizada é a turbinectomia inferior parcial, mantendo-se tampão nasal anterior por 72 horas. No presente trabalho, as incidências encontradas de complicações pós-operatórias, como epistaxe e sinéquias foram mais altas que em outros trabalhos, de 13,6% para sinéquias e 18% para epistaxe, sendo nula a ocorrência de rinite atrófica. Estes dados provavelmente são devidos à elevada freqüência de associação da cirurgia com septoplastia (81,8%), acarretando maior manipulação da mucosa nasal.

Os autores estudaram as complicações em grupos diferenciados pelo tempo de permanência do tampão nasal (24, 48 e 72 horas), não encontrando diferença estatisticamente significantiva entre os mesmos. Não obstante, esses dados indicam que a ocorrência do sangramento deve estar relacionada às primeiras 24 horas de tampão nasal, já que não se observou vantagem com a utilização de tampão por tempo mais prolongado. Portanto, os resultados desse trabalho questionam os benefícios do tamponamento nasal prolongado, o qual, sem dúvida, proporciona acréscimo de desconforto ao paciente.

CONCLUSÃO

No manuseio do corneto inferior, o cirurgião deve ser conservador, pois com a turbinectomia parcial, conseguiu-se minimizar a incidência de rinite atrófica, tão observada antigamente como complicação da turbinectomia total.

Neste trabalho, as complicações do tipo sinéquias e hemorragia foram mais comuns que em outros, talvez devido à freqüência elevada de associação com septoplastia (81,8%).

Além disso, os dados indicam que o controle do sangramento pós-operatório tem relação principalmente com as primeiras 24 horas de tamponamento nasal, visto que os estudos estatísticos não mostraram diferença entre grupos que mantiveram tampão nasal anterior por 24, 48 e 72 horas, em relação à ocorrência de epistaxe e sinéquias, levantando dúvidas quanto aos benefícios do tampão por tempo prolongado.

Agradecimentos ao Dr. José Câmara pela análise estatística.

BIBLIOGRAFIA

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1- Médica Residente da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

2- Médico Residente da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

3- Médica Assistente e pós-graduanda da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

4- Médico Professor Associado da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
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