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Ano: 2005  Vol. 9   Num. 3  - Jul/Set Print:
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Triagem Auditiva Neonatal: Um Desafio para sua Implantação
Newborn Hearing Screening Program: A Challenge for its Implantation
Author(s):
Francini Grecco de Melo Pádua*, Silvio Marone**,Ricardo Ferreira Bento***, Renata Mota Mamede Carvallo****, Alessandra Stada Durante*****, Jordana C. Soares******, João Coriolano R Barros*******, Cléa R Leoni ********.
Palavras-chave:
triagem auditiva neonanatal; disacusia neurossensorial; surdez; deficiência auditiva; dificuldades; indicadores de risco para deficiência auditiva.
Resumo:

Introdução: O desenvolvimento auditivo segue etapas graduais de complexidade, o qual se inicia já na vida intra-uterina. Sabe-se que o Sistema Nervoso Central apresenta grande plasticidade quando precocemente estimulado, principalmente até os 6 meses de idade. Desta maneira, os seis primeiros meses de vida da criança são decisivos no desenvolvimento futuro da criança deficiente auditiva. Sensibilizados por estes princípios, uma equipe multidisciplinar de médicos e fonoaudiólogos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP) desenvolveram um programa de Triagem Auditiva Neonatal (TAN), bem como o acompanhamento clínico dos recém-nascidos do Berçário de alto risco do HCFMUSP. Objetivo: Apresentar os resultados obtidos pelos autores no Programa de Triagem Auditiva Neonatal e as dificuldades mais freqüentemente encontradas. Métodos: 1127 recém nascidos (RN) foram submetidos à TAN através das emissões otoacústicas por produto de distorção e avaliação comportamental através do reflexo cócleo palpebral num período de 9 meses consecutivos. Resultados: Dos 1127 RN submetidos à TAN, 581 (51,5%) eram do sexo feminino. A triagem auditiva foi adequada em 1020 RN (90,5%). No total, 166 RN (14,7%) apresentavam indicadores de risco para deficiência auditiva (IRDA), sendo encaminhados ao ambulatório da Otorrinolaringologia para acompanhamento do desenvolvimento da audição, enquanto 36 RN (3,2%) foram encaminhados para o ambulatório com intuito diagnóstico. O diagnóstico de disacusia neurossensorial profunda e bilateral foi realizado em um único caso. O IRDA mais encontrado foi a infecção congênita. Conclusões: Os médicos Otorrinolaringologistas devem entender a importância da TAN para a inserção precoce do paciente na Sociedade. É importante que a mesma seja universal para que não haja falhas na detecção da deficiência auditiva. É um Programa que deve ser multidisciplinar com a colaboração dos fonoaudiólogos, pediatras e enfermeiros. Apesar das dificuldades em sua aplicação, deve ser estimulada e realizada em todos os Berçários.

INTRODUÇÃO

A implantação e a manutenção de um programa de triagem auditiva neonatal (TAN) em Maternidades tem despertado o interesse e preocupação dos Otorrinolarin¬gologistas, Pediatras e Fonoaudiólogos, pela importância de se garantir a precocidade do diagnóstico de possível deficiência auditiva e sua reabilitação.

O desenvolvimento auditivo segue etapas graduais de complexidade, o qual se inicia já na vida intra-uterina. Assim, para que uma criança adquira a linguagem e desenvolva sua fala, deve ser capaz de detectar um som, prestar atenção a este, discriminá-lo, localizá-lo, memorizá-lo, reconhecê-lo e finalmente compreendê-lo (1-4). Qualquer destas etapas e principalmente as iniciais são de grande importância para que todo o processo se complete.

A interrupção desta seqüência, que poderá ocorrer em decorrência da presença ou mesmo na ausência dos Indicadores de Risco para Deficiência Auditiva (IRDA), levará consequentemente a prejuízos funcionais importantes no desenvolvimento da criança (2,3,5). Por outro lado, sabe-se que o Sistema Nervoso Central apresenta grande plasticidade quando precocemente estimulado, principalmente até os 6 meses de idade, levando a aumento de conexões nervosas e consequentemente melhor reabilitação das vias auditivas (6). Desta maneira, os seis primeiros meses de vida da criança são decisivos no desenvolvimento futuro da criança deficiente auditiva. Por estas razões, se justifica a preocupação dos Otorrinolaringologistas, Pediatras e Fonoaudiólogos que têm promovido campanhas de conscientização da população e dos profissionais da saúde.

Sensibilizados por estes princípios, a Disciplina de Otorrinolaringologia, o Departamento de Pediatria (Berçário Anexo à Maternidade), o Serviço de Fonoaudiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP) e o Departamento de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da USP desenvolveram durante o ano de 2003 um programa de Triagem Auditiva Neonatal, bem como o acompanhamento clínico no Ambulatório de ORL do HCFMUSP a fim de traçar o perfil audiológico dos recém-nascidos no Berçário de alto risco do HCFMUSP.

PACIENTES E MÉTODOS

No período de março a novembro de 2003, 1127 recém nascidos (RN) internados no Berçário Anexo à Maternidade do Hospital das Clínicas da FMUSP foram submetidos à Triagem Auditiva Neonatal (TAN). De uma forma geral, esse Berçário tem como peculiaridade ser, em grande parte, de alto risco.

Primeiramente, um questionário sobre os possíveis indicadores de risco para perda auditiva (IRDA), segundo o Joint Committee on Infant Hearing (7), foi preenchido pelo médico Pediatra para cada um dos RN.

No dia da alta do RN, ou seja, no mínimo com 48 hs de vida, todos os RN foram submetidos ao exame otoscópico realizado pelo médico Otorrinolaringologista, seguido de limpeza do conduto auditivo externo (CAE) quando necessário.

A seguir era realizada a avaliação da presença das emissões otoacústicas produto de distorção (EOA PD) por meio do equipamento ERO SCAN DPOAE TEST SYSTEM - MAICO, na modalidade C, onde 6 freqüências auditivas eram testadas (2 KHz a 4 KHz) com intensidade de F1 de 65 dB SPL e de F2 de 55db SPL. O critério de positividade das EOAPD era determinado automaticamente pela presença de EOA no mínimo em três freqüências.

Associada a EOAPD foi realizada avaliação comportamental através da pesquisa do reflexo cócleo palpebral (RCP), utilizando-se do agogô como instrumento sonoro.

Todos os resultados foram anotados no mesmo questionário preenchido pelo médico Pediatra. Os RN que passaram nos exames e não apresentavam IRDA recebiam alta; os RN que passaram nos exames mas apresentavam IRDA eram encaminhados para o Ambulatório da Otorrinolaringologia (AORL) do HCFMUSP para acompanhamento da audição; os RN que não passaram nos testes eram reagendados para um reteste através das EOAPD e RCP. Os RN que não passaram no primeiro teste ou no reteste foram encaminhados ao Ambulatório com a intenção de diagnóstico (Figura 1).



Os exames foram aplicados por uma Fonoaudióloga juntamente com um médico Otorrinolaringologista, no intervalo das mamadas, estando a criança em condição calma.

RESULTADOS

No período de março a novembro de 2003, houve 1840 RN internados no Berçário anexo à Maternidade do HCFMUSP. Destes, 1127 (61,2%) foram submetidos à Triagem Auditiva Neonatal (TAN) neste mesmo período (9 meses), sendo 581 RN ( 51,5%) do sexo feminino e 546 RN (48,5%) do sexo masculino.

Dos 1127 RN atendidos, 1020 (90,5%) apresentaram triagem auditiva adequada, enquanto 107 (9,5%) apresentaram alterações em uma das avaliações ou em ambas (Gráfico 1). 44 RN (41,1%) apresentaram ausência de EOAPD em orelha esquerda, 24RN (22,4%) apresentaram ausência de EOA PD em orelha direita e 35RN (32,7%) apresentaram ausência de EOAPD em ambas as orelhas. O RCP estava presente em 1097RN (98,2 %), sendo dez casos não testados por problemas técnicos. A otoscopia estava dentro dos padrões de normalidade em 1124 RN (99,7%), necessitando de intervenção do Otorrinolaringo¬logista apenas em 1 caso para limpeza de CAE. Em um dos casos o paciente apresentava agenesia de CAE e em outro, sinéquia em CAE.

Dos 107 casos (9,5%) com triagem inadequada, 23 casos (21,5%) foram encaminhados diretamente para ambulatório para diagnóstico da audição, enquanto 84 casos (78,5%) foram encaminhados para reteste, sendo que apenas 32RN (38,1%) compareceram. No reteste, 21 RN (65,6%) apresentaram exames adequados, enquanto 11 RN (34,4%) não apresentaram. Dos 21 RN que passaram no reteste, 2 deles (9,5%) apresentavam IRDA, sendo encaminhados para ambulatório para acompanhamento da audição.

No total, 166 RN (14,7%) apresentavam IRDA, sendo encaminhados ao ambulatório da Otorrinolaringologia para acompanhamento do desenvolvimento da audição, e destes, 36 RN (3,2%) foram encaminhados para o ambulatório com intuito diagnóstico. Dos 36 pacientes, apenas 32 procuraram o Ambulatório de Investigação de surdez infantil, sendo então, encaminhados para Audiometria de Tronco Cerebral (BERA), com os seguintes resultados: 9 apresentaram exame sem alterações; 5 apresentaram exames sugestivos de perda auditiva condutiva, 1 paciente apresentou disacusia neurossensorial profunda bilateral, 1 paciente apresentou disfunção retrococlear, sugestiva de imaturidade; enquanto 16 pacientes não retornaram com seus exames. Assim, dos 1127 pacientes submetidos à Triagem Auditiva, até o momento, houve apenas um diagnóstico de surdez (0,09%) em um paciente do sexo feminino, prematura, com meningoencefalocele parieto-occipital, ou seja, pertencente ao grupo de risco para perda auditiva. Desse modo, no total de 166 pacientes encaminhados ao ambulatório, apenas 113 pacientes foram atendidos no período de maio de 2003 a julho de 2004, o que representa uma perda de 31,9% (53) dos pacientes.



Dentre os fatores de risco para deficiência auditiva (IRDA) mais encontrados durante a Triagem, a infecção congênita foi a mais freqüentemente encontrada, seguida do Apgar baixo, ototóxicos, baixo peso, malformação congênita, hiperbilirrubinemia com níveis de exsanguineo transfusão, história de deficiência auditiva na família, síndromes associadas a deficiência auditiva, distúrbios neurológicos, ventilação mecânica prolongada, meningite bacteriana e consangüinidade.

DISCUSSÃO

Sabe-se que nos RN de baixo risco para deficiência auditiva, a incidência de perda auditiva bilateral e significante é estimada entre um a três RN a cada mil (8,9,10), aumentando para cerca de dois a cinco em cada 100 RN provenientes de Unidades de Terapia Intensiva (UTI) (9,11). De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografa e Estatística, no Censo realizado em 2000, a incidência de DA na população brasileira foi de 16,7%, sendo de 16,4% no Estado de São Paulo (12). A perda auditiva é o defeito congênito mais freqüente, sendo mais prevalente do que outros defeitos que são rotineiramente triados, sendo 100 vezes mais prevalente do que a fenilcetonúria e 10 vezes mais prevalente que o hipotireoidismo (5).

A Triagem Auditiva Neonatal (TAN) compreende a realização de um ou mais exames audiológicos (emissões otoacústicas, audiometria de tronco cerebral, impedan¬ciometria, reflexo cócleo-palpebral), de acordo com a possibilidade do serviço, em recém-nascidos, a fim de detectar e tratar precocemente a deficiência auditiva, quando presente. Quando realizada somente nas crianças que apresentam IRDA acarreta uma falha de se identificar cerca de 50% dos deficientes auditivos (7,13), e é por esse motivo que é preconizada sua realização de forma universal, ou seja, em mais de 95% dos RN do berçário (7). Muitas crianças sem fatores de risco para perda auditiva não são diagnosticadas até que completem 18 meses de vida (6).

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que cerca de 1,5% da população brasileira apresenta certo grau de deficiência auditiva (DA), que podem variar de discretas até muito intensas (1). O ideal é a realização da TAN no primeiro mês de vida, identificação dessas crianças antes dos três meses de idade e iniciar a intervenção até os seis meses (5,7). No Brasil, a idade média do diagnóstico de DA está em torno de três a quatro anos (1), podendo levar até dois anos para ser concluído, e desta forma, acarretar danos irreparáveis para a criança e onerar custos para a Sociedade. Em 1994, num trabalho de tese desenvolvido por NÓBREGA (4), foi concluído que a confirmação diagnóstica de DA até os dois anos de idade ocorreu apenas em 13% dos pacientes estudados, embora 56% tenham sido suspeitados nesta fase. Assim, havia um tempo perdido de mais de 2 anos entre a suspeita clínica e a confirmação de DA (4,14,15).

Os autores do presente estudo, apesar da intenção de realizar uma TAN universal, depararam-se com algumas dificuldades operacionais, o que impediu o atendimento de mais de 95% dos RN, tendo atendido 61,2% do total dos RN.

Enquanto crianças maiores de 6 meses podem ser testadas através de testes comportamentais, os RN não apresentam a mesma facilidade (16). Assim, duas medidas fisiológicas da função auditiva podem ser utilizadas: as emissões otoacústicas (EOA) e a audiometria de tronco encefálico (BERA) (16) Cada um apresenta vantagens e desvantagens, sendo que ambos são capazes de detectar uma perda auditiva de grau leve (16). Assim, a TAN tem como principal objetivo separar com acurácia e eficiência a grande maioria dos RN com boa audição, daqueles menos comuns com perda auditiva (16)

Primeiramente, deve-se ter em mente que para um bom exame o RN deve estar tranqüilo, preferencialmente dormindo (16), o que ocorre principalmente depois da mamada. Desta forma, os responsáveis pela realização do exame devem se encaixar na rotina do Berçário, para realizá-los entre as mamadas. Deve-se lembrar que os mesmos mamam aproximadamente a cada três horas e acrescentando o tempo de levá-los até a mãe e o retorno ao Berçário, os executores têm aproximadamente 2hs para realização dos testes.

Os testes devem ser realizados em ambientes calmos e muitas vezes isso se torna um empecilho, uma vez que não se consegue evitar o desencadeamento do choro coletivo dos RN. Assim, o ideal é a utilização de uma sala isolada em que os executores dos exames fiquem sozinhos com os RN.

Após a realização dos testes, somente será possível estipular uma conduta de alta, encaminhamento ao AORL para acompanhamento e/ou diagnóstico da audição se os IRDA foram corretamente preenchidos. Ressalta-se aqui a importância do trabalho multidisciplinar, onde os médicos pediatras assim como as enfermeiras devem ter conhecimento do trabalho do médico otorrinolaringologista e das fonoaudiólogas. Segundo o Joint Commitee on Infant Hearing (7), os IRDA são: RN com peso inferior a 1500g; pequeno para idade gestacional; asfixia perinatal grave; hemorragia intracraniana ou leucoencefalomalácea; infecção congênita suspeitada ou confirmada; história de DA familiar; pais consangüíneos ou síndromes associadas a DA; RN com meningite bacteriana; ototóxicos; hiperbilirrubi¬nemia próximo a indicação de exsanguineo transfusão; malformações crânio-faciais; RN que necessitaram de UTI por mais de 48hs. Uma das dificuldades encontradas foi o questionamento sobre história familiar de DA, uma vez que a mãe da criança nem sempre estava por perto, enquanto os outros indicadores podiam ser checados no próprio prontuário do RN.

É importante aqui, entender que o "PASSA" no teste equivale dizer que, no momento do teste, os resultados foram consistentes com audição normal (16). No decorrer da infância, perdas adquiridas podem ocorrer, como a otite secretora, infecções, ototóxicos, causas genéticas ou traumáticas, podendo gerar perdas auditivas permanentes (16). Assim, das 166 crianças encaminhadas ao Ambulatório, apenas 32 estavam sob investigação diagnóstica, enquanto o restante estava sob acompanhamento da audição. Segundo o Joint Committee on Infant Hearing (7), crianças que apresentam fatores de risco para perda auditiva devem ser acompanhadas a cada 6 meses por 3 anos para que se detecte possível perda progressiva ou tardia (7,16). Reforça-se aqui, a orientação que deve ser dada aos pais quanto à audição normal e o desenvolvimento da linguagem e comportamento de uma criança, para que avise ao médico qualquer sinal de alteração (16) e para que diminua o stress psicológico que a família é submetida (5). Segundo FORTNUM et al (17) a prevalência da perda auditiva permanente pode aumentar até os 9 anos de idade, atingindo 205 por 100.000 pacientes. Se esta afirmação é correta, sugere que a possível perda auditiva progressiva seja altamente subestimada, e só reforça a necessidade de acompanhamento dessas crianças (10).

É esperado que aproximadamente 2-4% dos RN em berçários de baixo risco, não passem no teste inicial. Este número aumenta para 5-7% em pacientes internados em UTI (16). Dentre os fatores de falha no exame, destacam-se os locais com barulho, as descamações celulares presentes no conduto auditivo externo (CAE), presença de secreção em orelha média e os RN com perda auditiva permanente (16). No presente estudo, houve apenas uma única intervenção do otorrinolaringologista para limpeza de CAE. A impressão que os autores tiveram é que no início do Programa as falhas eram mais freqüentes, provavelmente por dificuldade de técnica; e no decorrer do estudo, as mesmas eram mais freqüentes pelo barulho externo ou agitação da criança.

Por falta de pessoal disponível para realização dos testes durante o fim de semana, os RN que recebiam alta naquele período eram agendados durante a semana. Isso gerou um problema por não ser possível realizar todos os exames e retestes dentro do primeiro mês de vida, como idealmente preconizado (16). Com isso, os pacientes já estavam maiores e mais agitados, dificultando a realização das EOAPD e aumentando a falha das mesmas. Muitas vezes os pacientes não voltavam para o exame, o que ocorreu com 52 pacientes que não retornaram para o reteste.

Dos 166 pacientes encaminhados ao Ambulatório, apenas 113 (68%) compareceram até o presente momento. O mesmo índice de perda de seguimento foi obtido por WEICHBOLD e WELZL-MUELLER (18). A perda de seguimento pode ser atribuída a sistemas de marcação inadequados, falta de contato telefônico, dificuldade de transporte ao hospital e falta de comunicação entre a família do paciente e o médico, em relação a importância do acompanhamento para a detecção de perdas auditivas tardias (19). WITTMAN-PRICE e POPE (20) observaram que quando aplicada uma sessão educacional de 20 minutos, no período pré-natal, a respeito da TAN e sua importância no desenvolvimento da linguagem, 100% das famílias retornaram para consultas de seguimento. Dentre os argumentos contra a TAN, um deles diz respeito ao alto índice de falso positivo do teste, o que gera um número elevado de retestes e conseqüentes deslocamentos do paciente e sua família para o hospital (5,17).

O diagnóstico de disacusia neurossensorial (DNS) profunda bilateral foi realizada em 1RN dentre os 1127 RN avaliados, assim como dados encontrados na literatura. Pesquisas recentes indicam que crianças entre 3 e 8 anos de idade com perda auditiva, apresentam linguagem semelhante a crianças de mesma faixa etária , sem perda auditiva se a intervenção tem início até os 6 meses de vida e se há um envolvimento ativo por parte dos pais (5,6). No presente estudo, o diagnóstico de disacusia neurossensorial foi realizado aos 8 meses de vida, sendo a criança encaminhada para ambulatório de protetização. A identificação tardia leva ao desenvolvimento de linguagem tardio, o que pode resultar em problemas de aprendizado e dificuldades emocionais (6). Apesar do diagnóstico não ter sido realizado até os 3 meses e a intervenção até os 6 meses, como preconizado (7), o diagnóstico desse paciente foi mais precoce do que mostra a estatística brasileira, geralmente ocorrendo entre 3 e 4 anos (1). Por outro lado, segundo WAKE et al (21), não houve diferença no desenvolvimento da linguagem entre o grupo de crianças com intervenção precoce (antes dos 6 meses) e do grupo de crianças submetidas a intervenção entre 6 e 12 meses de vida.

Os autores desse estudo se depararam também com o problema da cobrança desses procedimentos. A TAN é obrigatória em todas as maternidades do Município de São Paulo por fazer parte da Lei 12556 de 08/01/1998, publicado no DOM em 09/01/1998. Segundo a Portaria no 432 14/11/2000, os procedimentos realizados na TAN são de alta complexidade e devem ser cobrados através de APAC, que deve ser preenchida ambulatorialmente, e não no berçário da Instituição. Assim, apesar de ser uma Lei Municipal, os gastos com o presente projeto não foram ressarcidos. A mesma dificuldade foi encontrada por HALL e DAVIS (22) onde não havia fundos governamentais para a aplicação e continuidade do Programa de Triagem Auditiva Neonatal. No presente estudo, uma opção poderia ser a realização da TAN no ambulatório, para que a cobrança pudesse ser realizada; por outro lado, o índice de falta poderia ser alto, como observado nos retestes. O exame poderia, ainda, ser prejudicado pelo barulho externo, e além disso, poderia haver uma sobrecarga das consultas ambulatoriais.

CONCLUSÕES

Os médicos Otorrinolaringologistas devem entender a importância da TAN para a inserção precoce do paciente na Sociedade. É importante que a mesma seja universal para que não haja falhas na detecção da deficiência auditiva. É um Programa que deve ser multidisciplinar com a colaboração dos fonoaudiólogos, pediatras e enfermeiros. Apesar das dificuldades em sua aplicação, deve ser estimulada e realizada em todos os Berçários. A TAN deve ser considerada um passo inicial para o manuseio da perda auditiva, sendo de extrema importância, a partir do diagnóstico, o seu tratamento e a orientação familiar. O diagnóstico da DNS foi realizado em um único paciente deste estudo, na mesma incidência encontrada na literatura.

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