INTRODUÇÃOA rinossinusite alérgica (RA) é uma das principais patologias respiratórias crônicas, pela sua alta prevalência, pela associação com asma e sinusite e pelo impacto na qualidade de vida do portador (1,2,3,4). Trata-se da manifestação local de uma condição sistêmica - a alergia. Cerca de 15% da população mundial apresenta manifestações desta doença (1, 2,4), com incidência mais elevada em pacientes portadores de outras doenças alérgicas, como asma e dermatite atópica. No Brasil, temos que nas cidades do Sul e do Sudeste a prevalência dos sintomas nasais foi maior nos meses de maio a agosto, enquanto nas cidades do Nordeste não houve diferença na prevalência da sintomatologia, segundo os meses do ano (3). A observação de sintomas nasais de rinite, em escolares brasileiros, variou de 19,3 a 47,4% no decorrer International Study of Asthma and Allergies in Childhood (3).
A freqüência de portadores de RA entre os asmáticos pode atingir 80% (4). Há associação com rinossinusites bacterianas, conjuntivites alérgicas e otite média, sendo que o tratamento destas doenças depende do controle adequado da RA (1).
Os pacientes portadores de RA apresentam reação de hipersensibilidade tipo 1, com inflamação persistente da mucosa nasal. Células inflamatórias, como eosinófilos e mastócitos, e mediadores, como quimiocinas e citocinas, participam da fisiopatologia. O padrão de resposta imune desenvolvido pelos pacientes atópicos é do tipo Th2 com produção de citocinas, tais como IL-4, IL-5 e IL-10 (6,7,8,9,10). Linfócitos B de indivíduos previamente sensibilizados, a determinados alérgenos, produzem anticorpos específicos tipo IgE que se ligam a superfície de mastócitos e basófilos através de receptores de alta afinidade para a porção Fc. Após novo contato, o alérgeno se liga na IGE, presente na superfície de mastócitos, promovendo a degranulação dos mesmos, com liberação de histamina, substâncias derivadas de lipídeos (prostaglandina e leucotrienos) e citocinas. Eosinófilos também são recrutados para esse sítio inflamatório e liberam uma proteína catiônica com amplificação da resposta alérgica (11).
A hiperreatividade nasal é manifesta pelo aparecimento de sintomas como: rinorréia hialina, prurido e obstrução nasal, que podem regredir espontaneamente ou com tratamento adequado (7). Há relação dos sintomas, acima descritos, com a exposição a determinados alérgenos. Entre esses os mais comuns, no nosso meio, são: ácaros da poeira domiciliar, antígenos de barata, fungos, epitélio de animais e polens.
A duração dos sintomas a rinite determina uma classificação desta em: persistente - mais de quatro dias por semana ou mais de quatro semanas - ou intermitente - menos de quatro dias por semana ou menos de quatro semanas.
Existe ainda a classificação considerando a gravidade dos sintomas: leve, moderada e grave, a depender da influência no sono e nas atividades diárias (12). Os achados de exame físico são inespecíficos e incluem palidez de mucosa e hipertrofia de cornetos inferiores, ou aqueles relacionados às doenças associadas, como: sinusites e otites.
O diagnóstico é clínico, mas pode envolver testes laboratoriais para detecção de IgE livre ou ligada a célula. Os testes cutâneos específicos para alérgenos inalatórios constituem um importante instrumento para confirmação da rinite alérgica e para detecção dos alérgenos mais envolvidos na patogênese da doença, além de programação de tratamento imunoterápico específico (12). A detecção de IgE específica também pode ser realizada in vitro, através de testes séricos de RAST.
O tratamento da rinite alérgica envolve, além do controle ambiental, o uso de medicações que previnem a degranulação de mastócitos e modulam a resposta imune (12). Pacientes submetidos a tratamento com corticosteróides ou imunoterápicos tem mudança no padrão de resposta imune de Th2 para Th1, com aumento de produção de interferon-gama (9).
OBJETIVOAvaliar grupo de pacientes com queixa espontânea de rinossinusite alérgica de acordo com: sintomas mais freqüentemente referidos, sinais observados em exame vídeo-endoscópico, positividade dos testes de hipersensibilidade cutânea e associação com broncoespasmo.
CASUÍSTICA E MÉTODOO total de pacientes do trabalho foi de 45, destes foram selecionados 39 pacientes, entre 10-35 anos, com queixa espontânea de rinossinusite alérgica, inflamação da mucosa nasal e, ao menos um dos sintomas seguintes: congestão nasal, hiposmia, rinorréia, espirros ou prurido; conforme preconizado no II Consenso Brasileiro sobre Rinites (3).
Foi realizado questionário clínico sobre o histórico da patologia e os principais sintomas apresentados. O antecedente de broncoespasmo foi avaliado através de questionário sobre avaliação médica provocada por queixa respiratória. Foram realizados ainda exames clínicos otorrinolaringológicos completos e vídeo endoscopia naso-sinusal, em todos os pacientes, realizados pelo mesmo profissional, com mais de 5 anos de experiência.
Todos os pacientes foram submetidos a testes de hipersensibilidade cutânea, realizados pelo mesmo profissional, com mais de 5 anos de experiência. Os antígenos testados foram: tabaco, gramíneas, ácaros da poeira domiciliar, epitélio de cão e de gato, fungos, flores e lã,utilizando-se o prick test
R. O teste foi realizado colocando-se 1 gota de cada alérgeno no antebraço do paciente, seguido de punctura local. O controle positivo foi realizado com histamina e o negativo com o diluente da bateria escolhida; neste caso utilizamos a bateria da FDA. A leitura foi realizada após 15 minutos, através das medidas dos diâmetros ortogonais da pápula surgida. O resultado foi considerado positivo quando houve induração, no ponto de inoculação de um alérgeno testado, com diâmetro maior ou igual a 3mm.
O critério de exclusão foi a não realização de todos os exames no serviço credenciado, com os critérios já citados. Todos os pacientes relacionados assinaram termo de ciência e consentimento esclarecido e a pesquisa foi previamente analisada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, em novembro de 2004, CAAE - 0022.0.057.000-04.
RESULTADOSOs principais sintomas referidos pelos pacientes, em resposta ao questionamento do investigador, foram: prurido nasal (96,5%), obstrução nasal (93%), espirros (93%), rinorréia hialina (82,7%), prurido faríngeo (65,5%), prurido ocular (62%) e lacrimejamento (55%) (Gráfico 1).
Gráfico 1.
Quando questionados sobre passado de broncoespasmo, 14% dos pacientes confirmaram ter apresentado 1 ou mais eventos de broncoespasmo, contra 86% que referiram nunca ter apresentado um episódio (Gráfico 2).
Gráfico 2.
Submetidos à avaliação rinoscópica externa e a vídeo-endoscopia naso-sinusal, os principais achados obtidos foram: hipertrofia de cornetos inferiores (69%) (Figura 1), palidez mucosa (65,5%), desvio septal (41,3%) e hipertrofia de cornetos médios (11%).
Figura 1. Desvio septal - Pontos pretos - esporão septal encostando no corneto médio.
Na última etapa de avaliação destes pacientes realizamos o prick test
R. Os resultados foram avaliados de acordo com os critérios já descritos. A resposta positiva do teste cutâneo foi obtida em 73% dos pacientes, enquanto a resposta negativa ao teste cutâneo foi observada em 27% dos pacientes que procuraram o serviço de otorrinolaringologia, com queixas compatíveis com rinossinusite alérgica, de acordo com o II Consenso Brasileiro sobre Rinites (Gráfico 3).
Gráfico 3.
Os principais alérgenos que sensibilizaram os pacientes com queixa de rinite foram: ácaros da poeira domiciliar (54 %), epitélio de gato (34,6%), epitélio de cão (27%), tabaco (23%), lã (19,2%), fungos do ar (19,2%), capim (19,2%), flores (7%) e gramíneas (7%) (Gráfico 4).
Gráfico 4.
DISCUSSÃOO paciente portador de queixas compatíveis com o quadro de rinossinusite alérgica tem sinais e sintomas que variam em freqüência de apresentação, de acordo com o ambiente em que vivem e a época do ano. Em locais de clima temperado, com sazonalidade mais definida, os paciente apresentam sintomas mais intensos de obstrução e coriza nos invernos rigorosos e na primavera, época de polinização. Nos climas tropicais e equatorianos a maior umidade facilita a colonização fúngica do ambiente e pode predispor a manifestações alérgicas mais intensas durante as estações chuvosas. As manifestações observadas variam, de forma idiossincrásica, de acordo com temperatura, higiene ambiental e de acordo com o genótipo do paciente.
O trabalho apresenta as manifestações mais prevalentes em pacientes moradores de localidade com clima tropical e que pouco diferiram das manifestações apresentadas em trabalhos realizados em países de clima temperado, no que diz respeito ao tipo de queixa, mas não foi objeto de nosso estudo a pergunta sobre intensidade e freqüência dos sintomas.
Figura 2. Hipertrofia de corneto inferior - Ponto preto único-septo nasal Ponto preto triplo: hipertrofia do corneto inferior, ocupando mais que 75% da área respiratória.
Observamos a associação entre o teste de sensibilização cutânea e a queixa de rinite alérgica, e o resultado foi de 73% de correlação, o que está de acordo com a literatura, que apresenta correlação positiva entre 60- 70% dos pacientes. A freqüência de alérgenos sensibilizantes também foi semelhante, mostrando uma maior prevalência para os ácaros da poeira domiciliar.
Importante frisar a positividade do tabaco nos testes alérgicos (23%), uma vez que esta substância não leva a uma resposta IgE-mediada, sugerindo reação de irritação primária na pele e não positividade de teste cutâneo. Finalmente, observou-se também a baixa freqüência de queixas de manifestações de broncoespasmo em pacientes portadores de rinite alérgica, 14%. Esta observação é interessante, pois, nos trabalhos que abordam os portadores de broncoespasmo, a freqüência de queixa de rinite alérgica foi exponencialmente maior, entre 80 e 100% (4-13). Este dado poderia ser avaliado como se o broncoespasmo pudesse representar uma doença mais avançada e sistêmica, em relação à rinite, e com isso, os pacientes que desenvolveriam broncoespasmo, antes já teriam apresentados episódios mais brandos em outros sítios, como a rinite ou a dermatite. As manifestações observadas variam de forma idiossincrásica de acordo com temperatura, higiene ambiental e de acordo com o genótipo do paciente (12-15).
CONCLUSÃOAs manifestações otorrinolaringológicas de rinite alérgica não foram diferentes das observadas na literatura e no consenso. Os resultados dos exames dependem da técnica utilizada, interpretação correta dos mesmos e da qualidade do equipamento utilizado. Particularmente nos achados dos testes cutâneos, contamos ainda com variações nos resultados relacionados com a escolha dos antígenos e da marca dos extratos em estudo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS1. Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, ARIA Workshop Group World Health Organization. Allergic rhinitis and its impact on asthma initiative. A pocket guide for physicians and nurses. Merck & Co., Inc., 2001.
2. American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. The allergy report. Milwaukee, WI: The American Academy of Allergy, Asthma & Immunology, Inc., 2000.
3. Solé D, Weckx LLM, Filho NAR, Júnior JFM, et al. II Consenso Brasileiro sobre Rinites 2006. Rev. bras. alerg. Imunopatol 2006; 29(1):29-58.
4. Wang DY, Clement P. Pathogenetic mechanisms underlying the clinical symptoms of allergic rhinitis. Am J Rhinol 2000; 14:325-33.
5. Leynaert B, Neukirch F, Demoly P, Bousquet J. Epidemiologic evidence for asthma and rhinitis comorbidity. J Allergy Clin Immunol 2000; 106:S 201-5.
6. Benson M, Strannegard IL, Wennergren G, Strannegard O. Interleukin-5 and interleukin-8 in relation to eosinophils and neutrophils in nasal fluids from school children with seasonal allergic rhinitis. Pediatr Allergy Immunol 1999; 10:178-85.
7. Mygind N, ed. Allergic and nonallergic rhinitis clinical aspects. Philadelphia: Saunders, PA, 1993.
8. Naclerio RM, Proud D, Togias AG, et al. Inflammatory mediators in late antigen- induced rhinitis. N Engl J Med 1985; 313:65-70.
9. Bascom R, PipkornU, Lichtenstein LM, Naclerio RM. The infux of inflammatory cells into nasal washings during late response to antigen challenge: effect of corticosteroid pretreatment. Am Rev Respir Dis 1988; 138:406-412.
10. Bradding P, Feather IH, Wilson S, et al. Immunolocalization of cytokines in the nasal mucosa of normal and perennial rhinitis subjects. J Immunol 1993; 151:3853-3865.
11. Durham SR, Sun Ying M, Varney VA,et al. Cytokine messenger RNA expression for IL-3, IL-4, IL-5 nad granulocyte/ macrophage- cloning- stimulating factor in the nasal mucosal after local allergen provocation : relationship to tissue eosinophilia. J Immunol 1992; 148:2390-2394.
12. Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, ARIA Workshop Group, World Health Organization (WHO). Allergic Rhinitis and its Impact on Asthma. J Allergy Clin Immunol 2001; 108 (Suppl): S147-S334.
13. Bousquet J, Vignola AM, Demoly P. Links between rhinitis and asthma; Allergy. 2003 Aug;58(8):691-706
14. Rosenwasser L. New insights into the pathophysiology of allergic rhinitis Allergy Asthma Proc. 2007 Jan-Feb;28(1):10-5
15. Ramsey CD, Gold DR, Litonjua AA, et al. Respiratory illnesses in early life and asthma and atopy in childhood. : J Allergy Clin Immunol. 2007 Jan;119(1):150-6.
16. Yuen AP, Cheung S,Tang KC. et al. The skin prick test results of 977 patients suffering from chronic rhinitis in Hong Kong. Hong Kong Med J. 2007 Apr;13(2):131-6.
1. Especialista em Otorrinolaringologia e em Medicina Legal. Professor Assistente de Cirurgia Cérvico- Facial da Disciplina de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico- Facial da Santa Casa da Bahia, Hospital santa Izabel; e Professor Titular de Anantomia Cérvico - Facial da UNIME - BA.
2. Doutor em Otorrinolaringologia pela USP. Chefe da Disciplina de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial da Santa Casa de Saúde da Bahia, Hospital Santa Izabel.
3. Mestre em Patologia pela Fio Cruz/ UFBa. Professora Assistente da Disciplinade de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico- Facial da Santa Casa de Saúde da Bahia, Hospital Santa Izabel.
4. Especialista em Otorrinolaringologia pela Santa Casa de Saúde da Bahia, especialista em Imunologia pela USP. Alergologista e Imunologista da Alergon.
Instituição: Santa Casa de Misericórdia da Bahia.
Endereço para correspondência:
Adriano Santana Fonseca
Rua das Patativas, 43 - Apto 1004 - Imbui
Salvador/BA - CEP 41720-100