INTRODUÇÃOAs complicações intracranianas (CIC) das rinossinusites são a extensão do processo infeccioso para estruturas adjacentes, ocorrendo em um pequeno, mas significante número de pacientes. Dentre as de origem nasossinusal são citadas empiema subdural, abscesso cerebral, meningite e abscesso extradural como as formas mais comumente encontradas (1).
Os empiemas, dentre as CIC, podem se apresentar desde simples cefaléia até manifestações mais graves como hemiparesias, convulsões e alterações de consciência. O diagnóstico dessa afecção é baseado na suspeita clínica, associada a exames de imagem, sendo a tomografia computadorizada (TC) o primeiro exame na abordagem desses pacientes. No entanto, a ressonância magnética (RM) permanece o padrão ouro para o diagnóstico de qualquer CIC (2).
O tratamento dessa complicação é baseado em antibioticoterapia de amplo espectro associada, na maioria dos casos, à abordagem cirúrgica tanto otorrinolaringológica quanto neurológica.
O objetivo deste trabalho é relatar o caso de um paciente com empiema subdural decorrente de rinossinusite, que evoluiu favoravelmente com o tratamento clínico e cirúrgico preconizado.
APRESENTAÇÃO DO CASO CLÍNICOPaciente com 13 anos de idade, sexo masculino, branco, previamente hígido, com história de 40 dias com cefaléia frontal direita, de forte intensidade, contínua, associado à febre e vômitos. Em exame clínico inicial, apresentava-se em regular estado geral, febril e com rigidez de nuca, evoluindo com crise convulsiva tônico-clônica generalizada. Iniciou-se tratamento com antibio¬ti¬cote¬rapia de amplo espectro (ceftriaxone, vancomina, e metronidazol), corticoterapia (dexametasona) e anticonvulsivante (fenitoína).
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Figura 1. Tomografia computadorizada de seios paranasais em corte coronal, evidenciando velamento de seio maxilar direito e seios etmoidais bilateral (asteriscos)
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Figura 2. Tomografia computadorizada de seios paranasais em corte axial demonstrando velamento de seio maxilar direito (asterisco)
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Figura 3. Tomografia computadorizada de crânio em corte axial com imagem hipocaptante (empiema) em lobo frontal a direita (asterisco).
A avaliação otorrinolaringológica evidenciou secreção purulenta bilateral á rinoscopia anterior, drenagem pós-nasal á oroscopia, com otoscopia e resposta dos nervos cranianos normais. As tomografias de crânio, de cavidade nasal e de seios paranasais evidenciaram empiema subdural direito e interhemisférico, sinais de processo inflamatório em lobo frontal, e velamento de seios maxilar direito, etmoidal e esfenoidal bilateral (Figuras 1, 2 e 3). Optou-se pela realização de antrostomia, etmoidectomia e esfenoidectomia bilateral, e drenagem do seio frontal do lado acometido por via endoscópica, utilizando-se óticas de 0o, 30o, 45o, associada à drenagem do empiema por craniotomia frontal. Durante o procedimento, observou-se intenso edema da mucosa nasal e bloqueio dos complexos óstio-meatais bilaterais, com drenagem de secreção purulenta após a abertura dos mesmos. Foi coletado material para cultura de bactérias aeróbias, anaeróbias e fungos, não havendo crescimento de microrganismos após período preconizado.
Não ocorreram intercorrências no pós-operatório e o paciente evoluiu com melhora do estado geral. A medicação inicial foi mantida por cinco semanas até a alta, havendo resolução completa do quadro, sem seqüelas.
DISCUSSÃOOs empiemas subdurais devido à sinusopatia, apesar de pouco freqüentes, continuam presentes nos dias de hoje, sendo mais comuns em pacientes do sexo masculino abaixo dos 20 anos de idade (3;4). É postulado que isso aconteça devido ao aumento máximo da vascularização do sistema diplóico e ao desenvolvimento do sistema frontal que ocorrem entre os 7 e 20 anos (5). Dados observados neste trabalho.
O acometimento intracraniano decorrente das rinossinusites pode ocorrer por via hematogênica, por tromboflebite retrógrada de veias que interligam os seios da face e do crânio, ou por contigüidade devido à extensão direta por deiscências traumáticas ou congênitas, erosão da parede sinusal e forames existentes (4;5).
Grande variedade de microrganismos foi descrita como agentes etiológicos desta complicação, podendo-se citar uma predominância de Staphylococcus aureus, Strepcoccus sp., Haemophylos influenzae e outros gram-negativos e anaeróbios. No entanto, foi observado que até 50% das culturas podem ser estéreis, provavelmente devido ao fato dos pacientes já se encontrarem em tratamento antibioticoterapico prévio à coleta (1;4;6). A cultura da secreção no caso relatado não demonstrou crescimento de nenhum microrganismo.
Os sinais e sintomas mais comumente presentes são cefaléia, febre, vômitos, alterações da consciência, hemiparesia e convulsões (1;3). Deve-se estar atento a pacientes que mesmo com tratamento inicial adequado evoluem mal com persistência de febre e de cefaléia, ou ainda, que passem a apresentar manifestações neurológicas (4). O diagnóstico do empiema subdural, assim como de outras CIC, é baseado primeiramente na suspeita e julgamento clínico.
A TC é a modalidade diagnóstica de escolha quando há sua suspeita, ou quando a cirurgia passa a ser considerada. No entanto, em determinados casos a TC pode apresentar resultados falso negativos. Desta forma, permanecendo a suspeita clínica esta deve ser repetida após 24 horas, ou ainda, optar-se pela realização de Ressonância Magnética (RM), que é o padrão ouro para o diagnóstico (2). O exame tomográfico contrastado foi o realizado neste caso, confirmando o diagnóstico e fornecendo dados essenciais ao procedimento cirúrgico realizado.
O tratamento dos empiemas subdurais decorrentes das rinossinusites é baseado, inicialmente, em antibioticoterapia de amplo espectro, com associação de cefalosporina de terceira geração, metronidazol e vancomicina, sendo revista após os resultados de culturas das secreções obtidas durante o ato cirúrgico, e em geral mantidas por quatro a oito semanas, devido à redução da penetração dos antibióticos no sistema nervoso central no decorrer do tratamento (1;4;6). No caso reportado, a antibioticoterapia foi iniciada precocemente e mantida por cinco semanas após o procedimento cirúrgico.
O tratamento cirúrgico consiste em abordagem neurocirúrgica e otorrinolaringológica. Craniotomia com drenagem da coleção intracraniana, associada à cirurgia endoscópica dos seios paranasais tem sido realizada com bons resultados (5). No caso relatado, a antrostomia associada a etmoidectomia e esfenoidectomia bilateral, e a drenagem do seio frontal, foram os procedimentos adotados, obtendo-se drenagem da secreção acumulada e ventilação satisfatória da cavidade nasal e seios paranasais acometidos, com bons resultados. No mesmo procedimento, foi realizada pela equipe de neurocirurgia, a craniotomia frontal, obtendo-se boa evolução no pós-operatório.
CONCLUSÕESO empiema subdural é uma complicação intracraniana das rinossinusites pouco freqüente e de alta mortalidade devendo ser encarada como urgência. Frente à sua suspeita clínica, a TC permanece como o primeiro exame complementar na investigação diagnóstica, podendo, no entanto, falhar em fase inicial, sendo, a RM o padrão ouro no diagnóstico de qualquer CIC, devendo ser realizada na persistência da dúvida. O tratamento é baseado em antibioticoterapia de amplo espectro por tempo prolon¬gado, associado à abordagem cirúrgica otorrinolarin¬gológica e neurológica com bom prognóstico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1. Jones NS, Walter JL, Bassi S, Jones T, Punt J. The intracranial complications of rhinosinusitis: Can they be prevented? Laryngoscope 2002; 112:59-63.
2. Younis RT, Anand V, Davidson B. The role of computed tomography and magnetic resonanse imaging in patients with sinusitis with complications. Laryngoscope 2002; 112: 224-9.
3. Góis CRT, Pereira CU, DÁvila JS, Melo VA. Complicações Intracranianas das Rinossinusites. @rquivos 2005; 9:335-43.
4. Penido NO, Borin A, Pedroso JS, Pessuto JMS. Complicações Intracranianas Sinusais. Rev. Bras. Otorrinol. 2001; 67: 36-41.
5. Fountas KN, Duwayri Y, Kapsalaki E, Dimopoulos VG, Johnston KW, Peppard SB, Robinson JS . Epidural Intracranial Abscess. Southern Medical J 2004; 97: 278-83.
6. Penido NO, Borin A, Fukuda Y. Necessidade de avaliação e conduta otorrinolaringológica nos pacientes portadores de abscessos e empiemas encefálicos. Rev Bras Otorrinol 2001; 68:794-99.
1 Médico Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do HSPM de São Paulo.
2 Médico (a) Assistente do Serviço de Otorrinolaringologia do HSPM de São Paulo.
3 Doutora em Ciências pelo Programa de Pós-graduação em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade de São Paulo - USP. Médica Assistente do Serviço de Otorrinolaringologia do HSPM de São Paulo e da Derdic/PUCSP.
Instituição: Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital do Servidor Público Municipal (HSPM) de São Paulo.
Endereço para correspondência: Fernando Martinez Belentani - Rua Tamandaré, 734 - Apto, 133 - Bairro Liberdade - São Paulo / SP - CEP 01525-000 - Telefone: (11) 3209-4283 / (11) 8502-1162 - E-mail: ferbelentani@hotmail.com
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da R@IO em 17 de janeiro de 2007. Cod. 209. Artigo aceito em 7 de outubro de 2007.