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Ano: 2008  Vol. 12   Num. 4  - Out/Dez Print:
Case Report
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Mixoma do Tecido Mole Cervical: Relato de Caso e Revisão da Literatura
Myxoma of Cervical Soft Tissue: Case Report and Literature Review
Author(s):
Giulianno Molina de Melo1, Tiago Vieira Tavares2, Thomaz Antonio Fleury Curado2, Giancarlo Bonotto Cherobin2, Gabrielle do N. Holanda Gonçalves2, Cristiane M. de F. Ribeiro3
Palavras-chave:
mixoma, neoplasias de tecido conjuntivo
Resumo:

Introdução: Mixomas são tumores mesenquimais benignos que ocorrem raramente na região da cabeça e do pescoço. A maioria das lesões é de origem odontogênica e envolvem os ossos da face. Mixomas do tecido mole são muito raros e amplamente distribuídos pelo corpo, sendo mais freqüentemente relatados na musculatura cardíaca. Objetivo: Descrever um raro caso de mixoma do tecido mole extramuscular em região submandibular esquerda. Relato do Caso: Paciente do sexo masculino portador de mixoma extramuscular em loja submandibular esquerda, inicialmente conduzido como um cisto branquial. O tratamento consistiu na excisão cirúrgica com margens adequadas e posterior confirmação histológica do mixoma. Conclusões: A ressecção com margens adequadas é o tratamento de escolha para evitarem recidivas e o seguimento ambulatorial deve rigoroso.

INTRODUÇÃO

O termo mixoma foi inicialmente descrito por Virchow (1) em 1871, quando ele observou tumores que histologicamente parecia-se com tecido mucinoso do cordão umbilical. Em 1948, Stout (2) relatou 49 pacientes com mixoma e estabeleceu um critério para o diagnóstico: uma neoplasia mesenquimal verdadeira, constituída exclusivamente de células estreladas indiferenciadas num estroma mucóide frouxo que não dão metástases. Desde então, mixomas são vistos como raros e localmente infiltrativos tumores benignos do tecido conectivo, surgindo tanto no osso como em tecidos moles.

Na região da cabeça e do pescoço, mixomas ocorrem normalmente na mandíbula, maxilar e tecidos moles da face (3). Mixomas do tecido mole extramuscular em região cervical são raros, e apenas alguns casos estão descritos na literatura inglesa (4).

Este relato tem por objetivo apresentar um caso de mixoma extramuscular cervical e a revisão de literatura.


RELATO DO CASO

Um paciente do gênero masculino, branco, com 65 anos de idade, etilista e tabagista, procurou nosso serviço em Abril 2004 com história de tumoração em região cervical esquerda há quatro anos, com crescimento progressivo. No exame físico apresentava nódulo cístico e único em região submandibular esquerda, com aproximadamente 5,0 cm de diâmetro. Este se encontrava móvel, indolor à palpação e sem sinais flogísticos. Não se observaram linfonodomegalias cervicais. O restante do exame físico (oroscopia, laringoscopia indireta e palpação da glândula tireóide) apresentou-se dentro da normalidade.

A tomografia computadorizada do pescoço constatou formação ovular cística, com 4,2 cm de diâmetro, localizada em loja submandibular esquerda com projeção para loja amigdaliana (Figura 1). A punção aspirativa com agulha fina (PAAF) guiada por ultra-sonografia revelou ausência de células neoplásicas. A hipótese diagnóstica de cisto branquial foi então aventada, descartando-se, portanto, a metástase de carcinoma espinocelular ou metástase de carcinoma de glândula tireóide. O tratamento consistiu na excisão cirúrgica da massa, com margens consideradas amplas para a ressecção de cisto branquial, sem ruptura durante a excisão.


Figura 1. Mixoma do Tecido Mole Cervical - Tomografia Computadorizada do Pescoço com lesão cística submandibular esquerda.



A lesão foi enviada para análise macroscópica, que evidenciou peça ovóide, com 5,0 g de peso, 6,0 x 4,0 x 2,0 cm de medida, e superfície parcialmente recoberta por tecido carnoso. Aos cortes, destacou-se nódulo com 5,5 cm de diâmetro, com área central cística preenchida por material gelatinoso incolor. O restante do nódulo era mole e acinzentado. Foram realizados cortes seqüenciais pelas técnicas habituais de inclusão em parafina e coloração. O estudo histológico demonstrou tumor mesenquimal, com proliferação de células fusiformes sem atipias, em meio a abundante material mucóide, preenchendo os critérios de diagnóstico do mixoma (5) (Figuras 2 e 3).


Figura 2. Histologia do Mixoma - Neoplasia Mesenquimal com abundante colóide em meio à proliferação de células fusiformes.


Figura 3. Histologia do Mixoma - Neoplasia Mesenquimal com proliferação de células fusiformes sem atipias.



O paciente evoluiu sem intercorrências no pós-operatório, tendo alta hospitalar no dia seguinte e segue em acompanhamento ambulatorial para realização do exame físico e radiológico com tomografia computadorizada, inicialmente no período de seis em seis meses durante dois anos e a seguir anualmente com exames, sem evidência de recidiva no seguimento de quatro anos até o momento.


DISCUSSÃO

A etiologia do mixoma permanece desconhecida. A maioria dos autores concorda que os mixomas são derivados de um mesênquima embrionário primitivo ou fibroblastos que possuem a capacidade de produzir mucopolissacarídeos em abundância (6). Seu local de aparecimento mais comum no organismo é o coração, seguido pelos mixomas de coxa e de ombro (7).

Na região da cabeça e pescoço, os mixomas originam-se normalmente nos ossos (61%), especialmente mandíbula e maxila, e são mais comuns na população adulta (3). Mixomas do tecido mole são encontrados em várias partes do organismo, e podem ser divididos em: mixoma intramuscular, mixoma justa articular, angiomixoma superficial, angiomixoma agressivo e neurotecoma (mixoma da bainha nervosa) (8). O mixoma intramuscular ocorre geralmente em mulheres de meia idade e são localizados comumente nos músculos da coxa, ombros, região glútea e membros superiores (5).

O mixoma justa articular histologicamente se parece com o intramuscular, mas compromete tendões periarticulares, ligamentos, articulações, músculos e tecido subcutâneo dos adultos (8). O angiomixoma superficial, também conhecido como mixoma cutâneo, ocorre em todas as idades, com pequena predisposição para a terceira e quarta décadas de vida e surge comumente no tronco, membros inferiores e região da cabeça e do pescoço.

Já o angiomixoma agressivo normalmente afeta a pelve e o períneo, sendo sete vezes mais freqüente no sexo feminino, com taxa de recorrência atingindo cerca de 50% dos casos (8). O neurotecoma ocorre mais freqüentemente nas extremidades superiores e região da cabeça e pescoço de mulheres jovens (9).

No tecido ósseo ou no tecido mole, mixomas são usualmente identificados no intraoperatório como uma massa gelatinosa, de formato oval ou esférico, aparência mucóide e consistência variável (3). Normalmente sua cápsula fibrosa é incompleta e infiltra-se nos tecidos adjacentes. A histopatologia revela células estreladas com citoplasma eosinofílico e núcleo pequeno. Estas são separadas por um abundante estroma extracelular mucóide, que pode ser vacuolarizado e apresentar mudança cística (5).

O diagnóstico diferencial do mixoma extramuscular em região cervical deve ser feito com tumores císticos mais comuns do pescoço, como o cisto branquial, a laringocele, metástase cística de carcinoma espinocelular e metástase cística de carcinoma papilífero da tireóide.

O tratamento de escolha deve ser a excisão cirúrgica com margens livres, evitando-se dessa forma recidivas. Presume-se que parte da dificuldade na erradicação do tumor baseia-se na pobre definição de suas margens (3). O tratamento conservador é indicado apenas em lesões próximas a estruturas vitais, especialmente em paciente jovens. Outros tipos de tratamento foram propostos (enucleação, curetagem, radioterapia), mas com altos índices de recidiva e posterior ressecção cirúrgica ampla.

O paciente deste relato apresenta-se até o momento sem evidência de recidivas pelos exames de imagem e exame físico de controle.


CONCLUSÃO

O mixoma do tecido mole extramuscular em região cervical é uma neoplasia benigna rara, de natureza infiltrativa, cujo diagnóstico é realizado após análise histopatológica. O tratamento de escolha deve ser a retirada cirúrgica com margens amplas, evitando-se desta forma recidivas e o seguimento ambulatorial rigoroso.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Virchow R. Die cellularpathologie in ihrer Beegrundung auf physiologische and pathologische Gewebelehre. Berlin, Germany, Verlag von August Hirschwald. 1871, 563.

2. Stout AP. Myxoma, the tumor of primitive mesenchyme. Ann Surg. 1948, 127:706-719.

3. Andrews T, Kountakisse, Maillard AA. Myxomas of the head and neck. Am J Otolariyngol. 2000, 21:184-9.

4. Galera-Ruiz H, Martin-Gomez R, Esteban-Ortega F, Congregado-Loscertales M, Garcia Escudero A. Extramuscular soft-tissue myxoma of the lateral neck. Rev Laryngol Otol Rhinol. 2001, 122:259-61.

5. Fletcher CDM, Unni KK, Mertens F (Eds). World Health Organization Classification of Tumors. Pathology and Genetics of tumors of Soft tissue and Bone. IARC Press: Lyon, 2002.

6. Enziger FM. Intramuscular myxoma. Am J Chin Pathol. 1965, 43:104-13.

7. Ghosh BC, Huvos AG, Gerald FP, et al. Myxoma of the jawbones. Cancer. 1973, 3:237-40.

8. Allen PW. Myxoma is not a single entity: a review of the concept of myxoma. Ann Diagn Pathol. 2000, 4:99-123.

9. Papadopoulos EJ, Cohen PR, Hebert AA. Neurothekoma: report of a case in an infant and review of the literature. J Am Acad Dermatol. 2004, 50:129-34.













1. Mestrado-FMUSP; TCBC-SP. Assistente Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
2. Residente de Otorrinolaringologia do Serviço de Otorrinolaringologia "Ivan Fairbanks Barbosa" do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
3. Patologista do Centro Integrado de Patologia - Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo.

Instituição: Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo. São Paulo/SP - Brasil.

Endereço para correspondência:
Giulianno Molina de Melo
Rua Dr. Luis Migliano 761, Apto 84-B - Morumbi
São Paulo / SP - Brasil - CEP: 05711-001
Fax: (+55 11) 3683-2401 e 3283-4591
E-mail: giulianno_molina@hotmail.com

Artigo recebido em 16 de Novembro de 2007.
Artigo aprovado em 3 de Julho de 2008.
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