INTRODUÇÃOO rinoscleroma é uma doença nasal granulomatosa rara, causada pela bactéria
klebsiella rhinoscleromatis. O nariz representa a região primária de ocorrência (1), podendo se estender ao palato, laringe e pulmão (2). O exame histológico possibilita a identificação das células de Mickulicz, as quais constituem macrófagos que fagocitaram os bacilos gram negativos, sendo elas um achado clássico (1). O linfoma não-Hodgkin nasal é uma neoplasia maligna, podendo ser do tipo T ou B quando acomete a região nasal. O tratamento é feito por meio da radioterapia e, dependendo da invasão e estadiamento, podendo se associar à quimioterapia. O rinoscleroma e o linfoma não-Hodgkin nasal apresentam como principal sintoma a obstrução nasal (2,3), e fazem parte do diagnóstico diferencial das granulomatoses nasais. O diagnóstico é sugerido pelo anatomopatológico e confirmado pela imunohistoquímica (2). A associação destas duas patologias em um mesmo paciente é aqui relata.
RELATO DO CASOPaciente M.C.T., feminino, 49 anos, cor branca, atendida pelo serviço de otorrinolaringologia apresentando obstrução nasal progressiva há um mês. À rinoscopia, evidenciava-se lesão papilomatosa em meato médio esquerdo, crostas e secreção purulenta sem necrose. A tomografia computadorizada evidenciava espessamento mucoso de seio etmoidal e tumoração sugerindo pólipo no meato médio esquerdo e cavidade nasal. O estudo anatomopatológico da lesão do meato médio foi sugestivo de linfoma não-Hodgkin. Entretanto, após estudo imunohistoquímico, os marcadores para linfoma foram negativos e o marcador para rinoscleroma, histiócito CD 68, foi positivo. Instituiu-se imediatamente tratamento para rinoscleroma com a utilização de sulfametoxazol-trimetoprim. Após quatro meses, houve expressiva regressão da lesão, permanecendo atrofia mucosa e crostas. Após oito meses de tratamento antibioticoterápico, a tomografia computadorizada era compatível com rinossinusite crônica. A paciente encontrava-se assintomática e a rinoscopia era normal. Suspensa a antibioticoterapia, a paciente foi considerada curada do rinoscleroma. Após dez meses do quadro inicial, dois meses após suspensão do tratamento, a paciente apresentou os mesmos sintomas e lesão em meato médio esquerdo. Foi reintroduzido o antibiótico e solicitado novo estudo anatomopatológico. Contudo, após três dias, ocorreu aumento agressivo da lesão com abaulamento difuso de pirâmide nasal, necrose, edema periorbital bilateral, jugal e lábios (Figura 1). A tomografia computadorizada revelou preenchimento de todos os seios paranasais e cavidade nasal por tecido de partes moles (Figuras 2 e 3). O estudo anatomopatológico foi sugestivo de linfoma não-Hodgkin, com várias áreas de necrose. Em seguida efetuou-se o estudo imunohistoquímico, com positividade para os marcadores de linfoma não-Hodgkin CD45RO (células T). Paciente foi, então, submetida à radioterapia e poliquimioterapia (ciclofosfamina, vincristina, prednisona), tendo permanecido sem sinais de recidiva do tumor aproximadamente por quatro anos (Figura 4).
![](imagesFORL/13-01-16-fig01.jpg)
Figura 1. Paciente quando do diagnóstico de linfoma não-Hodgkin nasal, evidenciando acometimento da pirâmide nasal e edema facial.
![](imagesFORL/13-01-16-fig02.jpg)
Figura 2. Tomografia computadorizada evidenciando preenchimento da cavidade nasal e seios paranasais(asteriscos) com material de densidade de partes moles.
![](imagesFORL/13-01-16-fig03.jpg)
Figura 3. Tomografia computadorizada demonstrando preenchimento da cavidade nasal(asteriscos) com material de densidade de partes moles.
![](imagesFORL/13-01-16-fig04.jpg)
Figura 4. Paciente após tratamento radioterápico e quimioterápico.
DISCUSSÃOO rinoscleroma é uma doença granulomatosa rara, cujo diagnóstico é baseado na bacterioscopia, cultura, anatomopatológico, imunohistoquímica (2,4) e imunoperoxidase nos casos duvidosos. Assim como o linfoma não-Hodgkin, ambas dever ser excluídas frente a uma lesão nasal incerta. A dificuldade do diagnóstico diferencial entre linfoma nasal e rinoscleroma, ao histopatológico, foi descrita em criança (5). Tal dificuldade ocorreu no caso desta paciente, havendo a necessidade de se proceder ao exame de imunohistoquímica para elucidação. A ocorrência do rinoscleroma em associação com outras doenças já foi descrita. Sehani et al (1998) descreveram dois casos de tumor nasal se estendendo para seios paranasais, sugerindo rinosporidiose, tendo o anatomopatológico revelado tratar-se de rinoscleroma (células de Mikulicz) e rinosporidiose (esporângio) (6).
O linfoma não-Hodgkin nasal corresponde a 0.17-2% dos linfomas não-Hodgkin (3). Dois fatores são importantes para o prognóstico: o estágio da doença e a extensão paranasal (3). Os linfomas nasais tipo histológico T têm pior prognóstico que os B. A paciente apresentou linfoma não-Hodgkin de células T com extensão paranasal, um tipo mais agressivo, com evolução rápida. Os tumores tipo T/NK, chamados angiocêntricos, apresentam invasão vascular e alto grau de necrose, sugerindo que no primeiro momento a paciente não apresentava linfoma, já que a necrose só foi observada dez meses depois, na segunda lesão. O rinoscleroma e o linfoma não-Hodgkin nasal são raros, sendo fundamental o diagnóstico precoce. A realização inicial do anatomopatológico e imunohistoquímica, no caso, direcionou o tratamento correto nas duas ocasiões com a certeza de que se tratava de duas entidades associadas, e não recidiva da mesma.
COMENTÁRIOSA paciente realizou anatomopatológico e imunohistoquímica, possibilitando o diagnóstico precoce, tratamento adequado e prognóstico favorável, ressaltado a importância da imunohistoquímica no diagnóstico diferencial. Nesse caso, as doenças não foram sincrônicas, pois o primeiro exame não foi conclusivo para linfoma nasal e o tempo decorrido entre a remissão da lesão e o novo quadro foi longo para se considerar coexistência do linfoma ao rinoscleroma inicial. A paciente apresentou diagnóstico de linfoma não-Hodgkin de células T com extensão paranasal, o tipo mais agressivo e com rápida evolução. Assim, é improvável que ela apresentasse esta doença na ocasião do primeiro diagnóstico. A lesão decorrente do rinoscleroma desapareceu com antibióticos e a paciente permaneceu bem por dez meses. Posteriormente, faleceu pela recidiva do linfoma, aproximadamente quatro anos após a radioterapia e quimioterapia. Não há, na literatura, relatos de linfoma que tenham desaparecido ou remitido após antibioticoterapia.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1. Chan TV, Spiegel JH. Klebsiella rhinoscleromatis of the membranous nasal septum. J Laryngol Otol. 2007, 121(10):998-1002.
2. Lourenço AE. Doenças granulomatosas nasais - rinites e sinusites específicas. In: Fukuda Y. Guia de Otorrinolarin-gologia. 1a ed. Barueri-SP: Editora Manole; 2002, 225-30.
3. Cavalot A, Fadda GL, Nazionale G, Palonta F, Ricci E. Primary non-Hodgkin´s lymphoma of nasal cavity. Acta Otolaryngol. 2000, 120(4):545-50.
4. Gumprecht TF, Meyer PR, Nichols PW. Identification of rhinoscleroma by imunoperoxidase technique. Laryngoscope. 1983, 93(5):627-9.
5. Essid A, Hamzoui M, Sahli S. Nasal angiocentric T cell -natural Killer cell lymphoma with pancreatic localisation in a child. Arch Pediatrié. 2003, 10(11):979-82.
6. Al-Serhani AM, Al Qahtani AS, Arafa M. Association of rhinoscleroma with rhinosporidiosis. Rhinology. 1998, 36(1):43-5.
1. Graduação em Medicina/UFMG. Médico Residente Otorrinolaringologia.
2. Mestre em Patologia Molecular - Imunologia pela Universidade de Brasília. Otorrinolaringologista Preceptora do Programa de Residência Médica do Hospital das Forças Armadas.
3. Graduação em Medicina. Otorrinolaringologista.
4. Graduação em Medicina/UnB. Médico Residente Otorrinolaringologia.
5. Graduação em Medicina/UFMS. Médico Residente Otorrinolaringologia.
Instituição: Hospital das Forças Armadas - Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Brasília - DF / Brasil.
Endereço para correspondência:
Henrique Fernandes de Oliveira
Hospital das Forças Armadas
Avenida Contorno do Bosque s/n - Otorrino
Cruzeiro Novo - Brasília / DF - Brasil - CEP: 70658-900
Telefone: (+55 61) 3966-2350 / 8185-6177) - Fax: (+55 61) 3233-0812
E-mail: hfdoliveira@yahoo.com.br
Artigo recebido em 02 de Janeiro de 2008.
Artigo aprovado em 23 de Agosto de 2008.