Title
Search
All Issues
6
Ano: 1998  Vol. 2   Num. 4  - Out/Dez Print:
Original Article
Versão em PDF PDF em Português
A César o que é de Cesar
Author(s):
1Jorge Henrique Arraes de Alencar Pierre
Palavras-chave:
Em 1974, o professor Marcial Armando Salaverry, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, descreveu em artigo original uma via de acesso ao segmento labiríntico do nervo facial, a qual chamou Via Transatical (Transattical Approach)1, e a definiu como "uma variante técnica para descompressão total do nervo facial", a ser usada nos pacientes com audição a preservar. Esta engenhosa via de acesso permite a descompressão do segmento labiríntico pela região atical, à frente da cabeça do martelo, sem lesar as estruturas do ouvido interno e na maioria dos casos, sem necessidade de craniotomia.

Em 1982, Salaverry2 publicou sua experiência de 8 anos com a via transatical e acrescentou, à técnica inicial, a possibilidade de expor e afastar a dura mater nos casos em que há dificuldade em atingir o segmento labiríntico devido à exiguidade do campo operatório, o que ocorre, segundo ele, em 30% dos casos.

A partir da publicação inicial de Salaverry, várias técnicas semelhantes foram publicadas mudando um ou outro pequeno detalhe, mas conservando a essência da Via Transatical.

May3 publica em 1979, um técnica que denominou Transmastoid Extralabyrinthine and Subtemporal approch, cuja única diferença da Via Transatical consistia no fato deste autor desarticular a bigorna, fazendo-a rodar em direção ao ouvido médio presa ao seu ligamento posterior, retornando-a a posição inicial após terminada a cirurgia.

Yanagihara4, em 1984, descreve técnica semelhante, diferindo da anterior porque ao invés de rodar a bigorna, esta é removida e interposta entre o martelo e o estribo ao término da cirurgia, conservando sua posição original. A esta técnica denominou Supralabyrinthine Approach.

Zini, Sana e Gandolfi5, em 1984, propõem a retirada da bigorna e a da cabeça do martelo e ao final da cirurgia, a interposição da bigorna entre o cabo do martelo e a cabeça do estribo, como se faz usualmente em timpanoplastias, técnica denominada Transmastoid Extralabyrinthine Approch.

Fraysse, Dubarry e Lacome6 (1984) preferiam denominar a técnica de Extralabirynthine Mastoid Approach, sem que fizessem qualquer modificação na mesma.

Como vimos, todos os autores estrangeiros utilizaram a mesma técnica, modificando-a somente para aumentar o espaço atical e prevenir a lesão do ouvido interno por um eventual contato da broca com a cadeia ossicular. Uma atitude prudente e louvável, mas daí a mudarem completamente o nome da técnica, é outra história. Na minha opinião, o máximo que poderiam fazer, é descrever suas modificações como variantes da Via Transatical, que aliás é um nome compacto, que descreve com perfeição o acesso cirúrgico. Por que mudar o nome que foi dado por seu idealizador, com diferença de 5 anos entre o trabalho original e o segundo trabalho publicado?

O que mais incomoda é que estes nomes dados pelos autores estrangeiros geralmente são os mais utilizados nos trabalhos escritos em língua inglesa. Goin7 em 1982, numa correlação anatômico-cirúrgica sobre esta via de acesso, utiliza o nome dado por May, e nem sequer cita o trabalho original de Salaverry. É importante frisar que May cita Salaverry e a sua via transatical, embora mude o nome da técnica. Zhao8 preferiu utilizar o nome Transtemporal Supralabyrinthine Approach em estudo mostrando resultados da utilização desta técnica em pacientes com paralisia de Bell, colesteatoma e paralisia facial traumática. Pellicer e Quesada9 são os únicos autores estrangeiros encontrados na literatura, que utilizam corretamente o nome Transattical Approch, em interessante trabalho onde utilizam a tomografia computadorizada para prever o grau de pneumatização necessário para realizar esta via de acesso.

Entre nós, Pierre10 demostrou, em tese de mestrado, que é possível descomprimir todo o segmento labiríntico do nervo facial pela via transatical em 50% dos casos, sem necessidade de expor a dura mater, e em 86,6% dos casos se esta for exposta no tegmen tympani. Castro11 em arquivo escrito no Programa de Educação Continuada em Otologia da SBO, cita Salaverry e sua técnica, porém a denomina "Extralabiríntica e subtemporal" como os autores estrangeiros, ao invés do nome que lhe deu seu inventor.

Apesar de ter sido demonstrado que esta via de acesso é de utilidade indiscutível e da mesma ser usa por autores de vários países, no Brasil, onde foi idealizada, esta técnica é muito pouco conhecida. É uma técnica que exige grande habilidade cirúrgica, mas que considero de mais fácil realização para os nosso cirurgiões otológicos, que nem sempre têm o treinamento em neurocirurgia que exige a abordagem pela fossa média.

Lanço aqui a proposta de que esta técnica seja divulgada sempre que se falar sobre a descompressão do segmento labiríntico do nervo facial, e que seja parte dos cursos de dissecção do osso temporal ministrados por todo o País.

Portanto, a César o que é de César ou melhor "A SALAVERRY O QUE É DE SALAVERRY".

Bibliografia

1. SALLAVERRY, M. A. - Via Transatical. Variante técnica para a descompressão total do nervo facial. Rev. Bras. Otorrinolaringologia, 40; 262-264, 1974.

2. SALLAVERRY, M. A. - Transattical approcha to the labyrinthine segment of the facial nerve. In: Graham, M. D., House, M. F. - Disorders of the facial nerve. New York, Raven Press, 1982.

3. MAY, M. - Total facial nerve exploration: transmastoid, extralabyrinthine, and subtemporal. Indications and results. Laryngoscope, 89: 906-917, 1979.

4. YANAGIHARA, N. - Transmastoid decompression of the facial nerve using supralabyrinthine approach. In: Portmann, M. - Facial Nerve. New York, Masson Publishing USA INC, 1984.

5. ZINI, C.; SANNA, M.; GANDOLFI, A. - Decompression of the facial nerve by the transmastoid extra-labyrinthine approach. In: Portman, M. - Facial Nerve. New York, Masson Publishing USA INC., 1984.

6. FRAYSSE, B.; DUBARRY, B.; LACOME, Y. - The extralabyrinthine mastoid approach route to the facial nerve. In: Portmann, M. - Facial Nerve. New York, Masson Publishing USA INC, 1984.

7. GOIN, D. N. - Proximal intrateporal facial nerve in Bell's palsy surgery. A study correlationg anatomical ean surgical findings. Laryngoscope, 92; 263-271, 1982.

8. ZHAO, J. C. - Transtemporal supralabyrunthine approach. Chung Hua Erh Pie Yen Ko Tsa Chih, 27(6): 342-4, 1992.

9. PELLICER, M.; QUESADA, P. - The use of a CT scan to predict the feasibility of decompression of the first segment of the facial nerve via transattical approach. J. Laryngol. Otol., 109; 935-940, 1995.

10. PIERRE, J. H. A. A. - Via Transatical. Tese apresentada ao Departamento de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da UFRJ, para obtenção do grau de Mestre. Rio de Janeiro, 1994.

11. CASTRO, D. - Tratamento clínico e cirúrgico da paralisia de Bell. Programa de Educação Continuada em Otologia - SBO/SB.

1- Mestre em Otorrinolaringologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
  Print:

 

All right reserved. Prohibited the reproduction of papers
without previous authorization of FORL © 1997- 2024