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Ano: 2010  Vol. 14   Num. 2  - Abr/Jun
DOI: 10.7162/S1809-48722010000200014
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Oximetria de Pulso: Alternativa Instrumental na Avaliação Clínica junto ao Leito para a Disfagia
Pulse Oximetry: Instrumental Alternative in the Clinical Evaluation by the Bed for the Dysphagia
Author(s):
Maria Cristina de Almeida Freitas Cardoso1, Ana Maria Toniolo da Silva2.
Palavras-chave:
saturação de oxigênio, oximetria de pulso, transtorno de deglutição.
Resumo:

Introdução: A avaliação clínica junto ao leito é o procedimento clínico utilizado pela fonoaudiologia como um screening teste para se estabelecer se o indivíduo apresenta ou não um quadro clínico de disfagia. Sua realização conta com o uso da oximetria de pulso que é a medida não-invasiva da saturação periférica de O2. Quando relacionada à disfagia, a saturação pode declinar no momento da deglutição, sugerindo um comprometimento do sistema respiratório. Tal declínio é observado em indivíduos que aspiram com alimentos de consistência sólida e líquida, antes durante e após a alimentação, quando comparados aos indivíduos que não aspiram. Objetivo: Verificar a possibilidade da utilização da oximetria de pulso como alternativa instrumental na avaliação clínica para a disfagia. Método: Revisão de literatura, baseando-se em artigos indexados nas bases Lilacs e Medline tendo como referência os descritores: saturação de oxigênio, oximetria de pulso e transtorno de deglutição. Resultados: A associação da avaliação clínica à oximetria de pulso evidencia-se com alta sensibilidade na detecção da penetração e aspiração laringotraqueal e com baixo índice falso-positivo, considerando-se dessaturação, os índices que variam com valores maiores que 2%. Alguns dados encontrados são divergentes quanto à possibilidade detecção de aspiração. Considerações Finais: Os estudos analisados conferem a oximetria de pulso o caráter de praticidade e possibilidade de uso nas ações junto ao leito, sendo utilizada aliada a avaliação clínica para disfagia, embora se encontre certa discordância entre os mesmos quanto à utilização dos seus resultados como indicadores de aspiração laringotraqueal, sugerindo necessidade de pesquisas posteriores.

INTRODUÇÃO

A oximetria de pulso é um exame utilizado para verificação da saturação periférica de oxigênio, ou seja, da impregnação de oxigênio no sangue. Trata-se de um exame não-invasivo que tem o oxímetro como instrumento de detecção.

Os dados coletados por este instrumento são aferidos em porcentagem, acuradas entre 80% e 100%, sendo considerados os índices de melhor perfusão sanguínea os valores próximos a 100%.

A oximetria de pulso vem sendo utilizada como exame complementar à avaliação clínica fonoaudiológica junto ao leito no estabelecimento clínico da disfagia, por seus resultados conferem a possibilidade de comprometimento respiratório, sugerindo a probabilidade de ocorrência de aspirações laringotraqueais.

Este estudo se justifica, pois as avaliações objetivas de padrão ouro não são a realidade dos serviços junto ao leito na nossa sociedade.

A partir deste tema, buscou-se nas bases Lilacs e Medline, artigos publicados nos últimos 15 anos, a partir das palavras chaves de: saturação de oxigênio, oximetria, oximetria de pulso, oximetria de pulso e disfagia, oximetria de pulso e avaliação clínica fonoaudiológica junto ao leito.

Os artigos indexados encontrados na base de dados Lilacs foram 181 referentes ao termo oximetria. Destes, 148 apresentavam dados sobre a oximetria de pulso. Não se encontrou dados que referissem a relação entre a oximetria de pulso e a avaliação clínica fonoaudiológica para a disfagia, mas 8 apresentavam-se relacionados aos distúrbios respiratórios.

Na base Medline foram encontrados 2893 artigos sobre a oximetria, sendo 1967 sobre a oximetria de pulso e 18 relacionando a oximetria de pulso à disfagia. Entre estes 18 artigos estão aqueles que relacionam a oximetria de pulso a avaliação clínica fonoaudiológica para a disfagia, à detecção de aspiração, comparação de dados aos exames de padrão ouro, artigos de revisão e outros dados referentes a vias respiratórias, síndromes e doenças específicas, diferentes dos acidentes vasculares encefálicos.

Com este levantamento e associando-o às publicações disponíveis na biblioteca do Centro Universitário Metodista IPA, elaboramos este artigo de revisão.

O objetivo do mesmo é verificar a possibilidade da utilização da oximetria de pulso como alternativa instrumental na avaliação clínica para a disfagia junto ao leito.

Saturação Periférica de Oxigênio

A configuração da caixa torácica tem como finalidade a proteção óssea dos órgãos vitais e, através da interação dos ossos e músculos torácicos, o aumento e diminuição do volume do mesmo, gerando diferenças de pressão que permitem a fluidez do gás para dentro e fora dos pulmões, o que caracteriza a troca gasosa, na qual há a distribuição de oxigênio na superfície de troca e o descarregamento de dióxido de carbono à atmosfera, tendo a participação dos 70m2 de alvéolos (1-3).

A anatomofisiologia do sistema respiratório estabelece-se pela troca do oxigênio pelo dióxido de carbono, entre a atmosfera e as células do corpo, com um mínimo de trabalho. Nesse sistema há a filtragem do ar inalado, o seu aquecimento e umidificação, fazendo com que o gás inspirado entre em contato com o fluxo sanguíneo capilar pulmonar, intercambiando, rapidamente e de forma eficiente, o oxigênio e o dióxido de carbono (1).

O ciclo pulmonar da respiração envolve os mecanismos de ventilação, perfusão e a relação ventilação/perfusão.

A ventilação e a perfusão pulmonar são sistemas de transporte desenvolvidos especialmente para o deslocamento do oxigênio e do dióxido de carbono, servindo ao mecanismo tecidual. A ventilação pulmonar é a etapa primária do processo respiratório, descrita como o resultado de uma série de fenômenos e interações fisiomecânicas complexa entre os seus componentes, sendo estes: controlador respiratório, músculos respiratórios, caixa torácica, abdome, fluxo aéreo e a ventilação alveolar. Estes mecanismos interagem de forma que o controle involuntário e voluntário da função respiratória ativa os músculos respiratórios e causa o movimento da caixa torácica e do abdome, tendo como resultado o deslocamento do ar para dentro e fora dos pulmões, possibilitando a ventilação alveolar. A troca gasosa acontece quando o ar é levado por fluxo dirigido para dentro dos alvéolos, entrando em contato com o sangue capilar e distribuído à superfície de troca gasosa. A difusão é o processo pelo qual as moléculas de gás se movem de uma área de pressão parcial alta para uma área de pressão parcial baixa, efetuando o processo de troca gasosa (3-4).

O transporte de ar através das vias aéreas depende da permeabilidade dos tubos, assim como, da consistência dos pulmões e da força dos músculos respiratórios e o transporte das substâncias oxigênio e dióxido de carbono, através do sangue, ocorrem de forma diversa (2, 3, 5).

O oxigênio (O2) é imediatamente ligado à hemoglobina e liberado nos tecidos sob condições de baixa tensão de oxigênio ou acidose. Já o dióxido de carbono é transportado em forma de bicarbonato, na sua maior parte (6).

A hemoglobina é uma proteína conjugada, composta por quatro cadeias polipeptídicas ligadas, cujo formato determina a afinidade por oxigênio, ou seja, o pigmento vermelho que carrega o O2 nas hemáceas (5-6).

A diminuição da massa das hemáceas caracteriza a anemia, e o aumento na massa das hemáceas caracteriza a policitemia ou eritrocitose (3).

O transporte de O2 depende fundamentalmente da concentração de hemoglobina além da qualidade da hemoglobina presente. A dependência da célula pelo oxigênio justifica-se, pois a sobrevivência da mesma depende da presença de oxigênio no sangue e a função do dióxido de carbono é o de controlar o estado ácido-básico do organismo. Tal relação é percebida pela gasometria arterial. A pressão de O2 atmosférica (PO2) normal é de 150mmHg ou 20Kpa, diminuindo para 120mmHg ou 16Kpa dentro do alvéolo. A pressão de O2 arterial (PaO2) está, geralmente, em torno de 105mmHg ou 14Kpa em um indivíduo sadio. O importante para a célula é a quantidade de O2 que ela recebe (3, 6).

O transporte de oxigênio para os tecidos está sujeito a fatores como: quantidade de hemoglobina, grau de saturação com o O2 e a velocidade com que o sangue oxigenado será entregue aos tecidos. Estando a hemoglobina e a função cardíaca normais, a medida da saturação de O2 da hemoglobina é mais relevante à distribuição de O2 do que a PaO2 (6).

A PaO2 está relacionada com a saturação de O2 de um modo complexo, determinado pelas propriedades da hemoglobina, conhecida como curva de dissociação de O2. Esta relação demonstra que, quando a PaO2 atinge 60 mmHg ou 8 Kpa, sob a maioria das condições, a hemoglobina está completamente saturada e não pode mais carregar O2 (6).

A saturação é a medida referente é a proporção de hemoglobina disponível que está realmente transportando oxigênio. Ela é calculada através da proporção de oxiemoglobina - HbO2 - (conteúdo) em relação à hemoglobina total (capacidade). O cálculo da saturação de oxigênio (SaO2) é dado pela seguinte fórmula:





sendo, [HbO2] o conteúdo da oxiemoglobina, [Hb] o conteúdo de hemoglobina desoxigenada e [Hb] + [HbO2] o conteúdo total de hemoglobina. A saturação de oxigênio (SaO2) é dada em porcentagem (%) de hemoglobina disponível que transporta o oxigênio, permanecendo o restante desoxigenado (5).

A oximetria de pulso é a medida não-invasiva da saturação periférica de O2 (SpO2), introduzida para o uso clínico nos meados da década de 1980. Esta funciona pelo exame transcutâneo do espectro de cores da hemoglobina, que muda com seu grau de saturação (5-7).

O princípio de funcionamento do oxímetro dá-se pela mudança de coloração existente entre o sangue arterial, de cor vermelha vivo, e o venoso, cianótico. Tal característica altera a luminosidade transmitida através de uma fina camada de sangue, definida por cubetas especiais localizadas nas linhas de circulação extracorpórea. O equipamento compõe-se de sensores ópticos conectados nestas cubetas, de uma unidade eletrônica de condicionamento analógico do sinal correspondente à luminosidade transmitida, e de uma unidade de processamento digital do sinal (8).

Para o cálculo da saturação de oxigênio utiliza-se uma equação de 1º grau bivariada, cujos coeficientes são obtidos a partir da correlação entre valores de intensidade luminosa e medidas da SaO2, obtidas por gasometria com equipamentos comerciais calibrados (8).

A medida de saturação fornece informações sobre a impregnação de oxigênio e esta se relaciona com a ventilação, somente se o nível de oxigênio inspirado estiver normal. A monitorização da saturação de oxigênio não detecta a hipoventilação e o aumento da pressão de dióxido de carbono. Níveis de saturação menor que 60 mmHg prejudicam a saturação e a entrega de oxigênio (5-7) .

A saturação de oxigênio é a medida continuamente dada pelo oxímetro de pulso por um sensor sobre o dedo ou lobo da orelha. As saturações são, em geral, acuradas entre 100% e 80% e há fatores que podem interferir na aferição da pressão arterial de oxigênio, ou seja: uma pobre perfusão periférica, unhas pintadas ou manchadas por nicotina, orelhas perfuradas, contraste intravenoso médio ou tinturas injetadas (2).

A relação entre o nível de saturação de oxigênio e a aspiração durante a ingestão de alimentos é estabelecida, já que, frente à aspiração, há um declínio do nível de saturação de oxigênio e este é medido pelo oxímetro de pulso, como relatado por SHERMAN et al. (9).

Uma disfunção ventilatória pode ocorrer em qualquer uma das etapas desses mecanismos. A função dos músculos respiratórios pode ser afetada por patologias, agindo diretamente ou indiretamente no músculo, através da via motora dos sistemas nervosos central e/ou periférico. As patologias que agem diretamente no músculo incluem as categorias das distrofias musculares e das miopatias. Já as que atingem indiretamente o músculo, incluem a lesão na coluna vertebral, poliomielite e/ou as neuropatias (4).

Resultados da oximetria de pulso e os distúrbios de deglutição

O nível de saturação ou a variação do mesmo em mais que 2% é considerado como clinicamente significativo para o diagnóstico de aspiração (10-11), sendo que a combinação da avaliação da deglutição junto ao leito e do monitoramento pelo oxímetro de pulso, comparado a aspiração e penetração laringotraqueal, oferece um valor preditivo positivo de 95% (10).

A dessaturação é referida como relacionada à disfagia, pois há um comprometimento do sistema respiratório em indivíduos disfágico e, nessa, encontra-se um declínio nos níveis de saturação de O2 naqueles que aspiram com alimentos de consistência sólida e líquida, antes durante e após a alimentação, quando comparados com indivíduos sem aspiração (12).

A eficiência do uso da oximetria de pulso como um instrumento para examinar e/ou avaliar a disfagia é argumentado no estudo de COLODNY (12), que relata que muitas pesquisas propõem o uso da oximetria de pulso como uma alternativa instrumental para o exame ou avaliação da deglutição, assim como as outras formas de avaliação instrumental, e que seus resultados dão suporte a esta alternativa de avaliação, quando a mesma for utilizada em conjunto com a avaliação clínica da deglutição, no intuito de discriminar indivíduos disfágicos dos com deglutição normal.

Em outro estudo, COLODNY (13) verificou que o nível de saturação não é significantemente alterado pela aspiração de líquidos e/ou de alimentos sólidos. No entanto, reforçou que os indivíduos disfágicos apresentaram uma queda no nível de saturação de oxigênio, quando comparados com indivíduos com deglutição normal, antes, durante e após a alimentação oral. Além disso, a autora observou que os indivíduos que aspiravam têm seu status respiratório comprometido, evidenciado na queda representativa dos níveis de saturação quando comparados com os indivíduos com deglutição normal ou que têm o alimento penetrado.

Estudos como o de SHERMAN et al. (9) dão suporte aos dados de COLODNY (13) quanto a presença de queda nos níveis de saturação a respeito da aspiração.

Na literatura encontra-se resultados de queda nos níveis de saturação frente à aspiração, ainda que cada estudo pesquisado denote uma limitação de influência nos seus resultados, mas estabelecem que os indivíduos disfágicos que aspiram ou os que têm o alimento penetrado, apresentavam menor nível de saturação de oxigênio que os indivíduos com deglutição normal, encontrando-se como fatores que podem influenciar nos resultados de saturação de oxigênio destes pacientes: a idade, gênero, diagnóstico clínico principal e distúrbio multissensorial (13-15).

COLLINS e BAKHEIT (14) evidenciaram tais fatores ao encontrar um maior índice e dados significativos para a dessaturação e aspiração em indivíduos masculinos e com idade maior que 65 anos.

Ao mesmo tempo, o estudo de SHERMAN et al. (9) não mostra relação entre os quadros de disfagia com dessaturação relacionados à idade, gênero ou pelo diagnóstico, mas relata a aspiração ou penetração sem a ocorrência do clearance laringotraqueal, com significativo declínio de saturação de O2, quando comparados àqueles que tiveram o alimento penetrado, mas realizaram o clearance.

COLODNY (12) e SMITH et al. (10) concluem que a oximetria de pulso pode ser utilizada como um elemento adjunto da discriminação da presença de disfagia e da não-disfagia, pois confirmaram tais dados ao exporem os pacientes à oximetria de pulso e à videofluoroscopia, respectivamente, cuja combinação da avaliação fonoaudiológica junto ao leito com a oximetria de pulso resultou num valor de 95% de dados positivos à presença de aspiração.

Os resultados de SMITH et al. (10) indicam que, quando combinadas, a oximetria de pulso e a avaliação fonoaudiológica junto ao leito, revelam a dessaturação de oxigênio na deglutição, com um baixo índice falso-positivo.

Na revisão a respeito da avaliação clínica fonoaudiológica junto ao leito, aliada a oximetria de pulso realizada por LIM et al. (11), no intuito de identificar pacientes que estivessem em risco de aspiração através do uso da fibroendoscopia, permitiram-lhes detectar três grupos de pacientes: grupo A - pacientes que aspiravam com sinais abertos de aspiração como tosse e asfixia, mas sem sinais de dessaturação; grupo B - pacientes que apresentavam sinais abertos de aspiração e também de dessaturação na deglutição; grupo C - pacientes silentes ou sem sinais abertos, mas com dessaturação.

SMITH et al. (10) e LIM et al. (11) concluem que o nível de saturação ou a variação do mesmo em mais que 2% é considerado como clinicamente significativo para o diagnóstico de aspiração.

Estudos divergentes são encontrados ao que se refere à queda do nível de saturação frente à aspiração como os de SELLARS, DUNNET e CARTER (16), de DE GROOF, DEJAEGER e GOELEVEN (17) e o de WANG et al. (18). Estes últimos analisaram os resultados da comparação da oximetria de pulso na identificação da aspiração através da avaliação da deglutição por videofluoroscopia (VFSS), consideraram o índice de 3% como dessaturação e verificaram correlação de não significância entre a dessaturação medida e à aspiração detectada pela VFSS. Os seus resultados evidenciaram valores preditivos negativos e concluíram não haver possibilidade de predizer a aspiração através da queda da SpO2 monitorado pelo oxímetro de pulso.

O uso da oximetria de pulso como uma alternativa de exame para os indivíduos disfágicos, não envolve a exposição à radiação, embora sua validade frente à aspiração silente ainda não tenha sido totalmente examinada.

Entre as consequências de saúde possíveis, tem-se que a aspiração é um dos sinais mais críticos da disfagia orofaríngea (19).

Em relação à avaliação fonoaudiológica junto ao leito, observa-se que o desafio é desenvolver um exame diagnóstico que possa ser facilmente utilizado, que seja não-invasivo, que não cause dor ou angústia ao paciente e que dê resultados confiáveis e a oximetria de pulso segue sendo questionada quanto a sua confiabilidade, mas se argumenta que esta é disponível nos hospitais e que os profissionais da saúde estão familiarizados com seu uso (20).

A oximetria de pulso pode ser utilizada como um elemento adjunto da discriminação da presença de disfagia e da deglutição normal, pois estudos confirmam que os dados coletados em pesquisas, ao expor os indivíduos à oximetria de pulso e à videofluroscopia, respectivamente, e pela combinação de tais resultados aos da avaliação fonoaudiológica junto ao leito com a oximetria de pulso, resultaram num valor entre 86% e 95% de dados positivos à presença de aspiração (10, 12).

A dessaturação do sangue arterial, observada na queda da oximetria de pulso, dá-se quando da aspiração de alimentos e líquidos pelas vias aéreas e a oximetria de pulso capacita a identificação de pacientes com aspiração e pode ser a técnica alternativa instrumental para a avaliação da disfagia (15).

Em situação normal, não há efeitos significativos entre a alimentação e o nível de saturação de oxigênio medido na oximetria de pulso, mas encontra-se uma associação entre a alteração arterial da oxigenação e a alimentação oral em indivíduos disfágicos (16).

Quando combinadas a oximetria de pulso e a avaliação fonoaudiológica junto ao leito revelam a dessaturação de oxigênio, na deglutição, com um baixo índice falso-positivo (10).

A detecção da presença de aspiração é somente um dos aspectos de um exame não-instrumental da função de deglutição (19).

A perda acidental de alimento ou líquido pelas vias aéreas, durante o processo de alimentação é, talvez, a consequência clínica mais significativa da disfagia. A invasão das vias aéreas é descrita como penetração, quando o material não ultrapassa as pregas vocais, e aspiração, quando o material ultrapassa as pregas vocais, adentrando a traqueia (21).

O quadro aspirativo diferencia-se quanto ao tipo de material aspirado em: particulados obstrutivos, devido às partículas alimentares grandes que causam obstrução completa e que não são encaminhados para o estômago; "café coronário", ou seja, alimento parcialmente mastigado e que é aspirado durante a deglutição, incapacitando o paciente de respirar ou de falar, tornando-se cianóticos; por obstrução parcial traqueal ou brônquica, decorrente da aspiração gástrica de partículas de tamanho intermediário, acarretando sintomas comuns a de qualquer aspiração de corpo estranho; particulados não-obstrutivos: aspiração de material gástrico neutro, não-grande o suficiente para obstruir as vias aéreas e que causam taquipneia, cianose, sibilos, tosse, produção de escarro, podendo levar ao choque; líquido ácido, por inalação de líquido com pH inferior a 2,5, podendo lesar o tecido pulmonar de forma extensa, sendo os seus sinais iniciais a taquipneia, cianose, sibilos e hipotensão e, após alguns segundos, ocorre a hipoxemia com a concomitante diminuição da complacência pulmonar; aspiração de água ou afogamento, devido à lesão pulmonar provocada por afogamento, dependendo da quantidade de água aspirada; sangue, havendo o aumento das frequências de pulso e respiratória, podendo tornar-se cianótico, após a aspiração deste; hidrocarbonetos, frente a querosene, lustra-móveis, fluido de isqueiro, gasolina, solventes de derivados de petróleo (21).

Uma escala de distribuição de graus de material penetrado ou aspirado, em indivíduos selecionados em dois grupos conhecidos por serem portadores de disfagia, ou seja, pós-acidente cerebral encefálico e câncer de cabeça e pescoço foi descrita em oito pontos, observados durante a avaliação da deglutição através da videofluoroscopia, na qual se considera: sem penetração ou aspiração, como o grau 1 e define-se devido ao contraste não entrar as vias aéreas; penetração, grau 2, em que o contraste entra às vias aéreas e permanece acima das pregas vocais, não havendo resíduo; penetração, grau 3, o contraste entra às vias aéreas, permanecendo visível o resíduo; penetração, grau 4, em que o contraste contata as pregas vocais, sem a presença de resíduo; penetração, grau 5, o contraste contata as pregas vocais, permanecendo visível o resíduo; aspiração, grau 6, em que o contraste ultrapassa a glote, sem resíduo visível sub-glótico; aspiração, grau 7, o contraste ultrapassa a glote, estando visível o resíduo sub-glótico, apesar da resposta do paciente; e aspiração, grau 8, em que o contraste ultrapassa a glote, há visível resíduo sub-glótico, não existindo resposta do paciente (22).

Embora os dados de CHAN e LO (23), quanto a queda da SpO2 durante as refeições, não evidenciam indicação prévia de pneumonia aspirativa, os de ISOLA (24) são de que a disfagia orofaríngea predispõe os indivíduos às pneumonias bacterianas de repetição, pois existe uma constante e volumosa aspiração, que se sobrepõe à capacidade de defesa do pulmão.

Os quadros de disfagias são comuns nas doenças cérebro vasculares e os indivíduos que aspiram tem uma possibilidade 20 vezes maior para o desenvolvimento de pneumonias quando comparados aos que não aspiram ou de 6,95 % maior entre disfágicos e com deglutição normal (10, 25).

Os estudos realizados para o uso concomitante da oximetria de pulso e a avaliação clínica junto ao leito vêm sendo confirmados quanto a sua sensibilidade e especificidade através de exames de padrão ouro, como a videofluroscopia (VFSS) e a fibronasoscopia (FEES), variando entre percentuais para a sensibilidade de 58,3% a 100% e de especificidade de 62% e 76% (10, 11, 18, 25, 26) e considerados como de moderada sensibilidade e especificidade nos achados de MORGAN, OMAHONEY e FRANCIS (27).

A oximetria de pulso, quando da utilização em conjunto da avaliação fonoaudiológica junto ao leito (bedside assessment of dysphagia), possibilita predizer a aspiração ou sua predisposição em 81,5% dos casos de disfagia neurogênica por acidente vascular encefálico e estabelece uma alta correlação entre a dessaturação de oxigênio e a aspiração durante os dois minutos após a ingestão de alimento (14).


DISCUSSÃO

A disfagia continua sendo a dificuldade mais comum frente às neuropatias e as suas complicações clínicas envolvem a má-nutrição, desidratação, aspiração, sufocamento, pneumonias e morte do indivíduo acometido por este transtorno.

Com vistas à necessidade de se estabelecer dados de referência baseadas na prática clínica, vê-se, a cada dia, mais pesquisas envolvendo a avaliação clínica junto ao leito associadas a diferentes técnicas objetivas de diagnóstico, no intuito de evidenciar sua efetividade e de se especificar um protocolo válido.

Neste sentido, a avaliação clínica para a disfagia varia os seus protocolos com diferentes quantidades de material a ser ingerido pelo paciente (entre 5 e 100 ml), nas diferentes consistências.

Dado a realidade de não inferir ao indivíduo outros danos, vimo-nos frente à necessidade de nos aliarmos a outras formas de avaliações, menos invasivas, embora tenhamos claro que os exames de VFSS e FEES continuam a ter o padrão ouro para o diagnóstico das disfagias, no que se refere ao estabelecimento da penetração e aspiração laringotraqueal.

Em virtude do padrão de qualidade destes exames, a avaliação clínica vem sendo analisada e comparada aos mesmos, assim como avaliação clínica associada à oximetria de pulso, de forma exaustiva.

A oximetria de pulso é o método de medida da saturação periférica de O2, que pode ser utilizada como critério prévio de uma suposta detecção da penetração laríngea e da aspiração subglótica, considerando a uma variação igual a 2% ou mais, em pacientes portadores de neuropatias.

Os dados publicados até o momento mostram o uso da oximetria de pulso associada à avaliação clínica junto ao leito com controvérsias, por um lado indicado como sendo eficiente e facilitadora no diagnóstico e tratamento da disfagia e tendo uma alta sensibilidade na detecção da penetração e aspiração laringotraqueal e com baixo índice falso-positivo e, por outro, sem a possibilidade de se estabelecer os quadros de disfagia silente, nos quais não há qualquer sinal ou sintoma de penetração e/ou aspiração laringotraqueal, ou mesmo na indicação de pneumonia aspirativa.

Os nossos achados clínicos tornam possível uma proposta de agrupamento, associando-se os sinais e sintomas clínicos encontrados na avaliação fonoaudiológica para com as disfagias de causa neurogênica junto ao leito aos índices de saturação de oxigênio obtidos através da oximetria de pulso, contando com a variação destes índices e, considerando-os como dessaturação acima de 2%, nos seguintes grupos:

- grupo A - aqueles indivíduos que apresentam sinais de deglutição normal e sem dados de dessaturação;

- grupo B - aqueles indivíduos que apresentam sinais específicos, oromiofuncionais, de disfagia orofaríngea, mas sem sinais de dessaturação;

- grupo C - aqueles que apresentam sinais específicos, oromiofuncionais, de disfagia orofaríngea, com sinais de dessaturação;

- grupo D - aqueles que não apresentam sinais específicos, oromiofuncionais, de disfagia orofaríngea, mas com sinais de dessaturação.

Consideramos que frente à disfagia encontram-se dados de comprometimento da oxigenação arterial e acreditamos na utilização da oximetria de pulso, aliada a avaliação clínica para a disfagia, como uma possível ferramenta diagnóstica, devido a sua praticidade e disponibilidade.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os estudos analisados conferem a oximetria de pulso o caráter de praticidade e possibilidade de uso nas ações junto ao leito, assim como em se considerar como dessaturação as variações acima de 2%. Embora se encontre certa discordância entre os mesmos quanto à utilização dos seus resultados como indicadores de aspiração laringotraqueal, tal ferramenta tem sido utilizada aliada a avaliação clínica para a disfagia junto ao leito e seus resultados vem sendo comparados às avaliações instrumentais de padrão ouro.

Há um consenso de que mais estudos devam ser efetivados.


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1 Doutoranda em Gerontologia Biomédica. Docente do curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário Metodista IPA/RS e Supervisora Clínica.
2 Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela UNIFESP/SP. Docente da UFSM/RS.

Instituição: Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Maria / RS. Santa Maria / RS - Brasil. Endereço para correspondência: Maria Cristina de Almeida Freitas Cardoso - Avenida Eduardo Prado, 695 - Casa 37 - Porto Alegre / RS - Brasil - CEP: 91751-000 - Telefone: (+55 51) 3316-1206 - E-mail: mccardoso@via-rs.net

Artigo recebido em 24 de Janeiro de 2009. Artigo aprovado 24 de Junho de 2009.
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