INTRODUÇÃOA atresia de coanas (AC) pode ser definida como a falha no desenvolvimento da comunicação entre a cavidade nasal e a nasofaringe (1). Sua incidência é de 1:5.000-8.000 nascimentos, sendo o sexo feminino mais acometido que o masculino, numa proporção de 2:1, os defeitos unilaterais são mais comuns que os bilaterais (2,3). Pode ocorrer como uma placa ósteo-membranosa (70%), óssea (20%) ou membranosa (10%). O diagnóstico depende de alto grau de suspeição, endoscopia nasal e tomografia de seios paranasais, o tratamento é cirúrgico.
RELATO DO CASO MLSM, 34 anos, sexo feminino, com história de obstrução nasal bilateral, rinorreia hialina e, por vezes, mucopurulenta desde a infância. Relata episódios frequentes de rinossinusite. Não sabe relatar se teve problemas respiratórios ao nascer. Ao exame físico, não há associação com outras malformações congênitas. Na oroscopia apresenta protusão dentaria e palato ogival. Endoscopia nasal: confirmação da atresia bilateral (Figura 1). Solicitado tomografia computadorizada de seios da face que evidenciou atresia ósteo-membranosa bilateral (Figura 2). Paciente foi submetida a tratamento cirúrgico endoscópico via transnasal, com confecção de retalho mucoso cobrindo a área cruenta, sem colocação de stent (Figura 3), sendo usado endoscópio rígido de zero grau. Evoluiu sem intercorrências no pós-operatório imediato, fez uso de amoxacilina (500mg VO de 8/8 hs por 10 dias) e lavagem nasal com solução salina fisiológica. Teve alta após 24 horas e foram feitas revisões, através da endoscopia nasal, semanalmente. Foi feito tomografia de controle, no 40º dia de pós operatório, que evidenciou coanas abertas e amplas (Figura 4). Paciente evoluiu bem e apresenta respiração nasal normal.
Figura 1. Visão endoscópica de atresia em narina direita.
Figura 2. TC de seios da face em corte axial mostrando atresia ósteo-membranosa bilateral.
Figura 3. Visão endoscópica de coana direita aberta.
Figura 4. TC de seios da face em corte axial mostrando coanas abertas e amplas.
DISCUSSÃOA atresia de coanas pode apresentar-se como malformação isolada ou, em 20% a 50% dos casos, fazer parte de um grupo de malformações congênitas, como: coloboma, malformação cardíaca, retardo mental e de crescimento, anomalias genitais e auriculares ou surdez (4). Sendo assim, um exame físico completo deve ser feito pelo pediatra e otorrinolaringologista para identificar a eventualidade da presença dessas anomalias. Algumas teorias têm sido propostas para explicar a origem embriológica dessa entidade clínica. Dentre as mais aceitas, quatro se sobressaem: 1) persistência da membrana bucofaríngea; 2) falha no rompimento fisiológico da membrana buconasal de Hochstetter; 3) aderência anormal de tecido mesodérmico localizado na coana nasal; e 4) crescimento medial dos processos verticais e horizontais do osso palatino (5,6).
O diagnóstico depende de alto grau de suspeição. A AC bilateral cursa com obstrução nasal, estridor, cianose cíclica (melhora com o choro do RN); mas que pode levar à insuficiência respiratória imediata com risco potencial de óbito por asfixia, já que os recém nascidos são respiradores nasais obrigatórios até aproximadamente 3 semanas de vida. Portanto, é uma emergência médica, sendo necessária manutenção de via aérea por intubação oral, traqueostomia ou uso da cânula de McGovern nipple, de modo a estabilizar o paciente e programar o método cirúrgico definitivo. A atresia unilateral pode passar despercebida durante anos e cursar com rinorreia tardia e congestão nasal unilateral; alguns pacientes, contudo podem permanecer oligossintomáticos (7).
Exames complementares como a tomografia de seios da face e a nasofibroscopia são essenciais para a confirmação diagnóstica e planejamento terapêutico - avaliação da extensão, localização e distinção das atresias em ósseas, membranosas, e mistas (8). Serve também para fazer diagnóstico diferencial com diversas patologias, como gliomas, hamartomas, cordomas, rabdomiossarcomas, encefaloceles, hipertrofia de vegetações adenoideanas, deformidades septais, dentre outras.
O tratamento inicial consiste na manutenção de via aérea, se necessária, até a correção cirúrgica definitiva, a qual deve restabelecer o fluxo aéreo nasal, evitar danos ao crescimento facial, utilizando uma técnica segura e rápida. Atualmente existem várias técnicas: microscópica e endoscópica via transnasal, transpalatal, transeptal, transantral e dilatações intranasais (1,7,9,10). A técnica transnasal via endoscópica tem sido mais utilizada para correção cirúrgica da atresia coanal, por oferecer boa visualização da área, ser menos traumática, apresentar menores taxas de complicações e proporcionar uma recuperação mais rápida no pós-operatório (11); por isso optamos pela referida técnica no caso relatado.
COMENTÁRIOS FINAISA imperfuração de coana bilateral tem seu diagnóstico realizado mais precocemente devido à sintomatologia mais exuberante e alto grau de suspeita por parte dos pediatras neonatologistas. É uma doença que coloca em risco a vida da criança, sendo na grande maioria dos casos corrigida nas primeiras semanas. Entretanto, em raros casos, ela pode ser encontrada durante a investigação de adultos com obstrução nasal e rinorreia bilateral, como relatado no caso.
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8. Schweinfurth JM. Image guidance-assisted repair of bilateral choanal atresia. Laryngoscope. 2002, 112:2096-8.
9. Vogels RL, Chung D, Lessa MM, Lorenzetti FTM, Goto EY, Butugan O. Bilateral congenital choanal atresia in a 13-year-old patient. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2002, 65:53-7.
10. Josephson GD, Vickery CL, Giles WC, Gross CW. Transnasal endoscopic repair of congenital choanal atresia. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1998, 124(5):537-40.
11. Cedin AC, Rocha JrFP, Deppermann MB, Manzano PAM, Murao M, Shimuta AS. Transnasal endoscopic surgery of choanal atresia without the use of stents. Laryngoscope. 2002, 112(4):750-52.
1 Especialista em Otorrinolaringologia. Coordenador do Serviço de Residência Médica em Otorrinolaringologia do Hospital São José do Avaí.
2 Residente de Otorrinolaringologia do HSJA (R3).
3 Residente de Otorrinolaringologia do HSJA.
4 Médico estagiário do Serviço de Otorrinolaringologia do HSJA.
5 Acadêmica estagiária do Serviço de Otorrinolaringologia do HSJA.
Instituição: Hospital São José do Avaí. Itaperuna / RJ - Brasil. Endereço para correspondência: José Carlos Oliveira Pereira - Rua Coronel Luiz Ferraz, 397 - Centro - Itaperuna / RJ - Brasil - CEP: 28300-000 - Telefone: (+55 11) 9251-5451 - E-mail: josecarlosop@hotmail.com
Artigo recebido em 21 de Maio de 2009. Artigo aprovado em 7 de Agosto de 2009.