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Ano: 2011 Vol. 15 Num. 1 - Jan/Mar
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Soluço - Características e Possibilidades Fonoterapeuticas |
Sobbing - Phonotherapeutic Characteristics and Possibilities |
Como citar este Artigo |
Cardoso MCAF, Xavier ACF. Sobbing - Phonotherapeutic Characteristics and Possibilities. Int. Arch. Otorhinolaryngol. 2011;15(1):89-95 |
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Author(s): |
Maria Cristina de Almeida Freitas Cardoso1, Andiara Cristina Furtado Xavier2.
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Palavras-chave: |
soluço, deglutição, respiração, fonoaudiologia. |
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Resumo: |
Introdução: O soluço é um reflexo que ocorre por um espasmo diafragmático no momento da inspiração com o concomitante fechamento glótico, acompanhado de ruído característico. Na nossa prática clínica encontramos pacientes que, após evento clínico neurológico, passam a apresentar soluços persistentes. Objetivo: Caracterizar o evento soluço, estabelecer sua etiologia e possibilidades terapêuticas. Método: Trata-se de uma revisão bibliográfica de dados publicados nos últimos 10 anos, tendo como descritores: soluço, soluço e sistema estomatognático, soluço e tratamento. Comentários Finais: Com base nos dados da literatura, temos que o soluço pode ocorrer frente aos quadros de patologias neurológicas, gastrintestinais, torácicas e/ou tóxico-metabólicas. As formas de tratamento encontram-se relacionadas às formas de soluço, que podem ser benigno, por interrupção do ciclo respiratório, ou persistente, através procedimentos médicos farmacológicos e/ou cirúrgicos, além do uso da acupuntura. Dependendo da sua frequência e velocidade, presumimos que o mesmo possa alterar as funções de deglutição, respiração e fala, pois os órgãos pneumofonoarticulatórios e os mecanismos responsáveis por estas funções alteram-se diante deste evento, ocasionando anormalidades em sua funcionalidade, o que nos remete a uma possível abordagem terapêutica fonoaudiológica.
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INTRODUÇÃO
Em nossa ação junto ao leito, por vezes, defrontamo-nos com pacientes que, após um acidente vascular encefálico, apresentam soluços intermitentes, numa frequência alta por minuto, dificultando o processo de alimentação.
De acordo com a classificação internacional das doenças - CID 10 (1), o soluço é o resultado de um espasmo diafragmático causado por uma súbita inalação que é interrompida por um fechamento espasmódico da glote, produzindo um ruído característico. Este ruído surge quando ocorre fechamento súbito da glote, produzindo vibração nas pregas vocais (2).
Com vistas a conhecer o processo de desencadeamento do soluço e fundamentar a nossa vivência clínica, este estudo foi idealizado. Buscou-se uma revisão dos dados frente às bases de dados científicos dos últimos dez anos, pesquisando-se as palavras chaves: soluço, soluço e sistema estomatognático, soluço e tratamento. Encontramos oito artigos publicados na base Lilacs, referenciando estudos de casos, caracterização e tratamentos deste evento e sua etiologia; duzentos e setenta na base Medline, seguindo o mesmo direcionamento, com ênfase no tratamento medicamentoso; e dois na Biblioteca Cochrane comparando os efeitos de duas drogas.
Para complementar os dados referentes à anatomofisiologia do sistema estomatognático, buscamos publicações em livros de anatomia e fisiologia humana, disponíveis na biblioteca central do Centro Universitário Metodista IPA (Porto Alegre/RS).
Esta revisão tem como objetivo estabelecer as características do soluço e suas as possíveis relações com as funções orofaciais e as possibilidades terapêuticas.
O Soluço
O soluço caracteriza-se por um ato inspiratório violento, ocorrendo devido a uma súbita contração involuntária (espasmódica) e repetida do diafragma (de uma ou das duas hemicúpulas) e da musculatura intercostal externa, interrompido por um fechamento repentino, momentâneo e concomitante das pregas vocais, que suspende o intercâmbio aéreo, produzindo um ruído rouco (2-4).
Tal ruído é explicado pelo espasmo clônico do diafragma, que passa através da glote, que é estreita, e pela tração simultânea da laringe, provocando a brusca passagem de ar inspiratório, ocasionando uma contração juntamente com o ruído. Sua ocorrência se dá pela movimentação dos músculos respiratórios de forma incomum, que são coordenados pelo centro supraespinal, ligando os segmentos cervicais superiores da medula espinhal (5-6).
O soluço é um reflexo sobreposto a uma respiração normal que desencadeia um arco reflexo que é transmitido pelo nervo vago e por fibras sensitivas do nervo frênico, em seu ramo aferente, e pelas fibras motoras, em seu ramo eferente, por contração em conjunto destes nervos (5-6).
A pressão alveolar de um soluço pode ser de até 200 cm³ H2O. O ar é liberado de modo explosivo e expelido através das vias respiratórias superiores e boca, numa velocidade de 120 a 160 km. Sua pressão mostra-se superior ao ato inspiratório, cujas pressões alveolares podem chegar até 150 cm³ H2O em esforços inspiratórios máximos (3).
A fisiopatologia e conexões centrais deste ato reflexo não são bem definidas. Tem-se que o arco reflexo possa estar relacionado ao nervo frênico numa cadeia simpática e ao nervo vago e suas ramas. Hipoteticamente, a rama aferente do arco reflexo tem uma continuação em centrais cerebelares respiratórias, na formação reticular ativadora ascendente e no hipotálamo, que agem como mediadores centrais e, finalmente, os nervos da glote e músculos intercostais como rama eferente (7).
O rombencéfalo também participa deste evento, pois faz parte do sistema parassimpático bulbar e relaciona as fibras eferentes compostas pelos nervos frênico, vago, laríngeo, recorrente e intercostais, entre as vértebras torácicas 1 e 11 (7).
As ramas nervosas das vértebras cervicais de 5 a 7 e os hemidiafragmas, trapézio e a glote são os efetuadores do arco reflexo, ligadas ao nervo glossofaríngeo (7).
Os nervos vago e frênico são membros do reflexo do soluço e as fibras simpáticas torácicas de 6 a 12, associam o soluço a uma variedade de distúrbios intra-abdominais e intratorácicos (8).
Aspectos estomatognáticos
O diafragma é o causador do soluço e é formado por um músculo e tendões que separa a cavidade abdominal do tórax.
Trata-se de um músculo com forma de cúpula, mais alto do lado direito que do esquerdo, e que se localiza entre o tórax (pulmões, coração, estruturas pequenas situados no interior do mediastino) e abdômen (sistema digestório, glândulas e outros órgãos). O mesmo é responsável por contrair-se e movimentar o centro tendíneo para baixo e para frente, aumentando a dimensão vertical da cavidade do tórax e, pela ligação pleural, os pulmões são estirados e produzem pressão alveolar negativa (5).
Quando os pulmões se contraem e descem, eles comprimem as vísceras abdominais, deslocando-as para baixo e para frente contra a parede do abdômen. Estes movimentos são responsáveis pela função de respiração e controlados pelo nervo frênico, direito e esquerdo, que atravessa o diafragma até chegar à superfície abdominal e ramifica-se em três ramos: lateral, anterior e posterior (5).
O sistema respiratório se caracteriza por eventos mecânicos que produzem a troca de ar durante a respiração através dos movimentos de inspiração e expiração.
A inspiração se dá pela contração dos músculos diafragma, intercostais e escaleno, ao mesmo tempo em que os pulmões aumentam de tamanho, espremendo as vísceras abdominais pelo diafragma, cuja pressão intra-abdominal é elevada (3).
No momento em que a pressão intra-alveolar se iguala à pressão atmosférica, os músculos da inspiração param de contrair-se gradativamente. O tórax dilatado produz uma pressão intra-alveolar positiva e o ar é expirado. Assim, a fase de expiração acontece sem contração muscular ativa, ou seja, na inspiração há a contração muscular ativa e na expiração a força é passiva (3).
O sistema digestório é caracterizado pela função de preensão, mastigação, transformação química, deglutição, absorção dos alimentos e a expulsão de resíduos não úteis ao corpo. Este é compreendido em canal alimentar, composto pelos órgãos: cavidade oral, fauces, faringe, esôfago, estômago, intestinos, reto e ânus. As glândulas salivares, o fígado e o pâncreas são órgãos anexos do sistema digestório (9).
A deglutição é o processo de transporte do alimento da cavidade oral ao estômago, realizado por um complexo processo que depende do sistema neuromuscular. Esta ocorre de uma forma sequencial, incluindo várias estruturas que também fazem parte da respiração, como a cavidade nasal, cavidade oral, faringe, laringe e esôfago (10-11).
Na transferência pressórica do alimento da cavidade oral para a faringe, observa-se a apneia da deglutição e o fechamento da rima glótica, com a consequente abertura da extremidade esofagiana superior (esfíncter esofágico superior) e a passagem do bolo alimentar para o interior deste órgão, devido à abertura do músculo cricofaríngeo. Devido à excitação da mucosa e dos plexos nervosos das paredes do esôfago, vão ocorrendo contrações peristálticas primárias e secundárias sequencialmente, responsáveis pela chegada do bolo alimentar ao estômago (11).
No momento em que a onda peristáltica primária alcança o esfíncter inferior do esôfago, este se relaxa permitindo a passagem do bolo ao estômago, chegando ao fim o processo de deglutição (10-11).
A laringe é um órgão tubular que se inicia na raiz da língua e possui três funções: de proteção, respiração e fonação (9).
Durante a respiração, cada ciclo respiratório ocorre pela diferença de pressões entre o ambiente externo e o alveolar gerado pelo fole torácico. Se há secreções, líquidos ou restos alimentares acumulados no ádito laríngeo, ocorre uma diferença de pressão podendo ocasionar sua entrada para via aérea inferior, resultando na aspiração e em suas consequências (9, 12).
As vias aéreas estão protegidas da aspiração durante a deglutição devido a vários mecanismos, sendo estes: o movimento superior e anterior da laringe, a aproximação das pregas vocais, o reposicionamento das pregas ariepiglóticas e da epiglote e, pela coordenação entre as funções da respiração e deglutição (12).
Etiologia
O soluço tem inúmeras causas, sendo as principais ligadas ao diafragma como as hérnias diafragmáticas. Contudo, outras patologias podem produzi-lo, incluindo-se as doenças que comprometem a pleura e o mediastino: por irritação do nervo vago causadas por ferimento ou cirurgia no peito; doenças cardíacas como infarto do miocárdio; doenças subfrênicas; tuberculose; e neoplasias (2,4,6,8,13).
Na literatura encontram-se entre as causas gastrintestinais: hérnia hiatal; gastrite; megaesôfago; acidose metabólica; refluxo gastroesofágico; distensão abdominal; massas hepáticas; câncer de esôfago; doenças de Chagas; e o pós-operatório de cirurgias abdominais (4, 6, 8,14-16).
Em relação às causas neurológicas, são referidos: as infecções (meningites, encefalites e abscessos); os acidentes vasculares encefálicos; as más formações; os traumatismos cranioencefálicos; neoplasias; hidrocefalia; doenças sistêmicas causadas por um fungo dismórfico; esclerose múltipla; e uma comorbidade do tratamento para a doença de Parkinson (4, 6, 8,16-17).
Como causas metabólicas tem-se: uremia; hiponatremia; hipocalcemia; e hipocalemia. As tóxicas são: enolismo; tabagismo; fármacos - corticoides, benzodiazepinas e por imipenem (4-5, 7, 19-20).
Classificação do Soluço
Devido a sua duração, o mesmo pode ser classificado em: agudo, transitório ou auto limitado, quando a sua duração for menor que 48 horas; persistente, com duração compreendida entre 48 horas e um mês; e intratável, com duração maior que dois meses (6, 21).
Trata-se de um transtorno normalmente benigno, mas há ocasiões que é tão intenso, frequente e duradouro, que pode causar insônia, perda de peso, bloqueio aurículo ventricular, incluindo a possibilidade de suicídio (6, 21).
O soluço pode ser classificado de acordo com as suas características e etiologias, sendo estes (6-7):
- peritonítico, devido a peritonites agudas, pancreatite hemorrágica, obstrução intestinal, tumores gástricos e dilatação gástrica aguda em pós-operatório, sendo que, quando persistente indica mal prognóstico;
- histérico, em geral aparece em mulheres com idade entre 15 e 25 anos, sendo sua frequência de 2 a 3 soluços por minuto, desaparecendo durante o sono;
- por irritação do nervo frênico, localizado ao nível do mediastino, sendo as suas principais causas as adenomegalias mediastinal por tuberculoses e por processos linfo proliferativos, podendo aparecer em forma de crises intratáveis;
- epidemias infecciosas, consideradas raras, porém podem ser fatais se não tiverem diagnóstico preciso e rápido. Os eventos são constantes durante o dia e a noite e, intratável;
- abdominal, causado por patologia intra-abdominal, e algumas vezes com irritação diafragmática direta. Incluem-se nestes os procedimentos cirúrgicos abdominais e pélvicos;
- urêmico, cujo aparecimento é raro e com mal prognóstico. O seu diagnóstico se dá em paciente com falha renal;
- medular, associado a uma patologia cerebral e medular, tendo como causas principais os tumores, as meningites e as hemorragias.
Diagnóstico
A literatura refere o diagnóstico do soluço a partir dos seguintes procedimentos (8):
- a fluoroscopia do diafragma, devido à existência de distúrbios intra-abdominais e intratorácicos ligados ao soluço crônico;
1 eletromiografia do diafragma, escaleno e dos músculos intercostais, recomendado frente à sensação de presença de globus faríngeos, podendo aparecer como resultados do: envolvimento unilateral do diafragma (hemidiafragma esquerdo), cujo enfoque será observar o trajeto do nervo frênico do lado lesado; ou do movimento diafragmático bilateral, devido a uma origem aferente ou central;
- testes laboratoriais como hemograma completo, triagem química, radiografia simples de abdômen, endoscopia e/ou radiografia de tórax, utilizados na ocorrência de sintomas orgânicos.
Tratamento para o soluço
As formas de tratamento encontram-se relacionadas às formas de soluço, ou seja, frente ao do tipo benigno aplica-se a interrupção do ciclo respiratório (segurando-se por alguns segundos a respiração; por deglutição de água; pelas manobras de Valsava; espirro; ou, pela respiração repetida dentro de um saco, pois desta forma o diafragma será forçado a voltar a funcionar juntamente com a respiração, além de aumentar a concentração de dióxido de carbono no sangue, o que habitualmente é suficiente para parar os soluços (8)).
Para o tipo benigno há, ainda, a citação da ingestão de pão duro ou gelo picado, puxar a língua para fora ou esfregar suavemente os olhos ou aplicar pressão sobre o globo ocular; o alívio da distensão do estômago pelo arroto; bater na nuca ou esfregá-la, massageando o seio carotídeo; e comprimir o peito por elevação dos joelhos ou inclinação do tronco para baixo, manobras estas suficientes para estimular o nervo vago (6).
Na ocorrência dos tipos persistentes e/ou intratáveis incluem-se os procedimentos médicos farmacológicos e cirúrgicos, sendo estes dependentes de cada caso e considerados com prognósticos reservados (8).
No tratamento farmacológico tem-se a gabapentina como o medicamento mais citado entre os autores. Trata-se de um aminoácido cíclico relacionado ao neurotransmissor GABA, que tem capacidade de ultrapassar a barreira hematoencefálica. Este fármaco pertence ao grupo de anticonvulsivantes, cujos efeitos secundários são tonturas, sonolência e fadiga (19-22).
Além da gabapentina, que age como inibidor do soluço, encontra-se o baclofeno, um miorrelaxante de ação antiespástica, que é utilizado no tratamento de lesão da medula espinal. Seu efeito terapêutico resulta da ação em locais espinais e supraespinais, reduzindo a transmissão excitatória (19-23).
Existem, ainda, citações na literatura dos fármacos clorpromazina e o omeprazol, tidos como não tão eficazes (21, 24-25).
Cirurgicamente encontra-se a colocação de marcapasso no hemi-diafragma esquerdo por via intratorácica. Este é colocado ao nível do nervo frênico esquerdo, na altura do pericárdio, através de uma toracotomia mínima. Conecta-se um eletrodo a um receptor localizado ao nível subcutâneo, cujo intuito é controlar os movimentos do diafragma pela estimulação elétrica deste nervo (26).
Outro procedimento cirúrgico é a descompressão microvascular, através da qual se realiza uma craniotomia suboccipital, lateralmente ao forame Magnum, em que a incisão se dá sobre a junção cervical medular. Este procedimento é utilizado para aliviar a pressão sobre o décimo nervo craniano e medula oblonga, resultando, em quase sua totalidade, na resolução do evento soluço (27).
A estimulação digital firme da faringe posterior, também, é descrita como uma forma de tratamento do soluço. Para esta estimulação instala-se um tubo nasogástrico para remoção do conteúdo gástrico do paciente, ao mesmo tempo em que se provoca a ablação do nervo frênico (8).
Além destes métodos, há o uso da acupuntura e da aurículo-acupuntura descritas como tratamento do soluço em casos de transplantes de coração e pulmões e de infarto agudo do miocárdio (28-30).
Relação do soluço com as funções orofaciais
Visto que, a presença do soluço e as funções respiratória e da deglutição ocorrem por uma sequência de ações musculares encadeadas, podemos inferir que a ocorrência do primeiro pode transtornar e ocasionar alterações tanto na função respiratória como na de deglutição.
Ao relacionarmos o soluço às funções respiratória e de deglutição, consideramos os dados fisiopatológicos, em que se tem o soluço como um ato contrário ao da inspiração, ocorrendo num movimento de baixo para cima, ou seja, do diafragma às pregas vocais.
Devido à ocorrência da contração involuntária do diafragma e do fechamento abrupto das pregas vocais, o soluço ocorre de forma que desorganiza a respiração e consequentemente a deglutição, pois tais funções ocorrem de forma sincrônica e interdependentes, em que, frente à primeira, há a interrupção da segunda e vice-versa.
Os dados da literatura nos permitem entender que um indivíduo que tenha alguma enfermidade de esôfago, tenha maior possibilidade de apresentar esse ato involuntário de contração súbita do diafragma e do fechamento glótico (causando o soluço).
Ao mesmo tempo, por ser a ocorrência do soluço devido a uma alteração do sistema nervoso, o qual envolve o nervo vago, o mesmo pode, também, interferir no processo de deglutição.
Considerando a etiologia do soluço e relacionando-a a disfagia orofaríngea, estabelecemos a interferência desta no processo de encaminhamento do bolo alimentar da boca ao estomago, podendo desencadear uma penetração laríngea e/ou aspiração e, consequentemente um quadro de pneumonia.
Já frente a sua ocorrência e a função da respiração, os dados permitem caracterizá-la como uma desorganização respiratória, dispneia, pois o soluço ocorre no momento da inspiração. Ao mesmo tempo, esta dispneia dificulta a deglutição devido a sua sincronia e interdependência.
O soluço pode, ainda, ser relacionado à produção e fluência verbal, visto que, para que a fala aconteça há a necessidade de coordenação da respiração e dos movimentos articulatórios, propiciando a fluência necessária para que a comunicação possa se efetivar.
A partir destas considerações podemos supor que se possam estabelecer ações terapêuticas fonoaudiológicas frente ao soluço, e que estas possam ser de coordenação das funções pneumofonoarticulatórias e de deglutição, viabilizando o controle respiratório, reorganizando as etapas de inspiração e expiração, diminuindo, assim, a frequência do soluço ou ampliando o tempo entre os eventos, aumentando os tempos máximos de fonação, além da coordenação com a função da deglutição, estipulando-se procedimentos que tornem a apneia da deglutição consciente e de tempo maior, de forma a permitir a sincronia entre essas funções orais.
As interferências nas funções estomatognáticas e as ações terapêuticas fonoaudiológicas frente a este evento não são descritas na literatura, mas são realizadas na ação junto ao leito, complementando o tratamento medicamentoso.
COMENTÁRIOS FINAIS
Define-se o soluço como uma contração violenta, repentina, súbita de um grupo de músculos inspiratórios e especialmente do diafragma, com o fechamento simultâneo da glote, produzindo um som audível característico de qualidade acústica rouca.
O mecanismo reflexo do soluço está ligado ao caminho aferente dos nervos vago e frênico e de fibras simpáticas que inervam os órgãos do peito, no abdômen, entre outros, efetivado por estimulação do sistema nervoso central, podendo gerar desordens psicogênicas e/ou metabólicas, já descritas na literatura.
O mesmo pode ter a duração até 48 horas, quando benigno e/ou autolimitado, mas pode ser um sintoma de uma doença crônica e necessitar de tratamento diferenciado, sendo denominados como persistentes e/ou recorrentes, com duração ate um mês e intratável, cuja duração é superior a dois meses, não tendo função fisiológica conhecida.
Entre as suas causas encontram-se os acometimentos: no sistema nervoso central - neoplasias, infecções e acidentes vasculares encefálicos; tóxico-metabólicos; irritação dos nervos frênico e vago; cirúrgicos; e fatores psicogênicos.
Considerando que o soluço provoca uma disfunção no sistema respiratório e dado a sua frequência e seu tempo de duração, podemos inferir comprometimento quanto aos aspectos fonoaudiológicos ligados a alimentação e a função respiratória, causando assim uma dispneia, uma possível disfagia e alterações de fala, passíveis de serem reorganizadas através de procedimentos terapêuticos.
Na prática clínica da fonoaudiologia junto ao leito encontramos alguns pacientes com tais características. Em virtude desta observação clínica e da escassa referência bibliográfica sobre este evento na literatura cientifica em fonoaudiologia, não havendo referência deste, nem de suas consequências ligadas à fonoaudiologia, torna-se necessária a busca de informações que possam auxiliar este profissional frente a sua ocorrência, no intuito de reconhecer possibilidades de alterações miofuncionais orofaciais relacionadas ao mesmo e estabelecer o tratamento adequado.
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1 Doutoranda em Gerontologia Biomédica. Professora e Supervisora Clínica. 2 Fonoaudióloga Clínica.
Instituição: Faculdade de Fonoaudiologia do Centro Universitário Metodista IPA. Porto Alegre / RS - Brasil. Endereço para correspondência: Maria Cristina de Almeida Freitas Cardoso - Avenida Eduardo Prado, 695 - Casa 37 - Porto Alegre / RS - Brasil - CEP: 91751-000 - Telefone: (+55 51) 3316-1206 - E-mail: mccardoso@via-rs.net
Artigo recebido em 20 de Maio de 2009. Artigo aprovado em 4 de Julho de 2009.
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