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Ano: 2011  Vol. 15   Num. 2  - Abr/Jun
DOI: 10.1590/S1809-48722011000200012
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Avaliação Postural da Coluna Vertebral em Crianças e Adolescentes com Deficiência Auditiva
Postural Evaluation of Vertebral Column in Children and Teenagers with Hearing Loss
Author(s):
Renato de Souza Melo1, Polyanna Waleska Amorim da Silva2, Lícia Vasconcelos Carvalho da Silva3, Carla Fabiana da Silva Toscano4.
Palavras-chave:
avaliação, coluna vertebral, perda auditiva, postura, surdez.
Resumo:

Introdução: A postura é determinada pela atuação dos sistemas, visual, somatosensorial e vestibular. As crianças com deficiência auditiva podem apresentar problemas na postura ou no controle postural, favorecendo o surgimento de desvios e alterações posturais na coluna vertebral, provocados possivelmente pela hipoatividade do sistema vestibular, em decorrência da surdez. Objetivo: Avaliar a postura da coluna vertebral em crianças e adolescentes com deficiência auditiva em idade escolar, considerando o gênero e a idade da amostra. Método: Foi realizado um estudo descritivo, prospectivo, na Escola Duque de Caxias e no Centro de Reabilitação & Educação Especial Rotary, localizadas no município de Caruaru-PE. Foram avaliados 44 escolares com deficiência auditiva com faixa etária entre 7-17 anos, sendo 22 do gênero feminino e 22 do gênero masculino. O estudo foi desenvolvido por meio de uma avaliação postural, com o uso de um simetrógrafo, marcação de pontos anatômicos específicos com adesivos dispostos sobre esferas de isopor e afixados com fita adesiva dupla face. Resultados: Os resultados apontaram que todos os sujeitos avaliados neste estudo apresentaram algum tipo de alteração postural na coluna vertebral. A escoliose foi a alteração mais observada entre os estudantes (84,1%), seguida da hipercifose torácica (68,2%). Conclusão: Conclui-se que crianças e adolescentes com deficiência auditiva estão sujeitos a desenvolver alterações posturais na coluna vertebral. Tal condição pode estar associada a um somatório de fatores que envolvem a ergonomia desfavorável do ambiente escolar, maus hábitos posturais e o acometimento do aparelho vestibular em virtude da perda auditiva.

INTRODUÇÃO

Os primeiros anos de vida da criança são caracterizados por diversas modificações em seu crescimento e desenvolvimento (1). O período compreendido entre o nascimento e o final do primeiro ano de vida é considerado um dos mais críticos para o desenvolvimento neuropsico¬motor da criança (2).

Um grande marco no desenvolvimento motor infantil é a evolução do controle postural, pois os lactentes aumentam suas possibilidades de exploração e interação com o meio ambiente à medida que começam a estabilizar a cabeça por volta do 3º mês de vida (3). A seguir, verifica-se um aprimoramento no controle postural, sendo que entre o 6º e o 7º mês muitos lactentes já são capazes de sentar por breves períodos com apoio dos braços (4). Após dois meses, entre o 8º e o 9º mês, o lactente adquire a habilidade para sentar-se sem apoio; e por fim, entre o 12º e o 15º mês surge o controle postural independente (5).

A manutenção da posição em pé envolve ajustes corporais constantes e coerentes com o objetivo de manter os segmentos corporais alinhados e orientados adequadamente. Na situação de alinhamento postural adequado, as estruturas musculoesqueléticas estão equilibradas, portanto, menos propensas a lesões ou deformidades (6). Esta tarefa requer um intrincado relacionamento entre informações sensoriais e ação motora (7).

As principais fontes de informação sensorial para o funcionamento do controle postural satisfatório são os sistemas visual, somatosensorial e vestibular (8). Esse emaranhado de informações de cada sistema sensorial ocorre de forma seletiva, aumentando a importância de um sistema mais útil e diminuindo a importância daquele ou daqueles sistemas menos úteis para a manutenção e regulação da postura (9, 10).

De acordo com HORAK & MACPHERSON (11), o sistema de controle postural identifica as informações sensoriais provenientes dos três canais sensoriais e produz respostas motoras eficientes para que a posição desejada seja alcançada ou mantida. Se um dos canais sensoriais não fornece a informação sensorial adequada, a dinâmica de funcionamento do sistema postural pode estar alterada. Neste caso, o sistema de controle da postura parece não conseguir um relacionamento coerente e estável entre informação sensorial e ação motora e consequentemente, o desempenho motor pode apresentar-se prejudicado, como nas crianças com perda auditiva.

O sistema vestibular é um órgão com dupla função, sendo a cóclea responsável pela audição e o vestíbulo pela regulação do controle postural e do equilíbrio (12). No entanto, a capacidade de ouvir, é, na verdade, uma característica secundária, a responsabilidade primeira do órgão auditivo é a manutenção e regulação do controle postural e do equilíbrio (13). Devido à proximidade anatômica das estruturas responsáveis pelas funções auditivas e vestibulares, é comum encontrarmos alterações associadas em ambos os sistemas, deste modo, é razoável presumir que muitas crianças surdas têm problemas vestibulares concomitantes à perda auditiva (14). Além disso, estudos demonstram que a hipoatividade do aparelho vestibular é um achado frequente em avaliações otoneuro¬lógicas em crianças com deficiência auditiva, gerando nestas crianças transtornos vestibulares (15, 16, 17).

Desta forma, pressupõe-se que crianças com defi¬ciên¬cia auditiva podem desenvolver estratégias posturais para superar ou compensar as dificuldades de equilíbrio, elegendo uma determinada postura, com o objetivo de obter uma maior estabilidade corporal, podendo com isso desenvolver as alterações posturais na coluna vertebral. Em longo prazo, estes padrões posturais inadequados culminam na aceleração do processo de degeneração do sistema musculoesquelético, causando dor e predispondo às afecções da coluna vertebral no adulto (18).

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi avaliar a postura da coluna vertebral de crianças e adolescentes com deficiência auditiva considerando os gêneros e a idade da amostra estudada e identificar sintomatologia dolorosa no grupo.


MÉTODO

Este estudo descritivo foi desenvolvido no período de fevereiro a julho de 2009. Participaram deste estudo 44 voluntários, agrupados a partir de uma amostra por conveniência, composta por crianças e adolescentes com deficiência auditiva, recrutados da Escola Duque de Caxias e do Centro de Reabilitação & Educação Especial Rotary, escolas da rede estadual de ensino, localizadas no município de Caruaru-Pernambuco.

Os voluntários foram divididos em dois grupos, nomeados assim: Grupo DAF (Deficientes Auditivos Femininos) e grupo DAM (Deficientes Auditivos Masculinos). Cada grupo foi composto por 22 escolares com idade entre 7 e 17 anos, com 2 representantes de cada idade por grupo.

Os critérios de exclusão do estudo para ambos os grupos foram: apresentar qualquer outra deficiência associada (física, mental, visual e/ou paralisia cerebral) ou apresentar discrepância maior que 2 cm em membros inferiores, obtido por meio dos teste de medida real e medida aparente realizado previamente pelos avaliadores.

Os critérios de inclusão no estudo para ambos os grupos foram; estar regularmente matriculado em uma das escolas colaboradoras com a pesquisa, encontrar-se na faixa etária pretendida pelo estudo e apresentar o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) devidamente assinado pelo pai ou responsável pela criança ou adolescente.

Para a aquisição dos dados os voluntários foram submetidos a uma avaliação postural da coluna vertebral, realizada por fisioterapeutas, de forma individual, por meio de um simetrógrafo e marcação de pontos anatômicos específicos, sendo fotografados em seguida, segundo critérios propostos por KENDALL, MCCREARY & PROVANCE (6), POLITANO (19) e KISNER & COLBI (20). Tais critérios possibilitam a avaliação da postura e identificação de alterações e desvios na coluna vertebral, como a escoliose, hipercifose torácica, hiperlordose na coluna cervical e coluna lombar.

Para a avaliação postural o escolar posicionou-se na posição ortostática, descalço à frente do simetrógrafo da marca Carci®, numa distância de 20cm da parede, trajando roupa de banho, (short para os meninos e short e top para as meninas), tendo pontos anatômicos específicos demarcados com adesivos coloridos da marca Pimaco®, dispostos sobre esferas de isopor de 1cm de diâmetro e afixados com fita adesiva dupla face da marca Cremer®.

Os pontos anatômicos marcados foram: glabela, trago, mento, acrômio, manúbrio do esterno, processo espinhoso de C7, processo espinhoso de T3, ângulo inferior da escápula, epicôndilo lateral do úmero, espinha ilíaca ântero-superior, espinha ilíaca póstero-superior, trocânter maior do fêmur, linha articular do joelho, ponto medial da patela, ponto sobre a linha média da perna, tuberosidade da tíbia, maléolo lateral, maléolo medial, tendão calcâneo, ponto sobre o calcâneo, ponto entre a cabeça e o 2º e 3º metatarso.

Foi observada ainda, a presença da sintomatologia dolorosa nos músculos da coluna vertebral dos escolares avaliados, usando critérios propostos por PALMER (21). Os procedimentos constaram de palpação digital dos processos transversos da coluna vertebral do escolar avaliado no sentido crânio-caudal. Os avaliadores instruíram os voluntários a levantarem um braço quando a palpação digital referisse dor e desse modo foi relatada a sintomatologia dolorosa na coluna vertebral pelos escolares avaliados deste estudo.

As orientações que antecederam o exame, a avaliação postural e a avaliação da dor foram previamente explicadas pelos pesquisadores aos voluntários por meio da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), por um dos pesquisadores que é intérprete de LIBRAS.

Os dados foram organizados e descritos com o auxílio do Software Packstage Statistical Science (SPSS) versão 11.5, sendo os resultados expressos em percentual de frequência. Este estudo foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Associação Caruaruense de Ensino Superior - ASCES, conforme o protocolo final de
nº 068/08 CEP/ASCES de acordo com a resolução 196/96 do conselho nacional de saúde.


RESULTADOS

Este estudo avaliou a postura da coluna vertebral de 44 estudantes com deficiência auditiva com idade média de 12±3,2 anos e identificou um índice elevado de alterações posturais nos escolares estudados, considerando-se os resultados apresentados.

Os resultados obtidos na presente pesquisa revelaram que todos os voluntários apresentaram pelo menos algum tipo de alteração postural na coluna vertebral.

A escoliose foi a alteração postural mais observada entre as crianças e adolescentes avaliados, estando presente em 84,1% estudantes com mais evidência na faixa etária de 7 a 14 anos no gênero masculino (Figura 1 e Tabela 1).

A hipercifose torácica aparece como a segunda alteração postural mais ocorrente entre estudantes com deficiência auditiva (68,2%) também mais evidente no gênero masculino na faixa etária de 7 a 14 anos (Gráfico 1 e Tabela 1).

Por outro lado, a hiperlordose lombar foi a alteração menos observada na amostra, mais frequente no gênero feminino e na faixa etária de 7 a 10 anos (Tabela 1 e Gráfico 1).

Na investigação da dor, os resultados mostraram que 36,4% dos estudantes avaliados apresentam sintomatologia dolorosa na coluna vertebral (Gráfico 2).

Com relação a distribuição da dor entre os gêneros, os estudantes do gênero masculino queixaram-se mais de dores na coluna vertebral (45%) que as estudantes do gênero feminino (27%) (Gráficos 3 e 4).






Gráfico 1. Distribuição (%) dos tipos de alterações posturais na coluna vertebral em crianças e adolescentes com deficiência auditiva da amostra (n=44).




DISCUSSÃO

Este estudo avaliou a postura de 44 estudantes com deficiência auditiva e identificou um índice elevado de alterações posturais nos escolares estudados.

Com relação à ocorrência de alterações posturais de um modo geral, todas as crianças com deficiência auditiva apresentaram alterações posturais, corroborando com o estudo de VASCONCELOS et al (22), que avaliaram a postura da coluna vertebral de 32 estudantes com deficiência auditiva, na faixa etária de 7-21 anos e relataram que 90,62% da amostra estudada apresentaram alterações posturais na coluna vertebral.

Analisando os tipos de alterações posturais observadas entre os estudantes deste estudo, a escoliose foi o tipo de alteração mais observada (84,1%), sendo mais evidente no gênero masculino e na faixa etária entre 7-14 anos. Corroborando com estes resultados, VASCONCELOS et al (22) observaram que 37,5% dos estudantes apresentavam escoliose e a faixa etária entre 7-12 anos foi onde ocorreram os maiores índices desse desvio patológico, no entanto, nesse estudo o gênero feminino apresentou maior ocorrência desta alteração postural.

Os resultados obtidos em relação à escoliose neste estudo foram superiores a estudos que avaliaram a postura de escolares ouvintes que utilizaram a mesma metodologia adotada neste estudo. FORNAZARI (23) que estudou a prevalência de escoliose em 655 estudantes sem deficiência auditiva, com a mesma faixa etária deste estudo, detectou a presença de escoliose em 26% da amostra estudada, o autor acredita que as alterações posturais podem ter ligação com fatores ligados ao ambiente escolar. Já, BIASOTTO & GODOY GOMES (24) que analisaram a postura de 66 escolares sem deficiência auditiva, com idade entre 12-16 anos, de ambos os gêneros, relatam que 65,1% dos escolares avaliados apresentaram escoliose.

Divergindo desses resultados, o estudo de SANTOS et al (25) que também avaliou a postura de escolares sem deficiência auditiva, na faixa etária de 6-12 anos de ambos os gêneros, mostrou que a escoliose esteve presente em 15,7% dos escolares avaliados, os autores concluíram que o surgimento da escoliose pode estar associada ao predomínio do estudante ser destro ou canhoto, que poderia promover uma hipertrofia muscular mais acentuada e elevação no ombro no lado dominante, ou pelo uso de mochilas escolares utilizadas, frequentemente, de modo desproporcional no caso do apoio em um único ombro. Esteves (26) relata que a escoliose é o tipo de desvio postural mais comum em escolares em ambos os gêneros, concordando com os resultados deste estudo.

A hipercifose torácica foi a segunda alteração postural mais prevalente neste estudo (68,2%), sendo mais observada no gênero masculino com idade entre 7-14 anos. Corroborando com estes dados, o estudo de VASCONCELOS et al (22) que também avaliou a postura de estudantes com deficiência auditiva, mostra que a hipercifose torácica foi alteração mais ocorrente (75%), tendo a mesma distribuição entre os gênero (50%) e maior frequência na faixa etária de 7-12 anos, concordando com os resultados deste estudo.

A prevalência da hipercifose torácica observada neste estudo, foi superior aos estudos que avaliaram a postura de crianças sem deficiência auditiva, BIASOTTO & GODOY GOMES (24) avaliaram a postura de escolares de ambos os gêneros, com idade entre 12-16 anos e relatam que 49,9% da amostra do seu estudo apresentaram hipercifose torácica. Divergindo do estudo de BIASOTTO & GODOY GOMES (24), o estudo de SANTOS et al (25) que também analisou a postura escolares sem deficiência auditiva, na faixa etária de 6-12 anos, de ambos os gêneros, detectou a hipercifose torácica em 9,1% da sua amostra. MORO (27) que avaliou em seu estudo a postura sentada de 200 escolares ouvintes do ensino público de Florianópolis/SC, identificou que, dos padrões posturais assumidos em sala de aula, as crianças sentam-se a maior parte do tempo com o tronco flexionado e utilizam o uso das mãos sobre o queixo durante as atividades na carteira escolar, o que poderia favorecer a postura hipercifótica da coluna torácica entre os escolares.

A hiperlordose lombar foi a alteração postural menos observada nos estudantes avaliados desta pesquisa (29,1%), com maior ocorrência no gênero feminino e maior frequência na faixa etária entre 7-10 anos. Corroborando com estes dados, VASCONCELOS et al (22) relatam que a hiperlordose lombar foi a segunda alteração postural mais prevalente entre os estudantes com deficiência auditiva avaliados em seu estudo, observada em 50% da amostra, tendo a mesma distribuição entre os gêneros (50%) sendo mais frequente na faixa etária de 7-12 anos.

Do mesmo modo, BIASOTTO & GODOY GOMES (24) relataram que a hiperlordose lombar também foi a alteração menos prevalente entre escolares sem deficiência auditiva em seu estudo, com ocorrência de 42,4%. SANTOS et al (25) relatam que a ocorrência de hiperlordose lombar em seu estudo que avaliou escolares sem deficiência auditiva foi de 26,3%, com maiores índices na faixa etária ente 9-13 anos. Segundo DETSCH & CANDOTTI (28), até os nove anos, a presença de hiperlordose lombar é considerada normal no desenvolvimento motor infantil, uma vez que não há estabilidade postural, o que geraria a busca pelo equilíbrio corporal por protrusão abdominal e inclinação pélvica anterior.

Além dos fatores associados ao ambiente e à ergonomia escolar, outro aspecto importante que poderia favorecer o surgimento dos desvios posturais encontrados nos estudantes avaliados neste estudo são os achados de GUILDER & HOPKINS (29), que avaliaram crianças deficientes auditivas, mediante estímulos rotatórios e acharam resultados dos exames labirínticos variados, afirmando que crianças com deficiência auditiva apresentavam frequentemente hipoatividade do sistema vestibular. Os autores ressaltam ainda, que a hipoatividade vestibular é mais observada em crianças com graus de perda auditiva profunda e severa. Esses resultados concordam com o estudo de ALCOHOLADO (30), que avaliou 7 crianças portadoras de deficiência auditiva por meio da vectoeletronistagmografia computadorizada e observou que 6 crianças obtiveram resposta de hipoexcitabilidade do sistema vestibular. O autor sugere ainda que todo paciente com diagnóstico clínico de perda auditiva, independente da idade e do gênero, deve submeter-se a exames vestibulares, mesmo na ausência de vertigens e tonturas.

Para SHUMWAY-COOK & WOOLLACOTT (31) o período mais crítico para o desenvolvimento do controle postural está entre 4 e 6 anos de idade. A organização sensorial nesta fase consiste na capacidade do sistema nervoso central de selecionar, suprir e combinar os estímulos vestibulares, visuais e proprioceptivos fornecendo a orientação postural adequada. Tal afirmação parece justificar os resultados deste estudo, onde crianças com deficiência auditiva apresentaram alterações posturais na coluna vertebral desde a infância até a adolescência, o que nos leva a sugerir que possivelmente os adolescentes deste estudo podem ter adotado padrões posturais inadequados na infância e que sem informação, tratamento específico e intervenções, estas posturas compensatórias foram acompanhando-os, ano após ano, podendo instalar-se de forma definitiva com a maturação músculo esquelética na vida adulta.

Analisando a ocorrência da sintomatologia dolorosa nos escolares avaliados deste estudo, 36,4% referiram dores na região da coluna vertebral durante a palpação digital realizada pelos fisioterapeutas. O gênero masculino apresentou maior ocorrência de dores na coluna vertebral (45%), que o gênero feminino, cuja frequência de dor foi de 27%.

Neste estudo o gênero masculino apresentou maior distribuição de alterações posturais na coluna vertebral de um modo geral, levando-nos a concordar com RESENDE et al (18), que afirmou que as alterações posturais podem levar à degeneração do sistema musculoesquelético representados por quadros álgicos. O estudo de VASCONCELOS et al (22) também avaliou a sintomatologia dolorosa na coluna vertebral entre os escolares com deficiência auditiva e mostrou que a dor esteve presente em 86,2% dos avaliados. Não houve nesse estudo associação entre a dor e o gênero, entretanto, os autores associaram a dor às alterações posturais, e observaram que a dor esteve mais presente entre os estudantes que apresentaram a hipercifose torácica (91,7%), sendo esta alteração a mais prevalente entre os estudantes desse estudo, corroborando com a afirmação de RESENDE et al (18).

Segundo KENDALL, MCCREARY E PROVANCE (6), a dor surge a partir do acúmulo de sobrecargas biomecânicas repetidas por um período longo. Detsch et al (28) relataram ainda, que muitas posturas corporais adotadas no dia a dia interferem nas estruturas anatômicas, aumentando o estresse sobre a coluna vertebral, provocando desconfortos, as dores e as incapacidades funcionais.

De acordo com estes dados, observa-se que crianças e adolescentes com deficiência auditiva estão sujeitos a desenvolver alterações posturais na coluna vertebral. Além dos fatores de risco do ambiente escolar, como proporções inadequadas do mobiliário, do transporte inadequado do material e da mochila escolar, dos maus hábitos posturais em atividades diárias, como por exemplo: ver televisão, jogar vídeo-game e usar o computador, os escolares com deficiência auditiva apresentam ainda acometimento do sistema vestibular concomitante à perda auditiva, provocando alterações na atividade deste sistema sensorial que é um dos três sistemas responsáveis pela regulação do controle postural. Desta forma, as crianças com deficiência auditiva podem apresentar dificuldades na regulação do controle postural, ou essa regulação parece encontrar-se descoordenada. Tal fato poderia justificar os altos índices de alterações posturais na coluna vertebral observados nos escolares com deficiência auditiva avaliados neste estudo.

O controle postural satisfatório é fundamental para o sucesso de grande parte das tarefas diárias. O conhecimento dos aspectos neurológicos e biomecânicos deste controle tem implicações diretas para a fisioterapia, justificando a importância de pesquisas futuras que abordem este tema. São escassos na literatura estudos que avaliaram a postura e a sintomatologia dolorosa da coluna vertebral em crianças com deficiência auditiva, limitando os autores a aprofundarem-se mais na discussão deste estudo.




Gráfico 2. Ocorrência da sintomatologia dolorosa na coluna vertebral em crianças e adolescentes com deficiência auditiva da amostra (n= 44).




Gráfico 3. Ocorrência da sintomatologia dolorosa na coluna vertebral entre as crianças e adolescentes com deficiência do gênero masculino da amostra (n=22).




Gráfico 4. Ocorrência da sintomatologia dolorosa na coluna vertebral entre as crianças e adolescentes com deficiência auditiva do gênero feminino da amostra (n=22).




CONCLUSÕES

Neste estudo observou-se uma elevada frequência de alterações posturais em escolares com deficiência auditiva, com menor ocorrência de sintomatologia dolorosa na amostra.

Esses dados ressaltam a necessidade de desenvolver programas preventivos e medidas terapêuticas adequadas ainda no ambiente escolar, prevenindo o surgimento das alterações posturais, restabelecendo o padrão postural nos escolares que já apresentam assimetrias posturais, fornecendo um padrão postural adequado às crianças com deficiência auditiva.

O fisioterapeuta pode intervir nestes distúrbios ainda na infância, com atuações em escolas, instituições que atendem esta população e em equipes interdisciplinares, o que reforça a importância deste profissional no ambiente escolar.

Tais intervenções poderiam ser incorporadas no dia-a-dia de escolas e instituições que atendem esta população, buscando adequar ou aprimorar o desempenho motor, postural e a qualidade de vida de crianças e de adolescentes com deficiência auditiva.


AGRADECIMENTOS

Ao gestor da Gerência Regional de Educação do Agreste de Pernambuco pelo consentimento para a realização da pesquisa; às gestoras da Escola Duque de Caxias, e do Centro de Reabilitação e Educação Especial Rotary, pelo espaço cedido aos pesquisadores para a coleta dos dados; aos pais, que concordaram na participação dos seus filhos nesta pesquisa e aos escolares que participaram deste estudo.


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1 Fisioterapeuta. Graduado pela Associação Caruaruense de Ensino Superior (ASCES), Caruaru / PE. Mestrando em Fisioterapia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife / PE.
2 Fisioterapeuta. Graduada pela Associação Caruaruense de Ensino Superior (ASCES), Caruaru / PE.
3 Fisioterapeuta. Doutoranda em Saúde da Criança e do Adolescente pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Docente do curso de Fisioterapia da Associação Caruaruense de Ensino Superior (ASCES), Caruaru / PE.
4 Fisioterapeuta. Mestre em Ciências Biológicas (Fisiologia) pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Docente do curso de Fisioterapia da Associação Caruaruense de Ensino Superior (ASCES), Caruaru / PE.

Instituição: Associação Caruaruense de Ensino Superior (ASCES). Caruaru / PE - Brasil. Endereço para correspondência: Renato de Souza Melo - Rua Avelino Cândido, 32 - Salgado - Caruaru / PE - Brasil - CEP: 55018-070 - Telefone: (+55 81) 3722-6966 - E-mail: renatomelo10@hotmail.com

Artigo recebido em 10 de Janeiro de 2011. Artigo aprovado em 6 de Fevereiro de 2011.
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