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Ano: 2011  Vol. 15   Num. 4  - Out/Dez
DOI: 10.1590/S1809-48722011000400011
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Cauterização química das conchas nasais inferiores com ácido tricloroacético
Chemical cautery of the inferior turbinates with trichloroacetic acid
Author(s):
Alexandre Fernandes de Azevedo1, Dário Antunes Martins2, Caroline Guimarães Cardoso3, Itamar Fernando Cândido de Moraes3, Luciane Maria Pereira Michel3, Laura Hora Rios Leite4.
Palavras-chave:
cauterização, obstrução nasal, ácido tricloroacético.
Resumo:

Introdução: Obstrução nasal crônica secundária a hipertrofia das conchas nasais inferiores é um sintoma comum, de importante morbidade em nosso meio. Várias técnicas cirúrgicas são descritas para os casos refratários aos tratamentos clínicos, porém, há controversas sobre qual delas é a mais efetiva e sujeita a menos complicações. Objetivo: Avaliar a eficácia, a segurança e exequibilidade do uso do ácido tricloroacético ambulatorial para o tratamento da hipertrofia dos cornetos inferiores. Método: Trabalho prospectivo com 29 pacientes que foram submetidos à técnica ambulatorial de infiltração de ácido tricloroacético a 30% submucosa dos cornetos inferiores, sob anestesia tópica. Foram avaliados os sintomas de rinorreia e obstrução nasal utilizando escala visual e analógica (EVA 010) pré cauterização e um ano pós procedimento. Resultados: Diminuição significativa da obstrução nasal e da rinorreia um ano pós procedimento. As complicações foram sinéquias leves em dois pacientes e sangramentos, de pequena monta, em quatro casos com resolução espontânea. Conclusão: O método proposto apresentou ótimos resultados quanto à obstrução nasal e rinorreia, pode ser realizado em ambiente ambulatorial, e vem nos mostrando ser de baixa complicação.

INTRODUÇÃO

Hipertrofia dos cornetos inferiores é causa comum de obstrução nasal crônica. Pode ser desencadeado por processos inflamatórios, incluindo a rinite alérgica e a não alérgica. Ocasiona morbidade significativa, uma vez que determina impacto negativo sobre as vias aéreas inferiores, prejuízo no desenvolvimento craniofacial em crianças e adolescentes, na qualidade do sono e suas consequências e alterações na fala e na linguagem.

Corticosteroides e descongestionantes sistêmicos e tópicos, assim como sintomáticos, são usados no tratamento desta afecção, porém, a cirurgia torna-se necessária quando não se alcança resultado satisfatório com o tratamento clínico.

Várias técnicas cirúrgicas das conchas nasais inferiores já foram descritas: eletrocauterização, crioterapia, laser, radiofrequência, turbinectomia parcial ou total, turbinoplastia, mas permanecem controvérsias quanto a que oferece melhores resultados e menores complicações. O ácido tricloroacético, também conhecido como ácido tricloroetanoico, é um análogo do ácido acético, considerado seguro pelo CPDB (carcinogenic potency database). Seu uso é vasto, sendo utilizado na pele ou em mucosas por várias especialidades médicas.

O objetivo principal deste estudo é avaliar a eficácia da cauterização química das conchas inferiores com ácido tricloroacético quanto a rinorreia e obstrução nasal. Estudamos também as complicações, tolerância, viabilidade e tempo do procedimento.


MÉTODO

Nesse ensaio clínico foram selecionados 29 pacientes com quadro de obstrução nasal e/ou rinorreia serosa persistente, que apresentavam indicação de tratamento cirúrgico para correção de hipertrofia de cornetos inferiores. Os indivíduos foram atendidos ambulatorialmente, no período de janeiro de 2007 a dezembro de 2009. O projeto foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da instituição, protocolo número 043/2007.

Foram incluídos na pesquisa indivíduos de ambos os sexos, entre 12 e 60 anos de idade, com hipertrofia de cornetos inferiores e sem resposta ao tratamento clínico com corticosteroides tópicos nasais. Foram excluídos: pacientes incapazes de fornecer respostas consistentes, mulheres grávidas, indivíduos submetidos à cirurgia nasal prévia ou que apresentassem alergia aos componentes utilizados no tratamento. Após a análise dos fatores de inclusão e exclusão e a concordância com o termo de consentimento livre e esclarecido, era agendada a data da intervenção. Antes da realização do procedimento os pacientes eram orientados a quantificar, através de escala análogovisual, a gravidade da obstrução nasal e/ou rinorreia. A pontuação variava de 0 a 10, sendo 0 a ausência do sintoma e 10 sua maior expressão. Após o procedimento o indivíduo era orientado a utilizar a mesma escala para quantificar a dor causada pelo método. As intervenções consistiam, em primeiro lugar, a retração dos cornetos com nafazolina 0.5 % e a anestesia local com neotutocaína 2% seguida de xilocaína 10% por 10 minutos. A seguir, era realizada a infiltração de 0,03 mL de ácido tricloroacético a 30% através de seringa de insulina e agulha raquidiana número 22, em três pontos do corneto inferior: cauda, porção média e cabeça.

A graduação dos sintomas iniciais foi comparada com a avaliação feita após 12 meses da realização do procedimento. Foi também avaliada a dor causada pela infiltração. Os testes estatísticos utilizados foram ANOVA seguido do teste t student.


RESULTADOS

Dos 29 pacientes submetidos ao procedimento, 17 completaram a avaliação um ano após o procedimento.

Com relação à obstrução nasal, foi observada melhora estatisticamente significante na avaliação do sintoma pela escala análogovisual que antes do procedimento apresentava média de 7,9 (± 0,5) pontos pela EVA e na avaliação após 1 ano evidenciou média de 2,5 (± 0.7) pontos.

Os resultados da avaliação do sintoma rinorreia evidenciaram uma queda no valor da média da pontuação da EVA de 4,6 (± 0,9) pontos antes da cauterização para 1,8 (± 0,5) pontos na avaliação realizada 1 ano depois.

Em relação à dor causada pelo procedimento, observamos uma média de 6.8 (± 0.7) pontos pela EVA. O sintoma não se estendeu por mais de 24 horas após o procedimento. Foram observadas sinéquias em 2 casos, que se mostraram de pequena magnitude, sendo corrigidas no próprio ambulatório, nas consultas subsequentes. Ocorreu epistaxis em quatro casos, como quadros leves e de resolução espontânea.


DISCUSSÃO

A obstrução nasal foi queixa comum aos 17 pacientes que completaram a nossa avaliação, e em todos eles, foi relatado algum grau de melhora. Utilizando a escala análogovisual, percebemos que a média de obstrução encontrada antes do procedimento era de 7,9 (± 0,5) e caiu para 2,5 (± 0,7). Resultados semelhantes são por outros autores (1, 2,3), porém, nesses estudos, a aplicação do ácido tricloroacético era realizada topicamente no corneto inferior e em concentração mais elevada, de 80%.

Quase todos os pacientes relataram diminuição da rinorreia, com índice na escala análogovisual inicial de 4,6 (± 0,9), caindo para 1,8 (± 0,5) após um ano do procedimento. YAO et al. (4) também observaram melhora de outros sintomas da rinite alérgica, como rinorreia e espirros, após a aplicação de ácido tricloroacético, e demonstraram em pesquisa recente, que ocorria diminuição da infiltração mucosa de células T, tipo Th2, reconhecidamente responsáveis pela resposta alérgica da rinite, após a utilização tópica de ácido tricloroacético, sugerindo que a migração das mesmas talvez fosse inibida pela ação local do ácido.

A comparação da infiltração dos cornetos com esteroides e toxina botulínica apresentada por YANG et al. (5) demonstrou que a toxina é mais segura e eficiente do que os esteroides no tratamento da rinite alérgica com hipertrofia de cornetos, diminuindo a obstrução nasal, rinorreia, espirros e prurido, porém, o efeito tem duração limitada (20 semanas), e devemos avaliar que o seu custo é alto. Em nosso estudo após um ano do procedimento, a melhora foi significativa e o custo da solução de ácido tricloroacético é reduzido.

A infiltração dos cornetos inferiores com ácido tricloroacético mostrou-se segura e com poucas intercorrências. Apenas dois pacientes apresentaram sinéquias, resolvidas em regime ambulatorial. Não houve história de sangramento importante, ocorrências frequentes nos procedimentos de turbinectomia ou turbinoplastia. A dor teve resolução espontânea em menos de 24 horas. Não ocorreram complicações maiores, como as associadas à infiltração de esteroides que, apesar de ser uma prática antiga em otorrinolaringologia, pode levar a perda visual, transitória ou permanente, como descrito por MARTIN et al (6) e MABRY et al. (7). A incidência deste fato é baixa, estimada em 0,006% , mas o efeito pode ser devastador.O mecanismo provavelmente deve-se a embolização de arteríolas da retina, que sofrem essa injúria devido ao fluxo retrógrado das anastomoses entre as artérias etmoidais anteriores e posteriores com a artéria oftálmica. Essa grave complicação não ocorreu em nossa pequena casuística, mas, devido às características físicoquímicas dos ácidos, que não se disseminam á distância, é improvável ocorrer.

Com relação à dor relatada pelos pacientes a média encontrada foi de 6,8 pontos (± 0,7).

Nenhum paciente se negou a realizar o procedimento na narina contralateral e o sintoma não se estenderam por mais de alguns minutos após o procedimento. Devemos rever o tempo prévio de anestesia, bem como tentar outros agentes anestésicos tópicos para maior conforto durante e após o procedimento.


CONCLUSÃO

A infiltração de ácido tricloroacético nos cornetos inferiores se mostrou segura e eficaz quanto à diminuição dos sintomas de obstrução nasal e rinorreia serosa nos pacientes estudados mesmo após um ano do procedimento. Pensamos que essa técnica pode ser uma alternativa às intervenções cirúrgicas que necessitem de anestesia geral. Novos estudos serão de grande importância, principalmente para avaliar a eficácia do método no controle da rinorreia relacionada à "Rinite do Idoso", tendo em vista que esses pacientes podem apresentar sintomas de difícil controle e frequentemente apresentam contraindicações aos procedimentos cirúrgicos.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Yao K, Shitara T, Takahashi H, Nishiyama K, Iguci Y, Yamamoto K, Okamoto M. Evaluation of activated eosinophil infiltration for the assessment of the effect of chemosurgical treatment for allergic rhinitis using trichloroacetic acid. Am J Rhinol. 1997, 11(2):1037.

2. Ünsal Tuna EE, Ã-zbek C, Koç C,Ã-zdem C. Evalution of nasal symptons and mucociliary function in patients with allergic rhinits treated with chemosurgery using trichloroacetic acid. Am J Otolaringology. 2008, 29(1):37-41.

3. Honda K, Ooki K, Makishima K. Topical Applications of Trichloroacetic Acid as Therapy for Nasal Allergy. Eur. Arch. Otorinolaryngologic. 1994, 251(Suppl. 1):S65-S67.

4. Kazuo Y, kentaro S, Dasuke U, et. al. Chemosurgery With Trichloroacetic Acid for Allergic Rhinitis: Evaluation of The Efficacy in Terms of Inhibition of Th2 Cell Infiltration. Auris Nasus Larynx. 2009, 36(3):292-299.

5. Yang TY, Jung YG, Kim YH, Jang TY. A Comparision of the Effects of Botulinum Toxin A andSteroid Injection on Nasal Allergy. Otolaryngology Head and Neck Surgery. 2008, 139(3): 367-71.

6. Martin PA, Church CA, Petti GH Jr, Hedayi R. Visual Loss After Intraturbinate SteroidInjection. OtolaryngologyHead and Neck Surgery. 2003, 128(2):280-1.

7. Mabry RL. Intranasal corticosteroid injection: Indications, technique, and complications. OtolaryngologyHead and Neck Surgery. 1979, 87:207-11.









1) Mestre em Infectologia pela UFMG. Médico Assistente da Clínica de ORL da Santa Casa de BH.
2) Otorrinolaringologista. Médico Otorrinolaringologista Assistente da Clínica de ORL da Santa Casa de BH.
3) Otorrinolaringologista.
4) Doutora em Fisiopatologia pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora Adjunta Universidade Federal de Juiz de Fora.

Instituição: Santa Casa de Belo Horizonte. Belo Horizonte / MG - Brasil. Endereço para correspondência: Alexandre Fernandes de Azevedo - Rua Perdigão Malheiros, 195 - Apto 501 - Bairro: Cidade Jardim - Belo Horizonte / MG - Brasil - CEP: 30380-050 - Telefone: (+55 31) 8863-8548 - E-mail: xandefa@hotmail.com

Artigo recebido em 11 de Abril de 2011. Artigo aprovado em 14 de Agosto de 2011.
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