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Ano: 2008  Vol. 12   Num. 3  - Jul/Set - (14º) Print:
Seção: Review Article
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Neoplasias de Glândulas Salivares
Salivary Glands Neoplasms
Author(s):
Allex Itar Ogawa1, Lucio Eidy Takemoto2, Paulo de Lima Navarro2, Rosana Emiko Heshiki3
Key words:
glândulas salivares, neoplasia, diagnóstico, tratamento salivary glands, neoplasm, diagnosis, treatment
Resumo:

Introdução: As neoplasias de glândulas salivares representam um raro e variado grupo de tumores com diferentes características. A programação terapêutica depende de um adequado diagnóstico a fim de se evitar complicações ou procedimentos desnecessários. Objetivo: Revisão da literatura com ênfase nos mais recentes avanços diagnósticos e terapêuticos. Método: Foi realizada consulta eletrônica nas bases de dados MEDLINE, OVID, PubMed e SciELO para artigos publicados entre os anos de 1997 e 2007. Conclusão: O adequado diagnóstico das neoplasias de glândulas salivares é complexo e cabe ao otorrinolaringologista/cirurgião de cabeça e pescoço a investigação do subtipo histológico para o adequado tratamento. Muitas vezes os exames diagnósticos se confrontam, exigindo avaliação cuidadosa caso-a-caso.

Abstract:

Introduction: Salivary glands neoplasms represent a rare and diverse group of tumors with different characteristics. To avoid complications and unnecessary procedures, the treatment depends on an accurate diagnosis. Objective: Review the literature emphasizing the latest advances in diagnosis and treatment. Method: An electronic research was performed on MEDLINE, OVID, PubMed and SciELO databases articles in a period between 1997 and 2007. Conclusion: The proper diagnosis of salivary glands neoplasms is complex, and the otorhinolaryngologist/head and neck surgeon needs to investigate the histological subtype to ensure ideal treatment. Frequently, diagnostic exams conflict, and careful case by case evaluation is required.

INTRODUÇÃO

As neoplasias de glândulas salivares são raras e representam um variado grupo de tumores benignos e malignos com diferentes características comportamentais (1). O diagnóstico patológico é a chave para o adequado manejo dessas lesões uma vez que o grau de agressividade depende de seus tipos histológicos (2).

Entre 1650 e 1750, as cirurgias das glândulas salivares eram limitadas para o tratamento de rânulas e cálculos orais. O conceito de exérese de tumor parotídeo foi atribuído a BERTRANDI em 1802, utilizando-se de abordagem extensa, ocasionando seqüelas funcionais e estéticas (1).

Em 1892, foi CODREANU o primeiro a realizar uma parotidectomia total com preservação do nervo facial. BEAHRS e ADSON (1958) descreveram a técnica cirúrgica para a cirurgia da parótida. Eles delimitaram os pontos anatômicos de reparo a fim de se evitar a lesão do nervo facial e defendiam a parotidectomia superficial apenas para lesões não invasivas (1).

Apesar de vastos trabalhos sobre o tema e avanços nos exames complementares e na técnica cirúrgica, o diagnóstico e o tratamento desses tumores continuam complexos e desafiadores para o otorrinolaringologista/cirurgião de cabeça e pescoço (1).


REVISÃO DA LITERATURA

Anatomia

As glândulas salivares podem ser divididas em glândulas salivares maiores, que incluem as glândulas parótidas, submandibulares e sublinguais e as glândulas salivares menores (2).

A glândula parótida é a principal e a maior delas. Está localizada próximo à orelha externa (g. para, próximo + otis, orelha), entre o ramo da mandíbula e o processo mastóideo. Acima, o leito parotídeo é limitado pelo assoalho do meato auditivo externo e o processo zigomático do osso temporal. Medialmente, há o processo estilóide do osso temporal e seus músculos associados. Lateralmente, é limitado pela lâmina superficial da fáscia parotídea e pela pele. A parede posterior estende-se entre os processos mastóideo e estilóide. A parede anterior é formada pelo ramo da mandíbula e os músculos aí fixados (masseter e pterigóide medial). Da superfície para a profundidade, as estruturas que atravessam a glândula são: o nervo facial, a veia retromandibular e a artéria carótida externa. Vascularização pela artéria carótida externa e seus ramos terminais (temporal superficial e maxilar) e inervação parassimpática pelo glossofaríngeo (3).

A glândula submandibular se localiza ao longo do corpo da mandíbula, sendo em parte superficial e em parte profunda ao músculo miloióideo. Tem formato em U e tem aproximadamente metade do tamanho da parótida. Ocupa quase todo trígono submandibular, mantendo relações com a veia facial (superficial à glândula), artéria facial (profunda à glândula) e o nervo marginal da mandíbula (corre superiormente junto ao bordo inferior da mandíbula, superficialmente à veia facial). As glândulas sublinguais localizam-se no assoalho da cavidade da boca entre a mandíbula e o músculo genioglosso. As glândulas salivares menores consistem de 600 a 1.000 pequenas glândulas independentes encontradas em toda cavidade oral, tonsilas palatinas, faringe e laringe (3).

Epidemiologia

Correspondem a aproximadamente 1% dos tumores de cabeça e pescoço, com incidência aproximada de 1,5 casos/100.000 (1). Apesar das incidências variarem de acordo com a literatura, 67,7% a 84% das neoplasias originam-se na parótida, 10% a 23% na glândula submandibular e os demais casos na glândula sublingual e nas glândulas salivares menores (2,4,5,6). Ocorrem em 95% dos casos em adultos, sendo raros em crianças (2).

Cerca de 75% das neoplasias são benignas, sendo o adenoma pleomórfico o tipo histológico mais comum (7). Quanto menor a glândula, maior a probabilidade de a neoplasia ser maligna (1): 25% dos tumores da parótida são malignos, enquanto na glândula submandibular este número sobe para 43%, chegando a 82% nas glândulas salivares menores (7).

Nas parótidas, o subtipo histológico mais comum é o adenoma pleomórfico (53,3%), seguido pelo tumor de Warthin (28,3%) e pelo carcinoma mucoepidermóide (9%). Nas demais glândulas o adenoma pleomórfico também é o mais comum (36% nas submandibulares e 43% nas sublinguais e menores), seguido pelo carcinoma adenóide cístico (25% nas submandibulares e 34% nas sublinguais e menores) e pelo carcinoma mucoepidermóide (12% nas submandibulares e 11% nas sublinguais e menores) (2).

Fatores de Risco

Os fatores etiológicos para as neoplasias das glândulas salivares em geral não estão bem definidos, mas alguns achados de pesquisas sugerem associações com:

  • Radiação: radioterapia em baixas doses tem sido implicada na patogênese do adenoma pleomórfico, carcinoma espinocelular e carcinoma mucoepidermóide após 15 a 20 anos da exposição (1). A evidência maior desta associação está na incidência aumentada destes tumores em sobreviventes de áreas expostas à bomba atômica (8).
  • Tabagismo: apesar de não estar relacionado com o desenvolvimento de carcinoma de glândulas salivares, o tabagismo tem sido associado com o tumor de WARTHIN (9).
  • Vírus Epstein-Barr: com exceção do carcinoma indiferenciado, não foi demonstrado o papel etiológico viral nas neoplasias das glândulas salivares (10).
  • Fatores Genéticos: p53 (gene supressor de tumor) e o MDM2 (oncogene) foram identificados em alta porcentagem nos carcinomas ex-adenoma pleomórfico; altos níveis do VEGF (fator de crescimento endotelial) estariam associados com maior tamanho tumoral, invasão vascular, recorrência, metástase e agressividade. Perda alélica ou translocações 12q13-15 estão associadas com o adenoma pleomórfico (1).


  • História Clínica

    Apresentam-se como massas assintomáticas de crescimento lento. Dor não é comum, mas nas neoplasias benignas pode ocorrer com infecção, hemorragia ou aumento do cisto. Nas neoplasias malignas, a dor pode ser indicativa de invasão neural, porém a dor não deve ser usada como parâmetro para diferenciação entre as neoplasias. A paralisia do nervo facial sugere fortemente tumor maligno, apesar de não ser patognomônica, uma vez que pode ocorrer pela compressão ou estiramento do nervo por tumores benignos volumosos (7). Outros sinais sugestivos de malignidade são a fixação da massa e a indefinição em relação às estruturas adjacentes (11).

    As glândulas salivares menores apresentam-se de forma variada a depender de sua localização: na cavidade oral como massas não ulceradas e não dolorosas geralmente em palato e assoalho de boca; em seios paranasais mimetizam sintomas de sinusite e de rinite; em região laringotraqueal com rouquidão, disfagia, tosse e sensação de corpo estranho; no espaço parafaríngeo são assintomáticos até atingirem um tamanho grande, rechaçando diversas estruturas periféricas, levando a disfagia e voz de "batata quente" (2).

    Pela sua baixa freqüência relativa, o pronto reconhecimento da neoplasia exige atenção do médico especialista (7). Porém não há critérios clínicos confiáveis para diferenciá-los, sendo necessário solicitar exames complementares para o adequado diagnóstico dos tumores.

    Punção Aspirativa por Agulha Fina

    As glândulas salivares maiores são facilmente acessíveis e, portanto, ótimos alvos para a punção aspirativa por agulha fina (PAAF). Esta técnica tem sido usada por décadas com grande acurácia e conquistado grande aceitação entre cirurgiões e patologistas, mas ainda permanece controversa, sem indicação formal (12).

    A PAAF é necessária na avaliação pré-operatória de todas as massas de parótida, segundo ZBÄREN et al (13) (2001) e LIN et al (14) (2007), pois o reconhecimento préoperatório do diagnóstico prepararia tanto o cirurgião como o paciente sobre o planejamento cirúrgico. GONÇALVES et al (15) (2007) mostram a importância da análise criteriosa de resultados negativos para malignidade, pois a possibilidade de processo neoplásico não é desprezível, principalmente quando se trata de diagnósticos sugeridos diferentes de adenoma pleomórfico, tumor de Warthin e lesões císticas. ALPHS et al (16) (2006) criticam o uso rotineiro do PAAF para massas parotídeas, pois o PAAF não alteraria a conduta final, porém entendem que houve avanços tanto na técnica (evitando complicações), quanto na análise (imunohistoquímica, PCR...).

    O PAAF deve ser considerado um dos primeiros passos na investigação diagnóstica das neoplasias de glândulas salivares.

    Biópsias

    Para tumores de glândulas salivares menores da cavidade oral, a biópsia geralmente é desnecessária uma vez que as lesões tendem a ser pequenas e a abordagem cirúrgica é excisional, já para os de cavidade nasal e seios paranasais, está indicada a biópsia convencional. A biópsia aberta deve ser evitada pelo risco de sangramento, implantação tumoral em outros planos e infecção local (2).

    Biópsia de congelação está indicada para garantir margem cirúrgica (2). MIANROOD et al (17) (2006) sugere fortemente que a congelação deva ser realizada em todas as cirurgias, pois modifica em muitas vezes a conduta do caso. SEETHALA et al (18) (2005) sugere que a congelação e a PAAF possuem acurácia semelhantes, com maior sensibilidade para a PAAF e maior especificidade para a congelação e, por isso, ambos os métodos são complementares um ao outro no diagnóstico das neoplasias.

    Exames de Imagem

    Os estudos radiológicos geralmente são realizados em tumores grandes e naqueles que acometem as GS menores, mas são desnecessários em pequenas massas móveis e bem definidas de parótida e submandibular. Freqüentemente, não mudam a abordagem terapêutica e não diferenciam as lesões benignas das malignas (2). YERLI et al (19) (2007) avaliaram o realce pós-contraste em tomografia computadorizada de lesões benignas e malignas de parótida em 3 fases distintas (30s, 90s e 5min), diferenciando o tumor de Warthin (pico em 30s), o adenoma pleomórfico (pico em todas as fases) e tumores malignos (pico em 90s) com essa técnica.

    Tanto a tomografia computadorizada (CT) quanto a ressonância magnética (RM) têm sensibilidades e especificidades semelhantes para avaliar a localização e a infiltração da massa tumoral e podem ser feitas para a avaliação de acometimento de espaços profundos e avaliação da glândula contralateral (1).

    Outras modalidades como a ultra-sonografia e a PET-CT não diferenciam as lesões em benignas ou malignas, não tendo função diagnóstica definida (2). A cintilografia das glândulas salivares com tecnécio tem grande acurácia no diagnóstico do tumor de Warthin (2), tendo sua importância no acompanhamento desses tumores em casos não cirúrgicos (20).

    O estudo de imagens, em especial da tomografia computadorizada e da ressonância magnética, é necessário para o estadiamento e o planejamento terapêutico dos tumores.

    Adenoma Pleomórfico

    Tumor benigno que corresponde a 2/3 de todas as neoplasias de parótida e o mais freqüente em todas as outras glândulas salivares. É o segundo tumor mais freqüente em crianças, ficando atrás apenas dos hemangiomas (2).

    Macroscopicamente, tem uma cápsula fibrosa bem definida e histologicamente pode-se observar uma cápsula incompleta (1). Numa série de 100 pacientes com adenoma pleomórfico, STENNERT et al (21) (2001) demonstraram por exame histopatológico perigosas alterações na cápsula da maioria dos tumores, crescimento transcapsular dando ao tumor sua típica característica de extensão pseudopodálica, o que justifica a alta porcentagem de recorrência local da lesão apesar de sua enucleação cirúrgica.

    O tratamento do adenoma pleomórfico de parótida é a parotidectomia superficial com ressecção do tumor com margem cirúrgica de glândula normal (1). A grande maioria (90%) dos casos acomete o lobo superficial da glândula, sendo 80% na sua porção inferior. Tumores bilaterais são extremamente raros (22).

    Recorrência tumoral ocorre com freqüência de maneira multilocal e pode manifestar-se de 10 a 15 anos após a ressecção inicial. Reoperações põem em risco o nervo facial e o seu monitoramento ajudaria a diminuir esse risco. Taxas de cura são 25% menores em reoperações. A radioterapia pode ser útil no tratamento de múltiplas recorrências e é optada caso-a-caso (1).

    Os adenomas de glândulas salivares menores são raros e, quando ocorrem, o sítio mais comum é o palato (50-60%), seguido do lábio superior (23). Podendo ocorrer em locais raros como a base de língua (23) e o septo nasal (24).

    É raro o desenvolvimento de carcinoma; esse caso é variadamente denominado carcinoma ex-adenoma pleomórfico. A incidência de transformação maligna aumenta com a duração do tumor, sendo de cerca de 2% para os tumores presentes há menos de 5 anos e de quase 10% para aqueles com mais de 15 anos de duração. Lamentavelmente, esses cânceres, quando aparecem, estão entre as neoplasias malignas mais agressivas das glândulas salivares, sendo responsáveis por 30 a 50% de mortalidade em 5 anos (25).

    Em casos excepcionais, esse tumor pode originar metástases à distância (26).

    Tumor de Warthin

    Também conhecido como cistoadenoma papilar linfomatoso, é o segundo tumor benigno mais freqüente em parótida, correspondendo a 6-10% de todos os tumores parotídeos (2). Ocorre quase que exclusivamente na parótida com alguns raros casos descritos em submandibular (1). A maioria dos casos ocorre na 6ª e 7ª décadas de vida, predileção pelo sexo masculino, mas com incidência crescente ao sexo feminino possivelmente relacionado ao aumento de tabagistas (27).

    É capsulado, com superfície lobulada, e em 90% dos casos no lobo superficial da parótida, e em 5% dos casos, ocorrendo bilateralmente. A maioria dos casos apresenta espaços císticos, preenchidos por um líquido viscoso de cor acastanhada (27).

    Quanto à histogênese deste tumor, acredita-se que represente uma proliferação neoplásica dos ductos salivares no seu curso de desenvolvimento dentro de tecidos linfóides associados com as glândulas salivares maiores, especialmente a parótida, pois esta é encapsulada tardiamente em relação à glândula submandibular e a sublingual (27).

    A cintilografia com tecnécio 99 pode ser solicitada, visto que o isótopo radioativo pode ser captado e concen- trado pelas células oncocíticas do tumor, embora seja um exame de baixa sensibilidade (27).

    O tratamento é cirúrgico com parotidectomia superficial. Tanto a recidiva como a degeneração maligna são descritas, porém raramente ocorrem (2).

    Oncocitoma

    Tumor que corresponde a menos de 1% das neoplasias de glândulas salivares, quase que exclusivo de parótida e em pacientes após a 6ª década (2). Origina-se dos oncócitos, células epiteliais que também podem ser encontradas em outros órgãos como pâncreas, tireóide, rim, sendo sua maior incidência, no entanto, no lobo superficial da glândula parótida (7).

    Macroscopicamente é uma massa avermelhada, firme e não cística. Histologicamente compõem-se de células eosinofílicas granulares, amarronzadas e arredondadas, com pequenos núcleos denteados. Degeneração maligna pode ocorrer, mas é rara (2). Apesar de benigno, pode apresentar potencial destrutivo, devendo ser tratado cirurgicamente (7).

    Adenoma Monomórfico

    Este tipo de tumor na realidade é a denominação de vários tipos de tumores raros de glândulas salivares, sendo o mais comum o adenoma de células basais encontrado nas glândulas salivares menores do lábio superior. Outros tipos são o adenoma rico em glicogênio, adenoma de células claras e o adenoma sebáceo (2).

    Apresentam-se como tumores bem definidos e encapsulados. Microscopicamente, o adenoma de células basais forma paliçadas de células arredondadas sobre uma delgada membrana basal e pode ser confundido com o carcinoma adenóide cístico, que chega a ser considerado a sua versão maligna (1).

    O adenoma sebáceo, também chamado de linfadenoma sebáceo, é um raro tumor benigno das glândulas salivares. Surge em glândulas sebáceas normais presentes em tecido interductal em fundo cego, em meio a tecido glandular funcionante. Raramente ocorre em glândulas salivares menores. Não há casos descritos de malignidade. São clinicamente assintomáticos, de crescimento lento e usualmente ocorrem na parótida. Seu tratamento é cirúrgico (7).

    O adenoma monomórfico é considerado benigno e não agressivo. Tratamento consiste na ressecção com margens (2).

    Carcinoma Mucoepidermóide

    Tumor maligno mais comum de parótida (15% dos tumores de parótida) e o segundo mais freqüente em submandibular (2).

    Histologicamente é composto por 2 tipos de células, as mucosas e as epidermóides e a partir desta diferenciação podem ser divididos em baixo, intermediário e alto grau baseado na predominância de uma ou outra (1). O grau tumoral é um dos mais importantes fatores prognósticos em 5 anos: 92-100% nos de baixo grau, 62-92% nos de grau intermediário e de 0-43% nos de alto grau (28).

    Os tumores de baixo grau são compostos por numerosas células mucosas e espaços císticos (2). A maioria ocorre entre a 4ª e a 6ª décadas geralmente com história de crescimento lento em meses ou anos, com discreta predominância feminina e em +7% dos casos os pacientes têm paralisia facial periférica ao diagnóstico (29).

    À macroscopia, apresenta-se como massa bem circunscrita, parcialmente encapsulada (2). O tratamento de escolha é a cirurgia margem cirúrgica e a avaliação dos linfonodos intra-parotídeos: se livres, lobo profundo e os linfonodos cervicais não necessitariam de tratamento complementar, se acometidos, o tratamento com abordagem ampla deve ser instituído (29).

    Os tumores de alto grau assemelham-se bastante ao carcinoma de células escamosas necessitando em alguns casos de avaliação patológica mais específica (2). Macrocospicamente apresenta margens pouco nítidas, consistência endurecida e coloração acinzentada (1). O tratamento é cirúrgico com excisão ampla, margem cirúrgica e preservação do nervo facial se não houver envolvimento (2). A dissecção cervical profilática permanece controversa (28). Devido à grande taxa de metástases ocultas, um dissecção cervical eletiva deve ser considerada em um pescoço N01.

    Há relatos de melhora do controle das lesões locais após radioterapia complementar no local primário e nos campos cervicais. O tratamento com quimioterapia tem sido reservado para lesões não controladas após a cirurgia e radioterapia com o intuito de paliação sintomática (30).

    Carcinoma Adenóide Cístico

    Segundo tumor maligno mais comum das glândulas salivares correspondendo a 10% das neoplasias. Não há predominância quanto a sexo ou raça, sendo a idade média do diagnóstico ao redor de 45 anos (2).

    Macroscopicamente, trata-se de lesões geralmente pequenas, inadequadamente encapsuladas, infiltrativas e rosa-acizentado (25). Invasão perineural é um achado típico dessa neoplasia (28). Constituindo a neoplasia mais dolorosa das glândulas salivares (25).

    A sobrevida relativa ao tumor é em torno de 80% nos primeiros anos, mas cai vertiginosamente com o decorrer do tempo, chegando a 20% em 20 anos. O crescimento lento da lesão primária e sua recidiva em muitos anos, assim como o surgimento de metástases distantes até 20 anos do tratamento inicial, ao lado da longa sobrevida, mesmo na presença de tumor ou metástases, faz com a queda da mortalidade se dê em longo prazo (30). O seguimento a longo prazo é mandatório para esses pacientes (2).

    Em virtude do mau prognóstico em longo prazo, a tendência é estabelecer-se um tratamento extremamente radical para esse tumor (30).

    Carcinoma de Células Acinosas

    É uma neoplasia de baixo grau que representa 1% de todas as neoplasias das glândulas salivares e 5-11% das neoplasias malignas. Acomete principalmente a parótida (1). A exemplo do tumor de Warthin pode ser multicêntrico em 2 a 5% e bilateral (25). Macroscopicamente é encapsulado, acinzentado e pode ser sólido ou cístico (1).

    O tratamento é a excisão cirúrgica ampla com sobrevivência em 5 anos variando de 47 a 90% e em 25 anos está em torno de 50%. Radioterapia é reservada para casos com mau prognóstico (envolvimento do nervo facial, metástases, envolvimento de pelo). Esvaziamento cervical eletivo está indicado para os casos de alto grau (2).

    Carcinoma Epitelial-Mioepitelial

    Tumor que corresponde a 1% das neoplasias de glândulas salivares, histologicamente caracterizado por um amplo espectro histológico. Apesar da presença de achados histológicos agressivos, a neoplasia é de baixo grau, recorre frequentemente, mas raramente gera metástase (31).

    Adenocarcinoma Polimórfico de Baixo Grau

    Ocorre quase que exclusivamente nas glândulas salivares menores. Ocorrendo no palato, mucosa oral e lábio superior. A maioria dos tumores ocorre na 6ª década (2).

    Tratamento é a excisão local ampla com margens cirúrgicas amplas. E mesmo com a presença de envolvimento neural, não há indicação para radiação pósoperatória se a ressecção foi completa (2). O tumor tem alta incidência de recidiva (30).

    Adenocarcinoma

    Mais comumente ocorre nas glândulas salivares menores, seguidos da glândula parótida. Representa aproximadamente 15% das neoplasias malignas de parótida. Comportam-se agressivamente, com fortes propensões para recorrer e metastatizar (2).

    No tratamento, segue a orientação dos outros tumores malignos das glândulas salivares, sendo indicada a parotidectomia total ou a submandibulectomia. O esvaziamento cervical fica reservado para os casos de metástases evidentes. A radioterapia complementar vem sendo utilizada, mostrando valor no controle em longo prazo (30).

    Carcinoma de Células Escamosas (CEC)

    O carcinoma espinocelular primário de glândula salivar é raro (1). Corresponde a 0,3 a 1,5% dos tumores de glândula salivar (2).

    O diagnóstico é feito após a exclusão de Carcinoma Mucoepidermóide, CEC metastático, invasão da glândula por tumor de estruturas adjacentes e metaplasia escamosa da glândula (1).

    O tratamento consiste na ressecção cirúrgica completa e com radioterapia pós-operatória (2). Em geral, o primeiro ano após a cirurgia é crucial, sendo o período em que ocorrem cerca de 60% das recidivas. A sobrevida é bastante baixa, atingindo 24% em 5 anos (30).

    Sarcoma

    São tumores raros geralmente em parótida, mais comuns em homens que se apresentam como massas grandes e indolores. O Rabdomiossarcoma e o Fibrossarcoma são os tipos histológicos mais comuns (2).

    O diagnóstico do sarcoma primário de parótida requer a exclusão de metástase de tumor sarcomatoso de outros tecidos. O prognóstico do tumor relaciona-se com seu tamanho, tipo e grau histológico de diferenciação (2).

    O tratamento é a parotidectomia total (2).

    Linfoma

    O Linfoma primário de glândulas salivares é raro e as glândulas mais envolvidas são a parótida e a submandibular, com predomínio da primeira. O diagnóstico é estabelecido pela exclusão de outro linfoma extra-salivar, pela histologia confirmando envolvimento do parênquima salivar ao invés de apenas linfonodos intraglandulares e pelo achado citológico de malignidade da lesão (2).

    O tipo mais comum do linfoma primário de glândulas salivares é o MALT, porém com translocações cromossômicas órgão-específica (por exemplo: diferente das do trato gastrintestinal e pulmão) (32).

    A doença de baixo grau de malignidade localizada e sintomática pode ser tratada com radioterapia com campos envolvidos. Pacientes com grau intermediário e doença localizada devem ser tratados com poliquimioterapia (30).

    Estadiamento

    A classificação internacional mais utilizada é a de 2002 do American Joint Committee on Cancer (AJCC) (33):

    Tumor primário (T):

    TX: tumor que não pode ser acessado.
    T0: sem evidências de tumor primário.
    T1: tumor < 2 cm sem extensão extraparenquimatosa.
    T2: 2 < tumor < 4 cm sem extensão extraparenquimatosa.
    T3: tumor > 4 cm ou com extensão extraparenquimatosa.
    T4a: tumor invade pele, mandíbula, canal auditivo ou nervo facial
    T4b: tumor invade base de crânio, processo pterigóide e/ou carótida.

    Envolvimento Linfonodal (N):

    NX: linfonodos (LN) não avaliados.
    N0: sem acometimento de linfonodos.
    N1: metástases em apenas um LN ipsilateral ao tumor com até 3 cm.
    N2a: LN de 3 a 6 cm, ispsilateral.
    N2b: múltiplos LNs ipsilaterais.
    N2c: LNs bilaterais ou contralaterais.
    N3: LNs maiores que 6 cm.

    Metástases (M):

    MX: metástases não avaliadas;
    M0: sem metástases;
    M1: metástases à  distância

    Estadiamento:

    Estágio I          T1N0M0
    Estágio III       T3N0M0                ou             T1-3N1M0
    Estágio IVA     T4aN0-1M0           ou             T1-4aN2M0
    Estágio IVB     T4bNxM0              ou             TxN2-3M0
    Estágio IVC     TxNxM1

    Sobrevida em 5 anos:

    Estágio I            75%
    Estágio II          59%
    Estágio III          57%
    Estágio IV          28

    Tratamento

    O tratamento de escolha para as neoplasias salivares é a excisão cirúrgica completa (2). O tipo de cirurgia a ser empregado está relacionado ao tipo de lesão encontrado, por exemplo, em alguns casos pode ser necessário o sacrifício de estruturas nervosas ou vasculares, e sua indicação vai depender do comportamento biológico do tumor (34).

    A radioterapia somada a cirurgia melhoraram a sobrevida dos pacientes. A quimioterapia tem como primeira indicação para os casos paliativos ou irressecáveis (2).

    Nas neoplasias parotídeas, em geral, a parotidectomia superficial com a identificação e preservação do nervo facial é curativa na maioria dos casos. Ressecção completa da parótida está indicada nos tumores malignos, e ressecção com reconstrução do nervo facial se o mesmo estiver acometido (2).

    Para tumores benignos submandibulares, a excisão é curativa (2). Nos carcinomas, a ressecção em bloco (glândula submandibular, níveis I e II) seguida da radioterapia é o método de escolha (35).

    O seguimento deverá ser feito bimestralmente no primeiro ano; quadrimensalmente no segundo ano; semestralmente no terceiro ano; e anualmente a partir do quarto ano. Os doentes tratados de tumores benignos e de baixo grau de malignidade podem, depois de um ano, receber alta e serem orientados para retorno (11).

    Acessos menos invasivos para tumor de Warthin na parótida (36) e minimamente invasivos para tumores benignos localizados no bordo inferior da parótida (37) foram descritos mais recentemente, diminuindo complicações pós-operatórias (hemorragia, tempo de duração da cirurgia, tempo de hospitalização, cicatriz estética).

    Há complicações precoces e tardias após as parotidectomias. Paralisia facial temporária pode ocorrer em 10-30% dos pacientes, com paralisias permanentes ocorrendo em <3% dos casos. Transecção completa pode ocorrer e deverá ser corrigida no mesmo momento (2). A utilização de estimuladores de nervos pode estar indicada em casos de reoperação (34), assim como em grandes tumores, submetidos a radioterapia prévia ou com inflamação. Alternativamente, uma mastoidectomia com identificação do nervo facial no osso temporal pode auxiliar em situações de anatomia distorcida (2).

    Síndrome de Frey ou sudorese gustatória é uma complicação a longo prazo relativamente comum das parotidectomias. Acredita-se que esteja relacionada com uma regeneração aberrante das fibras parassimpáticas com as fibras simpáticas (34). Apenas 10% dos pacientes são sintomáticos (2). O tratamento inclui anti-transpirantes, anticolinérgicos tópicos e aplicações de botox (1). Durante a parotidectomia, o levantamento do retalho cutâneo inferiormente à fáscia parotídea diminuiria de forma significante a incidência da síndrome de Frey (38).

    Outras complicações incluem as raras hemorragias, hematomas e infecção local e a comum fístula salivar. Sendo esta última autolimitada na maioria das vezes (2).


    DISCUSSÃO

    Apesar de raras e compreenderem uma grande variedade de subtipos histológicos, as neoplasias de glândulas salivares se manifestam clinicamente de forma semelhante. Porém, pela sua baixa prevalência, surge a primeira dificuldade ao otorrinolaringologista/cirurgião de cabeça e pescoço que precisa estar atento aos pacientes com massas assintomáticas ou oligossintomáticas de crescimento lento na topografia das glândulas salivares. A suspeita diagnóstica é importante para o diagnóstico precoce e, conseqüentemente, para a instituição precoce do tratamento.

    A partir da suspeita diagnóstica é fundamental definir as ferramentas adequadas para o diagnóstico rápido e preciso do paciente, uma vez que o tratamento nos difere diferentes subtipos histológicos tanto para os tumores benignos como para os tumores malignos. O PAAF apresentou avanços tanto na técnica de realização quanto na análise dos materiais obtidos, representando o exame complementar de escolha, neste serviço, para se definir o diagnóstico histológico dos tumores de glândulas salivares maiores. Nos tumores de glândulas salivares menores, a biópsia excisional é o método de eleição. A realização da parotidectomia superficial ou submandibulectomia com biópsia de congelação após a realização de exames de imagem, mas sem a realização do PAAF, é descrita na literatura, porém acreditamos que a importância da congelação está restrita para a garantia de margem cirúrgica no intra-operatório.

    Aliados ao diagnóstico histológico, os exames de imagem preparam tanto o cirurgião como o paciente sobre a possibilidade de ressecção cirúrgica e sua extensão, considerados, por isso mesmo, outro passo complementar importante na investigação do paciente com neoplasia de glândula salivar. Apesar de grandes avanços nas diferentes modalidades diagnósticas de imagem, o exame de imagem inicial de escolha, neste serviço, é a tomografia computadorizada, complementando-a quando necessário. O uso irrestrito dos exames de imagem, mesmo nos serviços que dispõem dessa facilidade, pode expor o paciente a exames desnecessários e contribuir para o atraso no início do tratamento.

    O tratamento nos diferentes subtipos tumorais traz alguns questionamentos: a extensão da ressecção (por exemplo, na parotidectomia, ela deve ser regional, superficial ou total?), a preservação da inervação próxima às glândulas salivares (principalmente na preservação do nervo facial, quando ela não está indicada?), a associação da radioterapia ou do esvaziamento cervical (quando é necessário?). Outra dificuldade reside no fato de que são poucas as equipes que já se depararam com a maioria dos subtipos histológicos. A maioria dos trabalhos relata a experiência cirúrgica com o adenoma pleomórfico, o tumor de Warthin, o carcinoma mucoepidermóide e o carcinoma adenóide cístico, por acaso, os mais comuns subtipos histológicos.

    O adenoma pleomórfico, por sua característica recorrente e multilocal somada a sua localização superficial, deve ser tratado com a parotidectomia superficial. Há descrições de ressecções regionais, porém o cirurgião deve estar ciente de que reoperações apresentam taxas de cura inferiores e alto risco de lesão do nervo facial.

    O tumor de Warthin tem sua ocorrência quase que exclusiva em parótida. Seu tratamento pode ser realizado com a ressecção regional nos casos do acometimento da porção inferior da parótida. Pelo baixo risco de malignização e pico de incidência na 6ª e 7ª décadas de vida, alguns autores defendem o acompanhamento das lesões com exames de imagem. Nesses casos, o esclarecimento para o paciente sobre o diagnóstico é essencial para a tomada de decisão conjunta.

    No carcinoma mucoepidermóide a ressecção varia de acordo com o grau tumoral (baixo ou alto) e seu estadiamento. No baixo grau, a avaliação dos linfonodos intra-parotídeos é determinante para a excisão completa da parótida ou da necessidade do esvaziamento cervical, enquanto no alto grau a excisão deva ser sempre ampla e se possível com preservação do nervo facial (quando não acometido). O esvaziamento supra-omohioideo está indicado nos tumores de alto grau e estadio 3 (tumores > 4cm / extensão extraparenquimatosa ou pescoço positivo). Pode também ser ampliado (com nível IV associado aos níveis I-III) ou radical dependendo do caso.

    O carcinoma adenóide cístico tem mau prognóstico a longo prazo, sendo preconizado a cirurgia com excisão ampla do tumor seguida da radioterapia. Tem como característica o achado de invasão perineural. O nervo facial (no caso de neoplasia parotídea) ou os nervos marginal da mandíbula, lingual e hipoglosso (no caso de acometimento submandibular) devem ser removidos e anastomosados se confirmada a presença de margem cirúrgica livre.

    Os exames para o diagnóstico preciso, a possibilidade de congelação intra-operatória e a técnica cirúrgica mais apurada, todos os avanços diagnósticos e terapêuticos vêm a somar aos já consagrados conhecimentos do comportamento de cada subtipo histológico tumoral para que o otorrinolaringologista/cirurgião de cabeça e pescoço possa realizar o melhor manejo caso-a-caso dos pacientes com neoplasia de glândulas salivares.


    COMENTÁRIOS FINAIS

    Alguns pontos merecem destaque:

    1) É necessário profundo conhecimento da anatomia e fisiologia destas glândulas para uma correta abordagem clínica e cirúrgica.

    2) As glândulas salivares dão origem a uma variedade surpreendente de tumores benignos e malignos, onde o diagnóstico patológico é a chave para o manejo dessas lesões uma vez que os graus de agressividade dependem dos seus subtipos histológicos.

    3) Não existem critérios em bases clínicas confiáveis para diferenciá-los.

    4) O PAAF pode ser um primeiro passo na investigação diagnóstica, com os exames de imagem reservados para o estadiamento e para o planejamento terapêutico tumoral.

    5) Não há fluxogramas diagnósticos e terapêuticos, cabendo ao otorrinolaringologista/cirurgião de cabeça e pescoço a análise caso-a-caso desses pacientes.


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    1. Médico. Residente em Otorrinolaringologia do 3o ano.
    2. Médico Otorrinolaringologista. Assistente do Setor de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina.
    3. Mestre em Otorrinolaringologia. Coordenadora do setor de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina.

    Instituição: Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina. Londrina / PR - Brasil.

    Endereço para correspondência:
    Allex Itar Ogawa
    Rua Governador Valadares, 549 - Jardim Andrade
    Londrina / PR - Brasil - CEP 86061-100
    Telefone: (+55 43) 3327-0535
    E-mail: allexogawa@uol.com.br

    Artigo recebido em 23 de novembro de 2007.
    Artigo aprovado em 26 de agosto de 2008.
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