Title
Search
All Issues
7
Ano: 1998  Vol. 2   Num. 1  - Jan/Mar Print:
Original Article
Versão em PDF PDF em Português
Curiosidades da História da Otorrinolaringologia
Author(s):
1Aracy Pereira Silveira Balbani
Palavras-chave:
O HISTORIADOR, UM PROFETA DO PASSADO

Muitas vezes ficamos interessadíssimos pelas novas técnicas cirúrgicas e equipamento que são lançados nos congressos ou publicados nas revistas internacionais. Discussões sobre cirurgia endoscópica da base do crânio, cirurgias a laser, tratamento com DNA recombinante e imunoterapia são alguns dos assuntos "quentes" nas rodinhas dos otorrinolaringologistas do final do século XX. Mas será que já paramos para pensar sobre como chegamos até aqui? Talvez seja bom conhecer um pouco de como foi a Otorrinolaringologia no passado, com descrições anatômicas feitas num tempo em que sequer havia microscópios, e predominavam os tratamentos empíricos e muita superstição misturada à Medicina.

Que dizer dos estudiosos dos outros séculos? Mais do que epônimos de grafia esquisita e chatos de decorar, representam heróis da Medicina, cujo esforço e sacrifício resultou na publicação de muito do conhecimento que possuímos hoje. Foram eles que mantiveram a produção científica e o fervilhar de idéias na história do homem, mesmo em épocas difíceis como a inquisição. É impressionante como poucas idéias a mais são realmente originais, muitas já estavam presentes nos trabalhos dos egípcios ou dos renascentistas, embora fossem baseadas apenas na observação, sem que pudessem ter comprovação científica na ocasião. Talvez venha daí a brincadeira de alguns historiadores, que se auto-intitulam "profetas do passado", aqueles que fazem suas "previsões" através da leitura de documentos e livros empoeirados.

Conhecer o passado e seus personagens sempre é bom para podermos olhar o presente com outros olhos. Talvez essa breve revisão de alguns fatos ajude-nos a refletir sobre a Otorrinolaringologia de hoje, buscando torná-la ainda melhor no futuro.

VOCÊ SABIA DISSO?

 Inúmeras substâncias já foram descritas para o tratamento da congestão nasal: fezes de cachorros brancos, folhas de repolho secas e extratos vegetais. Os médicos chineses foram os primeiros a empregar ervas medicinais que continham a efedrina, há cerca de 5.000 anos, embora essa substância só viesse a ser conhecida e isolada em 1887.

 O Papiro de Edwin-Smith (1900 AC) descreve um tratamento usado pelos egípcios nos ferimentos da região temporal sem fraturas: curativo com carne fresca no primeiro dia, seguido de curativos diários à base de ungüentos e mel. As lesões acompanhadas de fratura do osso temporal eram consideradas gravíssimas e incuráveis.

 Na Antigüidade, acreditava-se que o tamanho do nariz era proporcional ao dos órgãos genitais, e narizes grandes eram sinônimo de virilidade. Por isso, os guerreiros corajosos eram denominados "nasuti". Virgílio, na "Eneida", descreve o costume de amputação da pirâmide nasal em homens e mulheres como punição ao crime de adultério. Documentos hindus traduzidos do sânscrito (700 AC) descrevem as primeiras tentativas de rotação de retalhos para a correção da deformidade da pirâmide nasal nos condenados por adultério.

 Hipócrates afirmava em seus "Aforismos" que o surgimento de espirros na mulher em trabalho de parto era um sinal de boa resolução, mesmo em partos difíceis. O Pai da Medicina também foi um estudioso da redução de fraturas e aconselhava os médicos da época a efetuar a redução das fraturas nasais em, no máximo, 24 a 36 horas após o trauma para obter os melhores resultados.

 Os gregos acreditavam que os seres vivos respiravam pelas orelhas. O filósofo Alcmaeon (580AC) escreveu que "o sopro da vida entra pela orelha direita, e o sopro da morte, pela orelha esquerda".

 Aristóteles (384-322 AC) foi um dos primeiros estudiosos a afirmar que os animais não respiravam através das orelhas. Em seu livro "A História dos Animais", o filósofo escreveu também que as pessoas com orelhas grandes e salientes tinham uma tendência para as conversas sem importância e fofocas.

 Na Medicina hebraica as otites eram tratadas com a instilação do caldo de cozimento de rim de cabra no meato acústico externo, de acordo com relatos do Taimud babilônico (325-427).

 A surdez era tratada com a instilação de urina do próprio paciente na orelhas durante a Idade Média.
 A anatomia dos seios maxilar e frontal já aparece nos desenho perfeitos de Leonardo da Vinci (1452-1519).

 A primeira laringotomia, precursora da traqueotomia, parece ter sido realizada por Musa Brasavola na Itália de 1545.

 O primeiro livro dedicado inteiramente à descrição das técnicas cirúrgicas para rinoplastia foi publicado em 1597 sob o título "Tratado sobre a Rinoplastia". O autor era Gaspare Tagliacozzi, professor da Universidade de Bolonha, que tinha vasta experiência no assunto, propondo novas técnicas para rotação de retalhos sobre a pirâmide nasal.

Um cautério primitivo já era utilizado nas cirurgias de nariz e laringe na Idade Média.

 No século XIX alguns autores preconizavam o uso de injeções de gelatina nas fossas nasais como forma de tratamento da epistaxe.

 O espelho para laringoscopia indireta foi inventado por Manoel Garcia, professor de canto em Paris em 1854.

 Um dos tratamentos mais recomendados para a laringite aguda nessa mesma época era uma inalação com vapores de tintura de benjoim e bálsamo de tolu.

 O primeiro aparelho elétrico para amplificação sonora foi lançado comercialmente nos Estados Unidos em 1898.

 No início do século XX atribuía-se a acne facial a "distúrbios intranasais", e o tratamento utilizado na época era a turbinectomia média parcial ou total.

 Também no princípio do século acreditava-se que havia uma conexão entre o nariz e o cérebro, sendo as doenças nasais responsáveis por distúrbios de atenção e memória.

 Um dos tratamento descritos para anosmia no passado era a aplicação de cristais de estrícnina na mucosa nasal com a finalidade de estimular as terminações do nervo olfatório.

 G. Caldwell, americano, e Luc, francês, descreveram o acesso cirúrgico ao seio maxilar através da fossa canina em anos diferentes (Caldwell publicou a técnica em 1893 e Luc, um ano depois), sem que um soubesse dos trabalhos do outro. Mesmo assim, a cirurgia é conhecida até os dias atuais como técnica de Caldwell-Luc.

 Em 1898 os livros traziam uma fórmula para o preparo dos cantores antes das apresentações, e que também podia ser usada nos casos de paralisia unilateral de prega vocal; chá de folhas de coca.

 A cirurgia de Lynch para os seios frontal e etmóide foi descrita pelo próprio Lynch em Nova Orleans e por Waiter Howarth em Londres no ano de 1921. Eles realizaram estudos independentes, apesar de terem apresentado uma técnica idêntica, que acabou recebendo o nome apenas do autor americano.

 Em 1922 Fowler realizou os primeiros exames no audiômetro valvulado fabricado pela Western Electric Company of America.

PARA SABER MAIS

Diagnosis and Treatment of Diseases of the Throat, Nose and Naso-pharynx. Carl Seiler. Philadelphia, Lea Brothers and Co., 1889.

Mackenzie, J. N. The physiological and pathological relations between the nose and the sexual apparatus of man. Johns Hopkins Hosp Bul. 82, 10-17, 1898.

Maladies du larynx, du nez e des orellies. André Castex. Paris, Librairie JB Baillière et Fils. 1903.

Manuale di Oto-rino-laringologia. Gugllelmo Biancioni. Roma, II Policlinico, 1915.

A History of Oto-Laryngology. R. Scott Stevenson e Douglas Gutheri Edinburgh. E. S. Livingstone Ltd. 1949.

Enfemerdades del Oldo, Nariz e Garganta. Ledener, F. L. Barcelona, Salvat Editores, 1953.

1- Doutoranda do Curso de Pós-Graduação da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
  Print:

 

All right reserved. Prohibited the reproduction of papers
without previous authorization of FORL © 1997- 2024